“A criança de período integral se torna mais desenvolta e mais autônoma, busca seus direitos através do diálogo e do convívio social. Uma criança de meio período normalmente permanece com avós ou outros responsáveis no contraturno. Isso faz com que ela tenha menos rigor em seu processo de construção social e no dia a dia. Pode-se dizer que temos duas crianças diferentes”, afirma Esther Cristina Pereira, psicopedagoga, presidente do SINEPE-PR e diretora da Escola Atuação (PR)
Por Rafael Pinheiro / Fotos Divulgação
A educação é um dos elementos sociais que agrega, em seu eixo central, metamorfoses instigantes. Observar, historicamente, alterações relevantes em uma sociedade significa, também, realizar leituras minuciosas de evoluções em teorias e práticas educativas, bem como aspirações e desenvolvimentos que acompanharam (e ainda acompanham) diversas gerações de estudantes.
Com isso, as transformações socioculturais refletiram – direta e indiretamente – no panorama educacional, promovendo reformulações evidentes, sobretudo na contemporaneidade. Com o empoderamento feminino e a crescente participação da mulher no mercado de trabalho, as mudanças arquitetônicas das cidades que impactaram significativamente sua mobilidade, a promoção de atividades às crianças e jovens durante todo o dia, o anseio de familiares por uma educação integrada e diversos outros fatores, contribuíram para o aumento na procura por escolas de ensino integral.
“É um efeito do momento em que vivemos. Além disso, é preciso destacar a insegurança de muitos pais em deixar os filhos com babás ou empregadas, então acabam preferindo o ambiente escolar”, diz Esther Cristina Pereira, psicopedagoga, presidente do SINEPE-PR e diretora da Escola Atuação, localizada em Curitiba (PR).
Para a diretora, dentre as principais vantagens para os alunos que ingressam em uma escola de ensino integral, o crescimento mais empático da criança, a resiliência, a proatividade e a alteridade garantem, desde sua alimentação balanceada até a construção social e de seus conflitos, vivências instigantes.
“Estar na escola o dia todo é uma experiência diferenciada. Gerir seus momentos de lazer, seus amigos, lições de casa, seu tempo e suas responsabilidades, faz da criança um ser humano muito mais completo. Os pais percebem a diferença, inclusive na alimentação: aos poucos, os alunos em período integral aprendem a comer todos os alimentos servidos, o que gera uma nutrição mais saudável, já que tudo que servimos é elaborado por nossa nutricionista”, explica a diretora.
Oferecendo a opção de período integral desde o início das atividades, há 31 anos, a Escola Atuação foi uma das pioneiras em Curitiba (PR) a proporcionar um tempo estendido aos alunos no colégio. “Dos 1500 alunos de nossas duas unidades, 760 são atendidos em período integral”, indica Esther. Baseando-se na filosofia do aprendizado através de práticas e vivências, promovendo o desenvolvimento das competências pessoais e sociais dos alunos, Esther ressalta que, o principal desafio para administrar a gestão de uma escola de período integral, são as pessoas.
“Gerir e achar pessoas comprometidas neste processo é muito difícil. Achar professor, atualmente, já está se tornando uma tarefa complexa: aquele professor verdadeiro, com perfil de lecionar. Em período integral, precisamos de muitos profissionais, como cozinheiras, faxineiras, monitores que acompanham nas atividades, professores de aulas especiais e etc.”, relata.
Outro ponto, citado pela diretora, é gerir não só os colaboradores diários da escola, mas também “as famílias que, muitas vezes, deixam a educação por conta da escola. Temos sempre que mostrar que nós instruímos pedagogicamente, mas que educação vem de casa – de dentro do lar da criança”.
ASPECTOS CONTEMPORÂNEOS
Compreendendo a educação integral como um aspecto fundamental para o desenvolvimento de cada aluno, bem como a ressignificação do espaço-tempo escolar, em decorrência das jornadas estendidas, o Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré, localizado em Belém do Pará (PA), iniciou seu período integral em 2014, com a oferta da Educação Infantil até o 5º ano. Desde o início até o momento, foram atendidos entre 50 a 100 alunos. E, a partir deste ano, foram incluídos os estudantes do 6º ano, totalizando, no momento, 70 estudantes no período integral.
