VERDADE (Carlos Drumonnd de Andrade)
[…]chegou se a discutir qual a metade mais bela.
As duas eram totalmente belas.
Mas carecia optar.
Cada um optou conforme seu capricho,
sua ilusão, sua miopia.
Em uma mesa de debates, educadores, pesquisadores, estudiosos, autores de livros, palestrantes em Congressos Nacionais e Internacionais, refletiam sobre a qualidade da gestão educacional e a construção de teorias para o bom desempenho das funções à luz dos contextos concretos, de vivência e experiência na prática.
Refletiam sobre a importância da experiência de ser professor antes de assumir a Direção de uma Escola e falavam de perfis que mais têm dado certo como gestores de escolas, indicavam que, independente da especialização, um fator determinante era a pessoa ter tendências natas para a liderança.
Entre os que participavam ativamente da discussão, um dos presentes disse que achava importante para um autor de livros de formação de gestores, que aborda sobre a gestão, ter experiência em ambientes de gestões, ter pisado ou estar pisando o “chão da escola”, ter estado ou estar frente a frente com os problemas dos espaços da gestão escolar para construir experiências e escrever com maior propriedade sobre um tema tão complexo.
Dialogou-se também que fica abstrato falar de gestão educacional sem vivenciá-la, sem conhecer o ambiente, as relações de trabalho de uma escola, as dificuldades de liderar grupos de educadores, trabalhar a formação continuada de professores, a orientação de aprendizes e famílias, os conflitos, as reais necessidades que com toda certeza um gestor educacional enfrenta em seu dia a dia de árduo trabalho.
A reflexão continua pontuando sempre como se pode falar de uma prática, orientar um trabalho de gestor quem não a vivenciou, só estudou sobre e passa a escrever orientações para que outros aprendam, adquiram experiências, sobre como trabalhar a democracia na escola e a liderança educacional.
O grupo continuou dialogando sobre o sentido da experiência para o aprender, e reconhecia que por trás de toda a teoria validada tem um exercício prático.
Para pensar: quem escreve, discursa, ministra aulas sobre liberdade, democracia, autonomia, fala do aprendiz, de desenvolvimento, de ensino e aprendizagem, de metodologia, de didática, de avaliação, de disciplina/indisciplina sem vivenciar a concretude de uma escola, de uma sala de aula, de relações diretor – coordenador -professor e aluno, seria capaz de trabalhar as contradições reais e saberia o que concretamente necessita um gestor para obter liderança significativa frente aos diferentes conflitos dos espaços educacionais?
O exercício de uma gestão é saber dialogar, saber ouvir, saber se posicionar com respeito, desconstruir posturas autoritárias, verdades prontas, lidar com o imprevisível, com a má formação dos educadores, com as avaliações internas e externas, com a não aprendizagem dos alunos, com o comportamento das novas gerações, com as famílias e por isso mesmo não daria para dizer sobre esses contextos sem vivenciar a prática de olhar sobre, refletir sobre, reconstruir pensares sobre e agir concretamente. É o exercício do conhecer os contextos, seus enredos, seus atores e autores reais que existem dentro do espaço escola.
De longe não se conhece o dia a dia de uma escola. Para conhecê-la é preciso de uma imersão na realidade escolar e, estando inserido construir os saberes na prática e para a prática e aceitar que para ser um bom gestor terá que ser um eterno aprendiz de teorias e práticas de gestão.
A construção de saberes não se dá a partir de leituras e reflexões distantes de um diálogo com o sensível real. Quem pensa que a partir de leituras de registros se apropria de verdades, terá apenas parte da verdade, é necessário que compreenda que a verdade pensada por um, para também ser verdade de outros é preciso realizar o movimento de apropriação que se dá por meio da vivência e da experiência. Repetir o que não se construiu ou reconstruiu é ser copista e emissor de opiniões e pareceres a partir de construções alheias e sem qualquer fundamento.
A Construção de determinados conceitos/conhecimento segundo Fernandèz, 1991, passa pela sensação, percepção, formação de imagem, simbolização e conceituação e não dá para construir efetivamente somente com leituras.
A partir da sensação percebemos o mundo; da percepção interpretamos os estímulos relativo a sensações, iniciando a tomada de consciência que conduz a formação de imagens, que se principia nas sensações recebidas, percebidas, interpretadas e nos permite realizar o registro das experiências vividas levando à simbolização, que nos permite representar uma experiência de forma verbal ou não verbal e chegarmos a conceituação/conhecimento que é o resultado de uma organização, de um saber a partir do vivido pela nossa capacidade de abstração, classificação, categorização, construindo a consciência das qualidades de um objeto ou de uma ideia.
Falar de construção de conhecimento e falar de viver o aprender, o fazer e o ser, o olhar para o objeto do conhecimento e refletir sobre, experienciar, sistematizar, concluir e transformar o olhar que se tinha antes.
Escrever a partir do que outros escreveram é deixar de sentir o “cheiro e o sabor” é ser o outro e não autor, é um plagiar de vivências de terceiros.
A formação dos educadores do nosso Brasil tem passado apenas pelo movimento da teoria sem o conhecer, nas academias as lições são teóricas, a vivência da prática docente está ausente, os estágios são proformas, não acontecem, os professores formadores, em sua maioria, nunca pisaram o “chão” das escolas, principalmente o da educação infantil, são declamadores de teorias que assumem a formação de novos professores para serem docentes da Educação Básica.
As formações falam de crianças abstratas, assim como de espaços, famílias e educadores também abstratos, porque a maioria dos formadores está longe das escolas, não conhecem as crianças na realidade deste tempo presente, das relações escolares no hoje, porque nunca estiveram nelas como profissionais da Educação Básica, em relação à educação infantil muitos não a frequentaram quando crianças.
A pergunta que fica principalmente para as crianças pequenas: Quais as consequências para educadores da infância que em suas formações aprendem com declamadores de teorias que ensinam a partir de olhares abstratos, dizem sobre o que não vivenciaram, assim como não experimentaram as relações entre educador e criança nos aspectos do desenvolvimento biológico, motor, psíquico, afetivo, emocional e social?
Ensinar sobre o que se lê é diferente do ensinar sobre o que se estuda, presencia, diagnostica, planeja, replaneja , executa, acompanha, avalia, reavalia, conclui e celebra os resultados. Assim como escrever distante do objeto de pesquisa é produzir abstrações de uma realidade.
É preciso pensar que a boa qualidade da escola passa significativamente pelos educadores e, para tanto, é preciso de mudanças nos cursos de formação e nas literaturas referentes à gestão que, salvaguardando exceções, não têm correspondido às exigências da realidade educacional e de um bom ensino e aprendizagem.
É preciso, portanto, pensar na carreira do professor de magistério, considerando que mestres, doutores, pós-doutores sem vivência prática, não contribuem para a melhoria do ensino e podem, muitas vezes, distanciar os futuros profissionais da realidade que a escola se encontra.
Autores:
Emilia Cipriano – Doutora em Educação – PUC/SP. Mestre em Psicologia da Educação – PUC/SP. Especialista em Desenho e Gerência de Políticas Públicas e Programas Sociais INDES – Instituto Interamericano para o Desenvolvimento Social e BID – Banco Interamericano para o Desenvolvimento-(300 horas), Pedagoga, Assistente Social, Professora Titular PUC/SP.
Claudio Castro Sanches – Doutorando em Educação – Mestre em Educação PUC/SP, Pedagogo e Professor.
Diretores do Instituto Aprender a Ser – Pesquisa e formação na área educacional.