Matéria publicada na edição 122 | Outubro /2016
Se buscarmos a etimologia da palavra ‘trabalhar’, descobriremos que ela vem do latim, de tripaliare, derivado de tripalium, instrumento de tortura, o que demonstra sua associação com sofrimento. Nesse sentido, o trabalho parece algo inconciliável com a noção de felicidade e bem-estar. Por outro lado, tem-se buscado cada vez mais um ambiente de trabalho harmonioso, motivador e flexível.
As pesquisas sobre felicidade começaram a ganhar mais força nas últimas décadas e hoje já é possível encontrar alguns achados consolidados sobre o tema. Tomemos como exemplo a questão financeira: há ainda quem acredite que o dinheiro, por si só, é capaz de proporcionar uma vida feliz, porém, já foi comprovado que isso não se sustenta. O dinheiro, a partir de um determinado ponto em que nossas necessidades básicas e de sobrevivência estão garantidas, não aumenta significativamente os índices de bem-estar das pessoas. Por outro lado, o não reconhecimento financeiro de nosso desempenho profissional também pode baixar o nível de felicidade.
Nestas intrincadas relações de influência, é possível notar uma responsabilização cada vez maior do indivíduo, tanto no que se refere ao sucesso profissional, como no alcance da felicidade. Não é difícil encontrarmos orientações sobre como ser uma pessoa mais feliz, com qualidade de vida, e como inspirar suas equipes. Líderes e gestores têm à mão um arsenal de instruções sobre motivação de colaboradores, sucesso nos resultados e felicidade no ambiente de trabalho. Porém, é preciso um olhar cuidadoso para estas prescrições. Se por um lado sabemos que a forma como encaramos e significamos os fatos da vida é que determinam grande parte de nossa visão de mundo, também sabemos que a realidade nos influencia e nos impacta.
É nessas constatações que se encontra o delicado desafio entre o que está ao nosso alcance e depende de nós, e aquilo que é intangível e devemos aprender a contornar. É neste equilíbrio entre o que de fato é nossa responsabilidade (como pessoa e como gestor) e o que faz parte da dança da vida, que a felicidade pode ser buscada. Isso porque quando queremos mudar os fatos, a realidade ou alguém, dificilmente teremos êxito e as pessoas serão felizes. Por outro lado, considerar que nada é possível ser feito para transformar a forma como encaramos os fatos, acaba sendo um ato de negligência, comodismo ou fatalismo. Ambas as posturas não favorecem a felicidade pessoal e profissional.
A reflexão que nos pode ser útil é buscar não cair na armadilha de que somos os únicos responsáveis por nosso sucesso e felicidade, pois isso seria ignorar o contexto, a história de cada um, as influências que sofremos e as relações que estabelecemos. Aliado a isso, é importante estarmos cientes de que nossa postura e modo de enfrentar os desafios é, em certa medida, o que pode promover um ambiente mais ou menos feliz, potencializando os aspectos positivos de quem convive conosco.
Felicidade e trabalho é uma aliança que para alguns se define como impossibilidade, para outros como arte, outros ainda como sorte ou ilusão. De qualquer modo, além da reflexão, é relevante considerarmos nossas ações: o que está ao nosso alcance e o que temos feito para sermos mais felizes com o que fazemos diariamente, bem como promover a felicidade de nossa equipe?
Mariana Fancio Gonçalo – Psicóloga, pós-graduada em orientação profissional pelo Instituto Pieron e mestre em psicologia e educação pela USP. É gestora de projetos e conteúdos e colaboradora em publicações da Metodologia OPEE – Orientação Profissional, Empregabilidade e Empreendedorismo.