A decisão do colégio em proporcionar o período integral aos alunos, conta o Diretor Ir. Iranilson Correia de Lima, se deu pela iniciativa de agregar valor ao processo educativo já prestado por tanto tempo na Cidade de Belém. “Além disto, buscamos apresentar diferenciais e inovações que garantam um jeito próprio de educar, capaz de agregar aspectos tradicionais e contemporâneos que respondem a realidade dos nossos estudantes”.
Dentre as principais atividades propostas pelo colégio a este período, o diretor destaca: acompanhamento pedagógico, estudos orientados, atividades esportivas e culturais, aulas de idiomas (inglês e espanhol), atividades envolvendo as habilidades socioemocionais, religiosas, além de acompanhamento nutricional.
“Nossa proposta educativa é completamente voltada para a formação integral do sujeito. Logo, o tempo integral passa a ser uma excelente estratégia que reforça, ainda mais, essa possibilidade a partir do espaço-tempo ampliado que temos com o estudante. Desenvolvendo, então, competências e habilidades nas diversas dimensões humanas: intelectual, corporal, social, afetiva, emocional e espiritual”, ressalta o Ir. Iranilson.
Com relação aos elementos que compõem a gestão de uma instituição de ensino, o diretor ressalta alguns desafios que atravessam o cotidiano administrativo, como: garantir que as atividades propostas atendam as necessidades das famílias sem, com isso, encarecer financeiramente a proposta deste ensino; garantir que o período integral não se transforme em um novo período regular; promover uma aproximação das famílias nas dinâmicas dos filhos; e “reforçar a confiança dos pais quando entregam à escola a dinâmica do filho em todo período do dia”, completa.
ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR
Tendo como princípio a formação integral do aluno – aliado a padrões internacionais de ensino, como desenvolvimento de habilidades essenciais para a vida; protagonismo; tecnologia aplicada com ambiente digital; investimento e atualização do corpo docente; e acompanhamento personalizado do aluno – a escola-modelo Vereda, localizada em Santo André (SP), destaca, em sua estrutura, um ambiente seguro que estimula o aprendizado em tempo integral.
“Além do aprendizado das matérias tradicionais, a expansão do tempo diário nos permite ampliar nossa carga de Língua Inglesa, contribuindo de modo decisivo para a construção de uma comunicação fluente. Além disso, nossos alunos têm Oficina de Design e aulas de Habilidades para a Vida, onde trabalhamos valores, procedimentos de estudo e habilidades sócio emocionais”, destaca Jefferson Santos, Diretor Pedagógico da Escola Vereda.
Nesse tempo adicional de conhecimento – que, no período regular os alunos vivenciam de 4-5 horas diárias de atividades e, no período integral, vivenciam de 7-9 horas de atividades – as escolas devem, segundo Jefferson, desenvolver experiências com foco no aluno e na expansão do seu repertório intelectual, moral, físico, entre outras dimensões, proporcionando uma formação ampliada.
“Todas as atividades precisam ser planejadas no sentido de proporcionar abordagem multidisciplinar, conectando as diversas práticas que acontecem na escola e rompendo o isolamento das disciplinas. Assim, uma Oficina de Design que acontece no turno da tarde pode se conectar com a aula de Arte e Ciências em um projeto para construção de um projetor pelos alunos”, defende Jefferson.
No que tange a administração de uma instituição integral, o diretor ressalta alguns desafios durante a gestão, como: a alimentação (tendo como soluções flexíveis como alimentação fornecida pela escola ou trazida pelos estudantes); maior alocação de recursos humanos e econômicos; e infraestrutura ampla (imóvel maior com cozinha e refeitório em grande escala).
“Igualmente importante é ressaltar que em uma escola de período integral se diminui pela metade a capacidade de alunos que se poderia matricular caso a mesma fosse meio período. Dessa forma, somente uma escola que não vise apenas o lucro possui condições de oferecer um ensino integral a preço acessível”, complementa o diretor.
PERÍODO AMPLIADO
Fundado em 1858 e com um histórico pautado pela transmissão de valores e excelência no ensino, o Colégio Marista Arquidiocesano, localizado no bairro da Vila Mariana (SP), articula sua sólida tradição educacional a uma constante renovação pedagógica e didática. Dessa forma, priorizando a formação integral de seus alunos, o colégio implementou, desde 2002, o Período Ampliado – mantendo, de certa forma, o respeito às necessidades individuais de cada aluno e disponibilizando um período estendido agradável, acolhedor e produtivo.
