O espaço físico escolar é um dos ambientes que milhares de estudantes – bem como colaboradores e funcionários – transitam durante um longo período de suas rotinas. E, de certa forma, esse tempo é ampliado em instituições que disponibilizam o ensino integral. Para além do plano pedagógico e das tarefas cotidianas, é de extrema importância, no decorrer da rotina escolar, estabelecer ações de prevenção que promovam o cuidado, a segurança e o bem-estar de todos e todas.
Nesse sentido, além de adequar o colégio em normas e regulamentações, é preciso realizar capacitações técnicas, treinamentos, simulações e, também, a implementação de programas de ensino de primeiros socorros. “Existe uma teoria do tripé da segurança e isto se aplica totalmente ao ambiente escolar, e diz assim: invista 70% em educação de todos, desenvolva 30% em protocolos e terá 0% de acidentes”, afirma Eric Amorim, especialista em segurança escolar.
“Sabemos que a educação é o pilar mais importante, mas realmente investimos nela quando falamos de educação em primeiros socorros? Nosso desafio é fazer com que a escola enxergue este conhecimento como fundamento para as suas ações dentro da escola, pois muitos conhecimentos transformam as pessoas, mas só este conhecimento salva alguém!”, continua o especialista. Em um plano comparativo, países como Japão, Chile e Estados Unidos, por exemplo, o ensino dos primeiros socorros é incorporado logo nos primeiros anos escolares, conta Amorim.
O conhecimento do que se deve fazer (ou não) em situações de emergência deve ser incorporado em toda a comunidade escolar, inclusive como pedir ajuda ou telefonar para a emergência. “Saber o que não pode fazer é importante, mas saber como fazer para ajudar a si próprio ou um familiar também é. Saber os telefones de emergência e para que serve, por exemplo, já deveria ser ensinado logo nos primeiros anos. Mas como ensinar se em muitos casos nem os professores sabem? É isto que observamos em nossas capacitações”, reflete o especialista.
Corroborando com essa ideia, Wellington Moreira Ribeiro, enfermeiro, pedagogo, especialista em urgência e emergência, e saúde coletiva e comunitária, indica que o ambiente escolar é o segundo lugar onde mais acontecem acidentes com crianças, “e o ensino em primeiros socorros traz conhecimento de um assunto que é realidade: todo mundo, em algum momento da vida, irá se machucar ou se deparar com uma emergência de saúde. Saber o que fazer e estar preparado pode fazer toda a diferença”.
“Informações básicas, como saber os números de emergência em saúde, SAMU 192 e Bombeiros 193, é um dos pontos iniciais. Saber reconhecer uma situação de emergência de forma precoce, buscar manter a calma e manter-se seguro são essenciais antes mesmo de prestar o socorro propriamente dito, e já auxiliam e muito no cuidado. Tais habilidades são adquiridas com a inclusão da abordagem periódica do tema, através de cursos e treinamentos, onde a pessoa passa a ter mais segurança, pois o assunto não é mais desconhecido. Uma escola que trabalha primeiros socorros zela pelo próximo, se prepara para o imprevisto e diante do imprevisto sabe agir da melhor forma possível”, garante o enfermeiro.
ENSINO DE PRIMEIROS SOCORROS
Partindo do pressuposto de que o ensino de primeiros socorros deve ser transmitido para todos e todas, inclusive para os estudantes menores, é preciso se atentar às atividades didáticas que serão escolhidas para conduzir a transmissão desse conhecimento. De maneira geral, podemos afirmar que quanto mais cedo as crianças e os adolescentes forem treinados, melhor conseguirão agir em uma situação de emergência e, consequentemente, salvar-se ou salvar uma vida.
De acordo com Eric Amorim, as atividades desenvolvidas com as crianças podem ser leves, divertidas e interativas. “Leve e divertido porque o conteúdo assusta e dependendo da didática do instrutor poderá gerar mais traumas do que ações positivas. A preparação é séria sim, mas temos que buscar auxílio na inteligência emocional e na neurociência para facilitar o aprendizado de todos. Tem que ser interativo, pois também é divertido entender como fazer, sem a prática neste assunto o resultado não será satisfatório”, explica.
Em termos práticos, com as crianças, por exemplo, as atividades podem ter um caráter lúdico, ressaltando a solidariedade, a ajuda e a empatia. Para Wellington Moreira Ribeiro, é fundamental observar a faixa etária e o nível de desenvolvimento antes de abordar um novo conhecimento com os alunos – e com primeiros socorros não é diferente. “Vemos ótimos resultados na inclusão deste assunto a partir dos 5 anos, utilizando uma abordagem lúdica, com uso de ilustrações e brinquedos”.
“É possível ensinar as crianças a reconhecer situações de perigo, como se manter em segurança diante de uma emergência, conhecer os números de emergência e saber aciona-los. A partir de crianças de 10 anos é possível ensinar técnicas de cuidado, como de curativos, manobra de desengasgo, reanimação cardiopulmonar, utilizando simuladores apropriados e gerando muita eficácia nos resultados”, indica o enfermeiro.
LEI LUCAS
Em outubro de 2018 foi sancionada a Lei 13.722/18, determinando que professores e funcionários de escolas (públicas e privadas) de ensinos infantil e básico devem ser capacitados em primeiros socorros. A Lei, conhecida como “Lei Lucas” (em homenagem ao estudante Lucas Begalli Zamora, que sofreu uma fatalidade durante um passeio escolar), define que os cursos de primeiros socorros sejam ofertados anualmente, tanto para a capacitação como para a reciclagem do aprendizado. Segundo o portal da Agência do Senado Federal, “o objetivo do treinamento é possibilitar que os professores consigam agir em situações emergenciais enquanto a assistência médica especializada não for proporcionada”.
Além do caráter obrigatório, conta Wellington, auxiliar de maneira efetiva e adequada diante de uma situação de emergência, ressalta um caráter social e humanitário, sendo extremamente gratificante poder aliviar a dor do próximo, prestando os primeiros socorros até a chegada do atendimento especializado.
“Trabalhar primeiros socorros em ambiente escolar não tem em hipótese alguma a pretensão de excluir o atendimento especializado de enfermeiros, médicos e bombeiros, tampouco capacitar o corpo docente para essas habilidades. Mas proporciona a forma adequada de agir até a chegada do serviço especializado, através de manobras simples que garantem a segurança do profissional que está socorrendo e de sua equipe, da pessoa que está recebendo cuidados e de toda instituição de ensino”, ressalta.
Para os/as gestores/as que pretendem buscar empresas para o treinamento em primeiros socorros, Wellington indica que o ideal é a contratação de empresas que disponibilizem um conteúdo específico para o cotidiano escolar em uma linguagem apropriada aos educadores, “além de utilizar boa quantidade de atividades práticas em bons simuladores e trabalhar com profissionais de saúde com nível superior”, finaliza. (RP)
Saiba mais:
Eric Amorim – eric.amorim79@gmail.com
Wellington Moreira Ribeiro – wmr_wellington@hotmail.com