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Escolas de Educação Infantil Muito distantes da “escolinha”

Matéria publicada na edição 04 | Maio 2005 – ver edição online 

Os caminhos da Educação Infantil vão longe da “escolinha”, com uma visão apenas cuidadora de crianças. A tendência é investir no treinamento de seus profissionais.

Por Luiza Oliva

As escolas de Educação Infantil com pouca ou nenhuma estrutura física e pedagógica estão, definitivamente, fadadas ao fracasso. Escolas com professores sem formação adequada, trabalhando na informalidade, com instalações precárias e onde o único critério adotado é tomar conta de crianças esperam ganhar espaço no mercado acenando com preços baixos. Porém, num mercado cada vez mais exigente, a sobrevivência desse tipo de instituição torna-se a cada dia mais frágil, até porque muitas não são regulamentadas. Escolas apenas de Educação Infantil devem se dirigir às Prefeituras de suas cidades para obter autorização de funcionamento. Para Roberto Prado, diretor do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (SIEEESP), a escola de Educação Infantil precisa dizer a que veio. “A escola que não tiver qualidade e um diferencial vai deixar de existir”, diz, completando que as escolas particulares podem passar a sofrer concorrência inclusive das públicas, já que o Senado aprovou por unanimidade, no final de abril, proposta de emenda constitucional da senadora Heloísa Helena que estabelece a obrigatoriedade da Educação Infantil pelas prefeituras para crianças com até seis anos de idade. A emenda terá que ser apreciada ainda na Câmara dos Deputados.
Na verdade, as escolas de Educação Infantil passaram a ser consideradas a primeira etapa do ciclo básico com a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996. Em seu título VI, artigo 62, a Lei dispõe que: “A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.” A Educação Infantil deixa de ter uma conotação apenas de cuidadora de crianças, passando pelo crivo de escola.
Na opinião da professora Maria Angela Barbato Carneiro, titular da Faculdade de Educação da PUC/SP, a partir de 1996 a tendência é que cuidado e educação caminhem juntos na pré-escola. “Ao mesmo tempo em que a escola se preocupa em trocar, limpar e alimentar a criança, faz um trabalho educativo. O toque tem um significado afetivo, a fala estimula o desenvolvimento da linguagem”, exemplifica. Para a educadora, o brincar passa a ter outras funções: a criança se sociabiliza, desenvolve sua personalidade, aprende regras. “Existe o brincar pelo brincar, como prazer, e o brincar usado de forma didático-metodológica”, complementa.
Além do impulso que recebeu do poder público, a valorização da Educação Infantil também foi influenciada por uma nova sociedade, onde a mulher que trabalha fora passou a dividir os cuidados e a educação das crianças com a creche e a pré-escola. Segundo Márcia Rosiello Zenker, psicóloga e consultora educacional, especialista em Educação Infantil, a escola é o primeiro espaço institucionalizado freqüentado pela criança. “Devem estar bem definidas as funções da família e da escola. A criança precisa do mínimo de contato com o pai e a mãe. A escola deve deixar bem claro que é escola, e não casa”, avalia, completando que é na idade pré-escolar (dos zero aos seis anos) que a criança recebe a base para a formação da sua personalidade. A professora Maria Angela completa: “Tudo se constrói a partir da criança pequena. Se ela não tiver um bom educador, dificilmente vai avançar nos outros níveis escolares. Até há algum tempo, jogava-se essa responsabilidade apenas para o professor alfabetizador.”
Que a pré-escola adquiriu uma maior importância nos últimos anos é indiscutível. Porém, muitas ainda não sabem como tratar a questão do conteúdo que será aplicado a essas crianças. “Há escolas que ainda se pautam apenas nas datas comemorativas. São transmitidos para as crianças diversos conceitos pré-concebidos, como o índio de cocar de penas, sem dar a elas a chance de um conhecimento da realidade. Para esse tipo de escola, passar muito conteúdo é mostrar serviço para os pais”, sustenta Márcia. Maria Angela concorda, completando que a Educação Infantil deveria ter um caráter mais lúdico, avaliando o processo e não o produto educativo. “Não existe nota, conceito. É preciso avaliar a criança em relação a ela mesma. O objetivo da Educação Infantil é o desenvolvimento dessa criança e não o ensino de conteúdos. Há uma exigência dos pais em relação à alfabetização. Muitos querem que o filho com cinco a seis anos esteja alfabético. Mas as escolas se esquecem que os pais são leigos e não conhecem o processo de desenvolvimento da criança”, aponta.
A escola que decidir não ceder às pressões pela precocidade dos conteúdos tem outros caminhos a seguir. É possível trabalhar com Ciências, Matemática, Música, por exemplo, dando lugar a outras áreas do conhecimento nas classes de pré-escola. Para isso, porém, a escola precisa investir em sua mão-de-obra. “As escolas de Educação Infantil estão acordando para uma competência necessária. Tudo depende da visão que o gestor tenha da escola e, especificamente, da Educação Infantil. Depende dele o fato dessa escola ir além de simplesmente limpar e cuidar de seus alunos”, acredita Márcia.