“A ideia do Ampliado surgiu para atender famílias que precisavam deixar seus filhos o dia todo no Colégio, pois não tinham com quem deixar as crianças ou os jovens no contraturno do curricular”, diz Tania Leão Tagliari, Coordenadora do Ampliado do Colégio Marista Arquidiocesano. “No início, atendíamos alunos do Infantil 3 à 3ª série do Ensino Médio, porém, com o aumento das aulas eletivas na grade curricular do Ensino Médio, deixamos de atender este grupo. E, desde 2017, atendemos também crianças do Infantil 2”.
Com um prédio próprio, espaço seguro, ambiente acolhedor, acompanhamento pedagógico, orientação de estudos e educacional, e atividades que contribuem para o desenvolvimento de crianças e jovens, a gestão do Período Ampliado, conta Tânia, é desafiadora e complexa, diante de tantas demandas.
“A logística é grande, pois oferecemos diversas atividades para diferentes faixas etárias dentro da nossa grade complementar. Cada aluno tem a possibilidade de escolher duas modalidades (esportiva/artística) para frequentar ao longo da semana (Inglês é opcional)”, explica Tânia.
Além da garantia do tempo de estudo, alimentação e descanso, outro aspecto importante da gestão do Ampliado “é o alinhamento feito com a equipe dos projetos e atividades. Promovemos formação continuada a todos os professores do segmento, bem como, estamos constantemente atentos às tendências de mercado, dentro do segmento, para acompanhar as mudanças e evolução na área da educação”, completa a coordenadora.
DESENVOLVIMENTO PLENO
Guiado por uma proposta pedagógica diferenciada, estimulando a interação, comprometimento, valorização humana, inovação, integridade, respeito às diferenças e solidariedade, o Colégio Conte – localizado no bairro da Saúde (SP) – oferece um ensino integral a partir de uma perspectiva total e plural, visando, de fato, um desenvolvimento integral de todos os alunos.
“Nós oferecemos ensino integral desde o início, sempre pensando na necessidade das famílias que atendíamos, mas a cada ano temos buscado o aperfeiçoamento, oferecendo diferentes cursos e diferentes propostas que agreguem mais aos nossos alunos”, diz Giovana Nicoleti, Coordenadora Pedagógica do Conte.
O período integral do colégio, diz Giovana, oferece todas as refeições preparadas com produtos selecionados e a produção é própria, podendo controlar a qualidade; proporciona a imersão no inglês para as turmas a partir de 2 anos; além de oferecer relaxamento, brincadeiras dirigidas, leitura, modelagem, contação de histórias, arte, teatro/teatro musical, ballet, natação, música, futsal, ginástica rítmica, judô e muita diversão.
“Manter o equilíbrio entre o desenvolvimento e o bem-estar é um grande desafio. Não se deve permitir que a ociosidade se faça presente, mas não podemos sobrecarregá-los com atividades excessivas e que não permitam o descanso necessário para o aprendizado. Também é importante considerar as questões alimentares, os alunos de período integral necessitam de um acompanhamento de perto da forma com que estão se alimentando, pois muitas vezes todas as refeições que realizam no dia são exclusivamente no colégio”, relata a coordenadora.
Dessa forma, a estruturação de um ensino integral e todas as atividades, cuidados e desenvolvimentos – que transcende a sala de aula e interage com as áreas administrativa e pedagógica – exige um planejamento minucioso e um olhar completo da rotina e necessidade dos alunos.
“Não acredito no ensino integral que se proponha apenas a manter o aluno em um local seguro. É necessário oferecer estrutura física e pessoal para o desenvolvimento pleno”, finaliza Giovana.
Saiba mais:
Esther Cristina Pereira (Escola Atuação) – cris@escolaatuacao.com.br
Giovana Nicoleti (Colégio Conte) – comunicacao@conte.g12.br
Ir. Iranilson Correia de Lima (Colégio Marista Nossa Senhora de Nazaré) – diretor.nazare@marista.edu.br
Jefferson Santos (Escola Vereda) – relacionamento@escolavereda.com.br
Tania Leão Tagliari (Colégio Marista Arquidiocesano) – arqui@colegiosmaristas.com.br