Por Renato Casagrande
O professor está num processo de quebra de paradigmas, de redução de estigmas e preconceitos e passando a encarar uma nova forma de ensinar, não mais centrada na sala de aula e nem nos métodos de ensino até então utilizados com relativo sucesso. Aquilo que era proclamado já em estudos de um ensino mais personalizado, em que o aluno se torna protagonista do seu processo de aprendizagem, transforma-se nesse momento em um espaço em pleno desenvolvimento.
Diferentemente do que alguns educadores e pais pensavam, o ensino remoto ou as atividades a distância na educação básica não serão breves ou um mero modismo. A educação não presencial deverá perdurar por um período considerável, e a educação mediada por tecnologias como as que estamos presenciando neste momento deverão se fazer presentes nas escolas a partir de agora, independentemente da crise da COVID-19. O que sabemos de antemão nos leva a um novo momento, que é a convivência com o ensino híbrido. Esta sim parece ser uma tendência inevitável.
Todos esses desafios e mudanças só são e serão possíveis com a transformação, engajamento, mobilização e comprometimento dos professores. Com novos comportamentos e atitudes eles poderão dar saltos quantitativos e qualitativos em suas aulas. Esses comportamentos não virão somente por desejo dos professores, mas precisam estar calçados em nossas competências e habilidades a serem rapidamente desenvolvidas para que o avanço ocorra e essas mudanças se consolidem. É preciso voltar a insistir num assunto que parece até gasto, mas é prioritário para este momento: a formação dos professores.
Dentre as questões previstas na Base Nacional Comum Curricular – BNCC – que está sendo implantada em todas as escolas do Brasil, destacamos três aspectos que são essenciais e prioritários para este momento de retorno às aulas nas escolas.
O primeiro aspecto está associado à ênfase para o uso das tecnologias e novas metodologias de ensino. Muitos dos problemas e dificuldades que temos com a implantação das aulas não presenciais são minimizados quando há a implantação de uma metodologia adequada de ensino remoto ou ensino híbrido associado às tecnologias acessíveis e convenientes. Quando isso ocorre, ganha-se a confiança dos pais, o que melhora seu engajamento, traz segurança aos professores no trabalho e ajuda no processo motivacional dos alunos. O professor precisa saber trabalhar com múltiplos materiais simultaneamente, entender a utilização de diferentes metodologias a distância em função da idade dos alunos, saber que material utilizar nos momentos presenciais e nos momentos não presenciais e entender quais tecnologias que podem dar suporte à implantação da metodologia.
O segundo aspecto a ser considerado nos programas de formação, para este momento, se refere à avaliação da aprendizagem. Em um processo de ensino remoto ou híbrido essa avaliação torna-se muito mais difícil. Por mais que adotemos jogos, quizzes (questionários interativos) e outras estratégias de avaliação disponíveis em plataformas na internet, sabemos que nada se compara à observação direta do professor em sala de aula ao longo de um período letivo. O contato com o aluno, o fazer pedagógico do dia a dia do professor é ainda o método mais eficaz de avaliação da aprendizagem.
O terceiro e último aspecto prioritário nos programas de formação se refere às questões socioemocionais. Se antes já precisávamos nos dedicar a elas, agora isso se torna imprescindível. Questões como cativar, motivar e garantir a resiliência dos alunos são funções básicas para um programa de formação que esteja atrelado à nova realidade da escola. Se já insistíamos no desenvolvimento de competências socioemocionais, agora, com o advento de toda essa crise vivida, o professor precisa ter capacidade de lidar com essas competências em um ambiente de quase pós-guerra.
Estudos desenvolvidos pela Universidade de Harvard apontam efeitos da pandemia na educação, orientando que professores precisam estar preparados para lidar com crianças que voltarão às escolas com medo e com a saúde emocional afetadas. Crianças e adolescentes acuados, desesperados, com estresse familiar, violência doméstica, receio de perder familiares, de verem seus pais ficarem sem trabalho e não ter dinheiro para sobreviver.
Voltaremos numa situação muito delicada. Os professores precisarão manter a calma, tranquilidade e possuir habilidades para lidar com todos esses problemas. Essas sensações devem ser interpretadas como um sinal de alerta a todos os professores, ajudando as crianças e adolescentes a não desenvolverem doenças psíquicas.
Assim, acreditamos que a crise da COVID-19 pode e deve ajudar a promover uma revolução na educação. Revolução essa esperada e proclamada há muito tempo. Temos muito a fazer. Precisamos substituir os discursos, bonitos e “floreados”, sobre a importância dos professores por ações claras e concretas que visem melhorar a formação docente a ponto de promover uma transformação.
Para isso, faz-se necessário que todos os agentes educacionais (governo, sociedade, sindicatos, escolas, professores e até a sociedade organizada) se unam em prol de uma pauta positiva e que, de fato, impacte o nosso tão precário sistema educacional.
Sem dúvida vivemos um momento de aprendizado, de reflexão, mas também um momento de ação e de construção de novas rotas para a educação. Não podemos perder essa grande oportunidade de investirmos firmemente na formação dos professores para a nova escola que desponta no horizonte.
Renato Casagrande
É presidente do Instituto Casagrande. É conferencista, palestrante, escritor, pesquisador e consultor em Educação, Gestão e Liderança no Ambiente Educacional. Também é autor de livros e artigos publicados no Brasil e no exterior, além de doutorando em Educação, mestre e bacharel em Administração e licenciado em Matemática