Trabalho em grupo

Para um grupo de educadoras de 50 escolas de educação infantil de São Paulo, treinamento e especialização são realidade. Durante um sábado por mês, elas têm encontro marcado com o Projeto Aliança, no Colégio Augusto Laranja. O projeto surgiu em 2000, quando o Augusto Laranja convidou 17 instituições de Educação Infantil para uma troca de experiências, envolvendo tanto o aspecto da gestão escolar como da capacitação do educador. A repercussão foi grande. “Descobriu-se que a educação infantil é importante. Há uma demanda enorme por cursos. Hoje, a educação infantil não se sente mais sozinha”, comenta a psicóloga educacional Márcia Rosiello Zénker, parceira do Projeto.
Para as escolas participantes não há custos nem obrigatoriedade de indicar alunos para o colégio (que oferece cursos de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio). O planejamento é feito por Márcia de acordo com as necessidades apontadas pelas próprias participantes. Este ano, embalada pelo Ano Internacional da Física, Márcia montou uma programação baseada no ensino de Ciências na pré-escola. “A escola de Educação Infantil deve ter um currículo. É necessário discutir os conteúdos. Queremos mostrar que é possível trabalhar ciências com os pequenos, preparando o professor para usar o método científico”, explica.

Duas histórias de sucesso

Uma é um espaço urbano, que atende principalmente pais que trabalham fora e delegam à pré-escola os cuidados com seu filho, com opções de aulas em meio período, período intermediário e integral. A outra está localizada em um sítio de 3,5 alqueires, ocupando uma área de aproximadamente oito mil metros quadrados de área verde, com 100 alunos distribuídos em dois períodos de aulas. A primeira é a Nova Escola Pezinho de Feijão, em São Paulo, e a segunda é o Núcleo Infantil LIP, em Jundiaí. Apesar das diversidades físicas, as duas instituições ilustram muito bem a profissionalização que atinge as pré-escolas.
O investimento na formação dos profissionais talvez seja a principal característica dessas instituições. As profissionais do berçário da Nova Escola (que atende bebês de quatro meses a dois anos), são formadas como berçaristas escolares pela Cruz Vermelha e possuem cursos de especialização realizados no SIEEESP. Uma pedagoga é responsável pelo grupo de três berçaristas. “Há algum tempo, para trabalhar em berçário procurávamos enfermeiras, que cuidavam apenas do bem-estar físico dos bebês. Hoje, começam a aparecer cursos para professores, como noções de recreação, higiene e cuidados”, considera Virgínia S. R. Fioravanti, diretora pedagógica da Nova Escola. Apesar do investimento, muitos profissionais vêem o trabalho no berçário como um momento de passagem. “Ainda há preconceito. Algumas professoras acreditam que só serão professoras quando trabalharem numa classe de alfabetização. No entanto, no berçário você lida com o que há de mais essencial no ser humano, a vida”, completa.
