Qualquer instituição de ensino que preze pela qualidade de seu projeto pedagógico e por sua reputação de excelência investe na formação docente. Pode parecer senso comum, mas já reparou que todas as escolas se gabam de ter professores altamente qualificados? Para o mercado isso é uma obrigação, um marketing valioso. E como formamos esses professores? Com reuniões corriqueiras, cursos aleatórios, observações de aula que mais constrangem do que orientam?
A cultura do brasileiro é almejar os melhores resultados, com o menor tempo. Negligenciamos o processo, a construção. Feedbacks não são comuns nas instituições de ensino. Validamos o bom trabalho de um professor pela alfabetização precoce de sua turma e pela quantidade de aprovados em universidades de renome. Assim, temos professores cada vez mais isolados e gestores que são especialistas em “apagar incêndios”.
Em meus estudos sobre currículo e supervisão de professores na Europa, é frequente o debate e a investigação sobre o desenvolvimento profissional docente. Profissional, termo raramente associado ao professor e discutido à exaustão pelo português António Nóvoa, professor universitário e doutor em Ciências da Educação e História Moderna e Contemporânea. Há muito o que aprender com currículos e sistemas de ensino robustos Brasil afora. É preciso tratar o docente como um profissional a ser desenvolvido. Sua evolução deve estar atrelada ao progresso da instituição e do país. Nas escolas europeias, um professor é exemplar não necessariamente pelo tempo de contribuição, mas pela qualidade de sua entrega. Há um caminho a ser trilhado, com acompanhamento e devolutiva constante sobre cada atividade e ação planejada.
Charlotte Danielson, especialista norte-americana em eficácia da prática docente, propõe um ‘framework’ para acompanhar e mensurar as conquistas dos professores. É uma proposta de avaliação baseada nas pesquisas e práticas educacionais que parte de um modelo conhecido no mundo corporativo e partilhado por diversos profissionais de distintas áreas. Para os desafios da educação, foi organizado em quatro domínios: planificação e preparação, clima de aula, ensino e responsabilidades profissionais.
O primeiro domínio desenvolve profissionais hábeis em planejar ações didáticas que levam em consideração as necessidades e habilidades dos alunos, bem como os padrões educacionais e os recursos disponíveis. Também são capazes de adaptar seus planos de aula com base no feedback dos alunos e nos resultados da avaliação garantindo uma experiência de aprendizagem mais eficaz.
O segundo domínio engloba a gestão da sala de aula, o ambiente e a cultura de aprendizagem. O que se observa é o estabelecimento de regras e procedimentos claros para comportamento dos alunos, a perspectiva de uma disciplina positiva e um ambiente seguro, ordenado e adequado que facilite a aprendizagem (disposição do mobiliário, organização do espaço e uso de materiais e recursos) gerando engajamento e motivação dos jovens. O esforço e o progresso de cada um devem ser valorizados.
O domínio ensino ou instrução trata de validar a comunicação compreensiva e adequada à realidade de cada aluno. Há intencionalidade e clareza no discurso do professor? Os estudantes participam e interagem ativamente? São críticos e aplicam os conhecimentos? Há adaptação na instrução para atender às necessidades individuais dos alunos, levando em consideração as diferenças em habilidades, interesses e estilos de aprendizagem? O que se observa é a variedade de estratégias e recursos evocados pelo professor para criar uma experiência de aprendizagem efetiva e envolvente para todos os alunos.
Finalmente o domínio das responsabilidades profissionais traz ao docente o protagonismo de sua profissão associado ao sucesso de seus alunos. É aberto (e busca) feedbacks, define e trabalha os aspectos de melhoria baseado em dados e evidências, colabora e compartilha conhecimentos entre pares, demonstra preocupação com o bem-estar social e emocional dos alunos, estabelecendo altas expectativas para o desempenho acadêmico e pessoal dos estudantes e da instituição.
Cada docente encontra-se num estágio de sua carreira e precisa de orientações específicas. Formar professores é olhar para as necessidades e diferenças de cada profissional, criando um roteiro, estabelecendo critérios observáveis e relevantes. Absolutamente tudo deve ser acordado entre o supervisor e o professor. A docência é muito mais do que um dom, técnica ou vocação, é um exercício profissional e deve ser legitimada pela exigência de seu conhecimento técnico, científico e complexo.