A estrutura física estudantil, compreendida como uma área de intensas relações, recebe, diariamente, inúmeros estudantes, de diversas idades e identidades, com aspirações múltiplas e ávidos para observar e aprender. Mas também sentir, relacionar e dialogar com um circuito denso de afetos que toda a arquitetura escolar – física e emocional – propicia de maneira instigante a todos e todas que frequentam o longo caminhar da aprendizagem.
Nesse processo de interação, que recebe influência de uma infinidade de fatores, funda-se um emaranhado de saberes, práticas, valores, crenças e conhecimentos. E, nessa rede, fortalecida no interior de cada instituição, certas ações e cuidados podem amenizar os impactos psicológicos inerentes aos seres humanos. Na atualidade, há uma urgência na ênfase socioemocional nas escolas.
Nos últimos meses, em especial, diante dos reflexos da pandemia causada pelo novo coronavírus e do isolamento social como medida necessária de precaução, observamos um movimento crescente sobre os cuidados emocionais de todos que compõem a instituição. “Os educadores sabem que as habilidades socioemocionais desempenham um papel importantíssimo na aprendizagem, e se há alguma coisa que essa pandemia nos mostrou, é o quanto essas habilidades são necessárias para a vida”, diz a psicóloga Sara Cordeiro.
De uma maneira geral, a ruptura dos encontros nas aulas presenciais, a alteração brusca da rotina, os sentimentos e as sensações que afloraram com a pandemia, além da elaboração do luto que alguns alunos e familiares podem ter enfrentado, são algumas das características que podem refletir em diversos níveis no psiquismo dos estudantes. Segundo a psicóloga, para crianças que demandam de atendimento terapêutico especializado, por exemplo, a ausência de terapias também pode gerar um luto para a própria criança e, para os familiares, um forte sentimento de impotência.
“Outro fator é que crianças em geral podem ter sido expostas a situações altamente estressantes, que, infelizmente, podem incluir violência doméstica, abuso ou negligência, situações que podem ter sido acentuadas pelo isolamento ou sido enfrentados pela primeira vez. Os gestores devem estar cientes ainda que, com o longo período de isolamento, os vínculos com os amigos e os professores podem ter sido prejudicados. Além disso, por se tratar de uma doença contagiosa existe uma abertura para o surgimento do bullying”, destaca Cordeiro.
CUIDADO E ATENÇÃO
“Todos os alunos precisam de atenção – no ensino infantil e na educação fundamental 1 há algumas peculiaridades”, diz Carolina Cherubini, coordenadora pedagógica da Escola Santi (SP). “Os educadores da escola, assim como o grupo, constituem parte da vida dessas crianças. Assim como acontece com alunos maiores, no entanto, para os menores a convivência virtual é menos eficiente no que diz respeito a manter as amizades, a interagir com qualidade, a brincar junto, a poder ser quem realmente é no dia a dia”, completa.
Dessa forma, para os menores, o espaço físico da escola – e as suas relações pessoais próximas, seus momentos, suas brincadeiras e experiências, o cuidado, o toque, o desenvolvimento e, também, os laços afetivos – é extremamente significativo e, para o retorno às aulas, precisará de uma atenção redobrada.
“As mediações de conflito, as amizades, os grupos, as brincadeiras, o brincar livre e dirigido, fora da sala, todas essas situações precisarão de atenção, assim como as rodas de conversa com olho no olho, a atenção aos sentimentos das crianças, a conversa espontânea, que hoje acontecem de forma menos prática. Estaremos atentos a essa diversidade de momentos, acolhendo os desejos, as angústias e as necessidades emocionais, sempre que necessário – seja virtual ou presencialmente esse deve ser um olhar a se manter”, destaca a coordenadora.
Segundo Cherubini, assim como os alunos, os profissionais também estão atravessando um momento atípico e sem precedentes. Para ela, é fundamental que a gestão escolar seja um alicerce para os profissionais da comunidade escolar, com um acolhimento, uma escuta ativa, além de reconhecer o esforço que estão vivendo “e incentivar a busca por pontos de refúgio do estresse, por exemplo, fazer atividade física, meditação, ou até mesmo passar um tempo de qualidade com a família, podem ser momentos de descontração, que produzem bem-estar. Cada pessoa elabora de um jeito o que estamos vivendo e, como escola, precisamos cuidar da comunidade como um todo. Cuidar de quem cuida das crianças é parte do projeto da escola”.
DIÁLOGOS
No Colégio Anglo 21, localizado na zona sul de São Paulo, uma das ações realizadas com o intuito de reduzir o impacto na saúde emocional dos alunos durante a pandemia e o ensino remoto, foi a articulação de canais de escuta entre pais e professores, gerando resultados positivos nos estudantes.
“Nós fazemos enquetes periódicas com pais e alunos, nas quais conferimos o tempo de dedicação às atividades online, percepção de aprendizagem e sensações, e a partir deste ponto, alinhamos novos combinados em outros fóruns, como reunião de pais e assembleias de classe no formato online. Essas revelações foram fundamentais para que pudéssemos ajustar questões práticas para melhoria das aulas, das avaliações e do acolhimento de modo geral”, explica Bianca Ventura, orientadora do colégio.
Nessa dinâmica, uma das ações foi realizar uma roda de conversa on-line com a comunidade escolar para debater sobre os diversos temas relacionados ao contexto atual, intitulada Diálogos 21. “Nossa próxima rodada se chama ‘Como Reduzir o Estresse durante a Pandemia’ e contaremos com a participação de três mães que vão trazer contribuições das suas áreas profissionais para tranquilizar o dia a dia de alunos, pais e professores. A intenção desses encontros é unir a comunidade escolar, pois sentimos muita falta do ambiente presencial”.
Nesse período de pandemia, conta a orientadora, os alunos demonstraram a necessidade da aproximação da escola e, com isso, a instituição criou uma agenda de apoio escolar paralela às atividades do cronograma de aulas e eventos, além de um grupo no WhatsApp para estreitar a relação entre os estudantes e a escola.
“A organização de encontros individuais com os professores, ou em pequenos grupos, permitiu ampará-los mais em seus percursos de aprendizagem, principalmente os alunos que tiveram mais dificuldade na adaptação ao novo formato. Precisamos flexibilizar prazos e considerar estratégias de apoio emocional para lidarmos juntos com os desafios dessa realidade de distanciamento e isolamento social”, conta Bianca.
Saiba mais:
Carolina Cherubini – carolcherubini@escolasanti.com.br
Bianca Ventura – bianca.ventura@colegioanglo21.com.br
Simone Sara de Jesus Cordeiro – simonesara@gmail.com