Galyana B.Ferreira Hentz, diretora do Núcleo Infantil LIP, que atende crianças de dois a seis anos, destaca a importância de todos os profissionais envolvidos estarem comprometidos com a educação. “A formação na área educacional deve ser um processo contínuo. Não basta apenas estar formado. Esse processo é um caminho sem fim e nesse sentido oferecemos, permanentemente, oportunidades de aperfeiçoamento, atualização, cursos, palestras.Também é importante sentir que o profissional não seja apenas profissional, mas que tenha afinidade, ou seja, que goste do que faz e com quem faz”, conclui. Também há a preocupação com relação à formação dos auxiliares. O colégio tem convênio com o CIEE (Centro de Integração Empresa Escola) para disponibilizar estágio supervisionado para estudantes. A busca constante de aperfeiçoamento se estende ainda à direção da escola, com profissionais pós-graduados em educação infantil, com cursos e estágios no exterior.
Instalações
Da formação da mão-de-obra passamos aos cuidados com as instalações, que numa pré-escola jamais podem ser deixados de lado. A LIP, por estar instalada em um sítio, tem uma grande área externa (parques infantis, bosque, campo gramado para atividades recreativas, horta, mini-zôo). Assim, há uma preocupação constante com a limpeza e o serviço de jardinagem. Com relação à segurança, a escola investe em portaria com cancela e vigilância, ronda periódica de veículo de vigilância e sistema de alarmes com monitoramento.
Já a estrutura da Nova Escola Pezinho de Feijão conta com piscina aquecida, cozinha com nutricionista para preparo de refeições, refeitório, brinquedoteca, teatro, sala de artes e sala de informática. A escola existe há 16 anos e há oito ocupa um prédio especialmente construído para abrigar os 260 alunos. Pequenos detalhes fazem a diferença: da metade para baixo, as paredes são pintadas com tinta a óleo, para facilitar a limpeza. “Buscamos a qualidade em todos os sentimos. Tanto que obtivemos a certificação Iso 9001/2000”, conta Lúcia Savicius R. Duarte, diretora administrativa.
Tantos cuidados e detalhes têm como foco principal o desenvolvimento infantil. Galyana, da LIP, comenta que o estímulo da imaginação tem lugar de destaque no projeto pedagógico da escola. “O brincar tem um importante papel no desenvolvimento motor que, por sua vez, favorece o raciocínio e o aprendizado. Em todas as atividades os alunos são estimulados a ver o mundo com olhos atentos, descobrindo que todo conhecimento humano está inter-relacionado, tudo isso num clima gostoso e divertido. Assim, brincando a criança aprende a gostar de estudar”, diz.
Ao mesmo tempo em que cuida do desenvolvimento de seus alunos, a escola de Educação Infantil tem que enfrentar a expectativa dos pais frente à evolução dos filhos. “A Educação Infantil é o primeiro referencial de escola dos pais. Eles não têm com o que comparar. Há uma expectativa que a escola faça o mesmo trabalho que a família, o que não é verdade. Os pais têm que entender que certas intercorrências fazem parte do dia-a-dia escolar, que é um ambiente coletivo. Um empurrão ou uma mordida de um amiguinho por vezes adquire um caráter muito forte para os pais e pode até surgir uma desconfiança em relação ao trabalho da escola”, aponta Virgínia, da Nova Escola.

PARA MAIS INFORMAÇÕES
Colégio Augusto Laranja/Projeto Aliança
www.augustolaranja.com.br/alianca

Maria Angela Barbato Carneiro

Márcia Rosiello Zenker
mzenker@terra.com.br

Nova Escola Pezinho de Feijão
diretoria@novaescola-eduque.com.br
www.novaescola-eduque.com.br

Núcleo Infantil LIP
nilip@terra.com.br
www.nilip.com.br

Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo (SIEEESP)
www.sieeesp.org.br

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