Ícone do site Revista Direcional Escolas

Conversa com o Gestor — Colégio Viver

Matéria publicada na edição 71 | Setembro 2011 – ver na edição online
Aqui se Aprende a Ensinar, “Pelas Brechas do Olhar”

A referência a Reggio Emilia, notável experiência italiana de Educação Infantil, cabe bem ao Colégio Viver, pequena grande escola situada entre os condomínios de casas de Cotia, na Grande São Paulo. As artes e a “pedagogia da escuta” têm primazia em seu trabalho, do Infantil ao Fundamental II. Os alunos, bastante ativos, aprendem a aprender em uma escola “prét-a-Porter”, que a partir de uma estrutura básica “muda a todo o momento”, conforme o interesse e curiosidade deles.

Uma casa ampla e avarandada, com imenso quintal, muita terra, grama, brinquedos e árvores, lembra mais a uma chácara da avó que deixa os netos viver soltos na natureza, que propriamente a uma escola de Educação Infantil. Mas é uma escola e, em meio à grande liberdade com que as crianças circulam pelos seus espaços, apresenta uma proposta bem construída de desenvolvimento cognitivo, físico, motor, social, afetivo e intelectual para a idade. Com proximidades ao modelo de Reggio Emília, cidade italiana que veio constituindo, paulatinamente, desde o final da 2ª Guerra Mundial, uma referência de pedagogia com os pequenos, baseada na escuta, em sua curiosidade e na expressão artística, o Colégio Viver iniciou as atividades em 1977, por iniciativa de Anna Maria Ferreira.

Pedagoga, Anna queria resgatar um pouco da aprendizagem pela experiência que as crianças tinham antigamente, junto aos núcleos familiares expandidos, “uma casa em que se aprende uma porção de coisas pela vivência”. Assim ficou até 1998, quando iniciou o Ensino Fundamental, também com uma proposta diferenciada, fundada no socioconstrutivismo. Para essa expansão, Anna contou com a parceria de Maria Amélia Cupertino, que se tornou sócia majoritária. Dividido em duas unidades, uma em frente à outra, na Rua Antonio Pereira de Castro, na Granja Caiapiá, na altura do Km 28 da Rodovia Raposo Tavares, em Cotia, o Colégio Viver pode ser definido como uma “escola prêt-à-Porter”. “Temos uma modelagem básica, mas os ajustes são feitos a todo momento conforme o perfil de cada aluno, de cada turma”, diz Maria Amélia.

É uma escola viva, em movimento, de forte integração com a natureza. Na sede do Fundamental, salas de aula, corredores abertos, biblioteca, pátio, laboratórios, quadra e playground estão distribuídos em cinco mil metros quadrados de área, com muitas árvores e um bosque. Entre seus trunfos mais recentes, o Viver recebeu dois selos do Programa pelo Direito de Ser Criança, nas categorias “Aqui se brinca” e “Aqui se aprende pela experiência”, conferidos respectivamente às escolas de Educação Infantil e Fundamental I de todo país pela marca Omo, em parceria com o Instituto Sidarta. Foi um dos quatro finalistas, entre milhares de inscritos.

Outro atributo que diferencia o Colégio Viver é o da defesa da autonomia intelectual do aluno. Desde a definição das normas para uso da quadra e computadores ao elenco de disciplinas optativas oferecidas trimestralmente ao Fundamental II, passando pelos temas dos projetos, eles têm sempre voz ativa. O que significa, por exemplo, promover assembleias entre as turmas para estabelecer regras, solicitar aulas de RPG como eletiva e montar a redação do jornal da escola, o Página Aberta.

“Não dá para viver sem normas, mas temos um acordo que se uma regra não estiver legal, chamamos uma assembleia e tomamos uma nova posição. Claro que há questões inegociáveis, ligadas à segurança deles e às aulas obrigatórias”, ressalva a diretora Maria Amélia. O importante é que eles possam participar do regramento daquilo que lhes diz respeito, tomando consciência das razões do mesmo e assumindo responsabilidades pelo que decidem, avalia. Para a outra diretora, Anna Maria, o Colégio propicia, desta forma, “um treino para a vida futura”. “Nossos alunos são muito questionadores em relação às decisões da própria escola”, completa.

