Ensino de conteúdos acadêmicos, instrumentalização para o desenvolvimento de habilidades cognitivas, sensibilização para competências socioemocionais, hoje clamam por mais um campo: desenvolvimento integral do ser humano, da instituição e da comunidade
Já entramos na segunda década do século XXI. Passamos pela década da informática( 1970), depois da década do cérebro (1990) e vivemos na década da transformação( 2000).
Passamos pela geração X (nascidos entre 1965 e 1977) e baby boomers (nascidos entre 1946 e 1977). No final dos anos 70 e início dos anos 90, com a geração Y. E também com a geração Z- os nativos digitais-, geração que compreende os nascidos entre o fim de 1992 a 2010, que está ligada intimamente à grande expansão da internet e dos aparelhos tecnológicos.
Flutuamos diante uma sociedade líquida*, porém de pouca profundidade, reflexão e coerência. Nunca emergiu tantas diferenças, minorias, debates velados e insatisfações desveladas.
A neurociência também está revolucionando os paradigmas de como o cérebro aprende. A plasticidade neural e equipamentos de ressonância magnética de última geração revelam o funcionamento do mais importante e inteligente órgão do corpo humano, o cérebro-que é único-, ao mesmo tempo que outros esforços high tech se dirigem para… Marte. Mas entre o neurônio e o marciano há um sistema educacional que grita no Brasil.
De fato a responsabilidade da educação de qualidade, deveria ser dê e para uma pátria que educa( diferente da “pátria educadora”), mas infelizmente, em nosso país, encontramos uma pátria, fracionada, e fraquejada em seus princípios e necessidades de políticas públicas coerentes e competentes.
Tentativas fracassadas; poucos objetivos alcançados; outros atropelados. Proliferação de siglas, instrumentos de medida, secretarias, pastas, ministérios, portarias e um novo secretário da educação para São Paulo.
O Estado de SP ficou sem “cabeça”no início deste ano, sem seu secretário da educação, pois diante uma medida resolutória, competente, fundamentada, deixou-se de lado a interlocução, o espaço para a opinião pública, o tempo para dúvidas e sugestões, a democracia das resoluções. Sai o Herman e fica no man. Poucos contestam com causa. Alguns sem qualquer causa e outros com motivações bélicas, arruaceiras, desestruturadoras. Alguns são pagos para invadir e destruir o que é patrimônio público, quebrar carteiras e computadores, atear fogo em salas, hostilizar funcionários, professores, alunos e suas famílias. Se eu não tivesse visto, também acreditaria apenas no que a imprensa mostra. Em parte confirmo minha sanidade, pois testemunhei que a grande maioria não protestava por melhoria, mas sim para o “nada”. Digo, pois quem usa uma escola, para vandalismo não quer nada de bom, nem de bem.
Mas a ideia, o plano do ex secretário de educação do Estado de SP era, por incrível que pareça, boa e havia sido estudada. Era necessária, coerente, econômica, inteligente, mas faltou uma parte igualmente importante: a comunicação, o diálogo, o ver junto ao outro, para ver melhor.
Neste cenário é emergente, então, o entendimento de que a educação competente só acontecerá quando a escola, a família e a comunidade trabalharem juntas, somarem seus recursos e empenhos.
Não dá mais pra não ler, a realidade. Não dá mais pra só reclamar, julgar e se eximir. Hoje também é o momento de encontrar em cada um, o lado solidário, a parcela que não é apenas “o meu, o seu e o nosso”, mas “o meu, o seu, o do outro e o de todos”.
Não resolve dispor de tecnologia e conhecimento, sem estudar, sem ouvir, sem logar o outro, sem legitimidade. Dar ouvidos ao outro lado, quando queremos genuinamente o bem, o bom, o correto e o razoável, assim estamos todos no mesmo lado. O lado redondo, em espiral, que promove, cresce, cria soluções e resolve problemas. Digo que a escola está entre o gis e o bite. Entre o concreto e o líquido. Precisamos, então, de uma educação de vidro. Transparente, firme, estruturada, mas maleável o suficiente para se adaptar e ser honesta com o possível e não apenas desejável. Uma educação de vidro. Não aguento mais sujeira, corrupção, maracutaia, assim como acredito que você também. Precisamos ver além…
Formar mediadores, o professor que aprende para compartilhar e não apenas ensinar. O educador que se vê para ver o outro, vê através e vê melhor.
É, a escola não é mais palco para transmissão de conhecimentos e aprendizados de disciplinas acadêmicas, apenas. A escola não é mais onde só o aluno aprende. A escola é espaço de construção, promoção socioemocional, trocas daquilo que é necessário a todo ser humano. Espaço e tempo de humanidade. Espaço, tempo e conhecimentos de valores, ética, disciplina, respeito, humildade, autocontrole, dignidade.
Desta forma acredito ser possível que entre um neurônio e Marte ou qualquer outro ponto hajam conexões, muito mais além das sinapses, mas uma rede de vidro que tece e sustenta uma nação: a Educação.
Texto de Adriana Fóz
Educadora (USP)-Psicopedagoga (Sedes Sapientae)
Especialista em Neuropsicologia (CDN/UNIFESP)
Coordenadora-gestora do Proj.Cuca Legal-Psiquiatria-UNIFESP
Consultora para Projetos em Educação e Saúde da Mente
Membro do INS