“Vemos para fora e vemos para dentro. Fora, vemos apenas o que de efêmero se vai oferecendo ao horizonte dos nossos olhos. Dentro, tendemos a ver o que não existe, frequentemente, o que desejaríamos que existisse…” (Rubem Alves).
Mais um passo a frente, depois de muito debate, recuos e avanços, após quase quatro anos em tramitação no Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação (PNE) segue, finalmente, para a sanção presidencial. Após idas e vindas, uma sensação de conquista, mesmo sabendo que temos muito a conquistar. Outro olhar convoca nos convoca, é o olhar do sujeito que deseja uma mudança. Um olhar que antecipa o futuro que está por vir e investe no presente.
O PNE (2010-2020) atual é composto por 20 metas que propõem objetivamente o investimento financeiro na Educação. Aos poucos, em passos lentos, o olhar se volta para educação. Um olhar que pode gerar o sentimento de pertencimento por parte dos professores. Não podemos negar os avanços, mas todo cuidado é pouco para um passo concreto à frente. Conquistamos com o novo PNE, o alinhamento de diferentes setores e com a possibilidade real de um envolvimento da sociedade civil e um olhar político, voltado para uma educação democrática que reconstrói outra forma de fazer educação. Grande avanço.
Tal conquista, sinaliza um movimento de possibilidades, oportunidades e risco. Digo risco, porque não devemos esquecer alguns nós de nossa educação antes e durante o PNE, dentre eles três que me chamam atenção neste momento. Primeiro nó: a escola é uma das instituições mais ameaçadas, já que a mesma reflete nossa sociedade e seus entraves como; salários baixos, fragmentos de vidas e histórias, nem sempre elaboradas, crianças e jovens desmotivados frente a uma escola “adoecida” por práticas retrógadas e sem sentido real. Um segundo nó: refere-se ao “velho discurso” ainda sustentado por professores como: “o problema da escola é o aluno e sua família que não querem nada com nada”; “a família é ausente” e tantas outras queixas e denúncias sustentadas em um discurso vazio de sentido, já que o mesmo não considera o novo perfil das famílias contemporâneas, bem como sua estruturação. E por fim, o terceiro nó: refere-se á formação dos professores, muito bem contemplado nas metas 13, 14, 15, 16,17 e 18[1]·. Tal nó, penso ser o desafio de formar e não deformar, a este nó irei debruçar um pouco mais no decorrer desta reflexão.
Os três nós, apresentado rapidamente no parágrafo acima, podem nos servir de bussola para compor o que chamo de passo a frente com a aprovação do novo PNE. Porém o terceiro nó é o passo da mudança de dentro para fora, ou seja, nós educadores, temos que desejar uma mudança real que se pressupõe a articulação com a sociedade imediata – bairro ou comunidade local e principalmente os processos de vida, processos humanos e processos de conhecimento. Tal mudança é histórica e processual a que exige atitude e paciência, como bem dizia Paulo Freire: “a paciência histórica, a pedagógica e a afetiva”. E todas elas, nem sempre são contempladas nos planos. O PNE, já teve inicio em 2001, e com ele algumas mudanças já ocorreram, mas nem sempre de dentro para fora e sim de forma mais imperativa, baseada no medo de ser punido.
A meu ver, as leis e diretrizes, devem ser incorporadas, antes de serem seguidas, se não, de nada adiantará velhos ou novos planos, se a postura humana não mudar. Ilustro minha fala com uma citação de Mário Sérgio Cortella (2014, p. 23) “Num mundo de mudança veloz, estamos nós, no século XXI, nascidos no século XX, usando métodos que vinham do século XIX”. E quando dá errado em sala de aula, qual o nosso argumento? “Esses alunos não sabem nada” ou “eles não querem saber de nada”.
O fato é, se não mudarmos nossos discursos e praticas, poderemos ter diversos PNE(S) aprovados e implantados, porém sem raízes e consequentemente sem frutos e a devida colheita. Já que, nós seres humanos, temos uma profunda dificuldade de assimilar processos de mudança.
O passo a frente, é o desejo de mudança, fato este, que fará do novo PNE ser um sucesso ou não.
No século XXI, caminhamos rumo a uma profunda transformação da educação, porém será preciso descer um pouco mais e rever na própria história da educação, os sinais de incompreensão entre as gerações e internalizar que é preciso escutar os “ruídos” daqueles que ensinam e dos que apreendem em seu processo humano. Caso contrário, continuaremos contemplando uma educação da eficiência em detrimento do Sujeito seja ele na figura do professor, do pai, da mãe ou mesmo do aluno.
O processo educacional do século XXI requer sujeitos que se reconheçam no que fazem. Quantos sujeitos-professores desejam melhorar seu conhecimento? Quantos sujeitos-alunos enxergam sentido em seu processo de aprendizagem? Como o PNE nos ajudará a combater a cultura da preguiça, do tédio e da violência? Como não cairmos apenas em uma cultura dos indicadores? Estes são alguns dos desafios ocultos do novo PNE.
Educar é processo, é lidar com vida, com diversidades, com sujeitos. Investir em formação docente requer investir em sujeitos desejosos, professores-sujeitos que reconheçam a si mesmo para que consigam o reconhecimento alheio, que tanto sonham. Formar-se requer saber: Para onde quer ir? Que caminho vai trilhar? É refletir seu próprio processo de aprendizagem. O novo PNE está contemplando tais questões e de forma bem ousada.
Portanto, vejo e escuto o PNE, como um grande passo, à frente, porém se algo não mudar no coração dos professores, em breve daremos um passo atrás.
Acredito na educação como caminho, acredito nos professores que desejam seguir e percurso que fazem e farão. O PNE é um grande passo, desde que o aluno, seja o sujeito do currículo.
[1]Meta 13 Elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior para 75%, sendo, do total, no mínimo, 35% de doutores. Meta 14. Elevar gradualmente o número de matrículas na pós-graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60 mil mestres e 25 mil doutores.
Meta 15 Garantir, em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, no prazo de um ano de vigência deste PNE, política nacional de formação dos profissionais da educação de que tratam os incisos I, II e III do art. 61 da Lei nº 9.394/1996, assegurando-lhes a devida formação inicial, nos termos da legislação, e formação continuada em nível superior de graduação e pós-graduação, gratuita e na respectiva área de atuação. Meta 16 Formar, até o último ano de vigência deste PNE, 50% dos professores que atuam na educação básica em curso de pós-graduação stricto ou lato sensu em sua área de atuação, e garantir que os profissionais da educação básica tenham acesso à formação continuada, considerando as necessidades e contextos dos vários sistemas de ensino. Meta 17 Valorizar os profissionais do magistério das redes públicas de educação básica de forma a equiparar seu rendimento médio ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do sexto ano de vigência deste PNE. Meta 18 Assegurar, no prazo de dois anos, a existência de planos de carreira para os profissionais da educação básica e superior pública detodos os sistemas de ensino e, para oplano de carreira dosprofissionais da educação básica pública, tomar como referência o piso salarial nacional profissional, definido em leifederal, nos termos do inciso VIII do art. 206 da Constituição Federal.
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