Anna Maria trouxe para o Viver um pouco da perspectiva de comunidade que presenciou em uma época em que viveu nos Estados Unidos. Ela admite que muitos pais estão desacostumados a esse nível de participação, mas com o tempo mudam sua visão de educação. Alguns acabam se mobilizando para resolver junto com a escola problemas pontuais, às vezes relacionados à disciplina ou lição de casa, já que encontram abertura para introduzir suas preocupações ou dificuldades.

Pilares do Aprender
Portanto, no Colégio Viver, todos – direção, educadores, colaboradores, alunos e familiares – estão sempre aprendendo. O modelo exige envolvimento e desprendimento, conforme pode ser visto na Educação Infantil. Suas turmas, com crianças a partir de um ano e meio, não são delimitadas por faixa etária ou ciclos. Os professores e a coordenação definem a programação a partir dos desdobramentos das demandas dos pequenos, que são agrupados segundo afinidades e curiosidades. “Pegamos um gancho deles para desenvolver um projeto”, explica Maria Amélia, sendo este um ponto de partida para que se desenvolvam, paralelamente, habilidades como a expressão oral, orientação espacial, Matemática etc. A diretora conta que o planejamento é bem flexível nesse momento, somente se torna um pouco mais dirigido na pré-alfabetização, junto da turma dos “grandes”, na faixa etária dos cinco anos. “Mas se houver um pequeno que manifeste interesse de acompanhar a atividade, ele pode ficar, pois os grupos nunca são fechados.”

A proposta exige um profissional bem treinado, que “saiba aproveitar as brechas e colocar conceitualmente o conhecimento, trabalho mais difícil do que se aplicássemos um planejamento convencional”. Segundo Maria Amélia, a equipe do Viver é escolhida dentro de um perfil de educador que aceite o desafio, de formação ampla e interesse multidisciplinar. Ao longo do processo, os professores organizam o portfólio dos alunos, até com registros de imagem acerca de seu desenvolvimento motor, material apresentado aos pais em reuniões bimestrais.

Já no Fundamental I, um grande eixo de aprendizagem é dado pelo chamado “projetão”, atividade que engloba todas as séries e conteúdos em estudos relacionados ao país. Há desdobramentos que dão origem a novos projetos, como já aconteceu com uma turma de 4º ano, que a partir de um trabalho sobre o Rio São Francisco, se interessou pelo estudo do cangaço e chegou a montar uma peça teatral sobre o tema. “Até a parte da Matemática se envolve com o ‘projetão’”, diz Maria Amélia, relatando que as atividades são concomitantes à apresentação do conteúdo curricular. Também o Projeto Brincar, aplicado do 1º ao 3º ano, merece destaque. A cada semana uma turma prepara uma brincadeira que ensinará a outra. Faz parte da tarefa produzir uma instrução escrita e oral do jogo, por meio do qual se trabalha convívio, leitura, compreensão, comunicação oral e expressão corporal.

Para o Fundamental II, são propostos projetos interdisciplinares do 6º ao 9º ano, com 2 horas/aulas semanais de atividades, orientadas por três professores. Os estudantes colaboram com a escolha dos temas e às vezes propõem conceitos e blocos de informações a serem trabalhados. Tudo é articulado ao conhecimento obrigatório de áreas como Português, Matemática, Ciências Naturais, Humanas e Biológicas, afirma Maria Amélia. Eles cursam ainda disciplinas eletivas, duas tardes por semana, em horário invertido.

Mas há momentos em que todos interrompem um pouco as atividades seriadas e transformam a escola em espaço único de produção e troca do conhecimento. São as semanas temáticas, que envolvem todos os segmentos em um grande trabalho coletivo. O resultado final é o de um aluno que “aprende a se virar sozinho, aprende a aprender, a selecionar, a julgar a informação, a transferir conhecimento”, e que conclui o 9º ano com facilidade de ingressar em escolas de alto nível, como a Escola Técnica Federal de São Paulo, destaca Maria Amélia.

Sustentabilidade do Negócio
Com o trabalho pedagógico reconhecido, a escola quer agora expandir sua clientela, crescer para torná-la economicamente sustentável, já que a renda proveniente de seus 200 alunos nem sempre cobre as despesas do mês. O caminho escolhido foi, mais uma vez, o de olhar para frente, apostando na inovação. “Estamos em momento de investimento, pois se não fizermos isso, não conseguiremos atingir outro patamar de público”, explica. “Tenho apostado na contratação de pessoal especializado para trabalhar com inclusão”, acrescenta Maria Amélia, que conta hoje com uma psicóloga para fazer acompanhamento mais próximo com alunos com necessidades diferenciadas.

A equipe do Viver é composta, no conjunto, pelas duas diretoras, que também exercem a função de coordenadoras, com três auxiliares de coordenação, 26 professores, seis auxiliares de classe, três de limpeza e duas de secretaria. A meta é aumentar em 50% o número de matrículas, atendendo às famílias da Granja Viana e até de bairros próximos de São Paulo. “A gente não tem intenção de ser grande, esse é um projeto educativo para escola pequena, mas precisa crescer um pouco para ser autossuficiente”, finaliza a diretora.

O VIVER ARTÍSTICO E PARTICIPATIVO

A proposta pedagógica participativa faz toda a diferença nos relacionamentos estabelecidos no Colégio Viver. “Aqui é uma segunda casa pra mim”, define Gustavo Siqueira, 14, estudante do 9° ano. Aliás, é muito comum ouvir a afirmação entre os estudantes, quando comentam a relação que mantém com a escola.

Por criar um ambiente familiar, o Colégio também conseguiu a participação dos alunos no cuidado dos materiais. A política de manter tudo o mais organizado possível ajuda os jovens a desenvolver um senso de comunidade que, muitas vezes, não é explorado fora da escola. A consciência de que a escola é um organismo vivo e participativo é gerada nas atitudes e hábitos dos adolescentes do Viver.

Para o terceiro trimestre de 2011, por exemplo, nove matérias optativas estão disponíveis aos alunos do Fundamental II, sugeridas por eles. Às segundas-feiras, a imaginação é amplamente alimentada nas aulas de Role Playing Game (RPG), jogo em que os participantes assumem papéis de personagens e as histórias são construídas de maneira colaborativa. “A disciplina mostra uma forma diferente de se divertir, sem usar necessariamente as novas tecnologias. Além disso, também promove um trabalho muito forte em grupo”, diz o orientador do projeto Marco Tonanni. Dessa forma, a relação entre aluno e professor não fica limitada a formalidades, mas, com respeito, é criado um ambiente leve e divertido.

“A proximidade entre os professores e os alunos é uma característica muito forte aqui. Ao mesmo tempo em que existe respeito, há uma informalidade muito gostosa entre nós”, avalia Danielle Noronha, responsável pela disciplina optativa do jornal Página Aberta. A professora coordena os participantes a usar a criatividade para tomar inúmeras decisões envolvidas com a elaboração de um jornal. Para a próxima edição, a turma está criando um visual baseado na literatura de cordel, com ilustrações em xilogravura. “No Viver eu tenho a oportunidade de trabalhar muito mais com arte e soltar a imaginação”, conta Marcella Benevides, 12 anos. Vinda de outra escola, ela diz que sentiu uma diferença muito grande ao se deparar com as propostas do Colégio, que consegue integrar diferentes disciplinas em projetos que não se tornam cansativos.

Assim, as ferramentas artísticas e colaborativas facilitam o aprendizado dos alunos. Em uma das semanas temáticas, que trabalhou Humanidades, a adolescente Helena Talerman, 14 anos, fez ilustrações em xilogravura para representar a ditadura, momento marcante na História da Nação. “Minha matéria preferida é arte”, diz a jovem, no Viver desde a Educação Infantil. A aluna conta que mantém relação de proximidade com muitos professores, e que a convivência gerou a oportunidade de manifestar suas opiniões a respeito de diversos assuntos e buscar orientações sobre dúvidas relativas à adolescência.

Saiba mais

DANIELLE NORONHA
comunicacao@colegioviver.com.brcoordenacao@colegioviver.com.br
Twitter: @colegioviver

Sair da versão mobile