Hoje vou começar minha coluna tomando como referência a sabedoria e sensibilidade do nosso querido e saudoso Rubem Alves que, de uma forma muito sensível, percebeu que o que as escolas precisavam é de ESCUTAR mais seus alunos, adequar menos e apenas emprestar seus ouvidos com amor e a serviço do amor. Conforme podemos ler:
“O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranquila. Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: ‘Se eu fosse você’. A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros. Aprendi prestando atenção”.
Impressionante como ele era sábio e já havia entendido que os educadores tinham muita pressa em chegar no objetivo final. Ele, porém, já sabia que o “conteúdo” estava em cada chegada com nova partida, entendeu bem antes de nós que a educação é – sempre foi e será – incompatível com a pressa, pois ela acontece no tempo certo. Ela acontece naquilo que é dito diferente, ao contrário daquilo que todos costumam dizer.
A educação acontece no encontro, onde duas ou mais pessoas acreditam e apostam umas nas outras. A aprendizagem acontece quando ambos – professores e alunos – concordam sobre coisas pequenas, é no momento em que a palavra do adulto toca a alma da criança.
É assim que a educação acontece, é no caminho oposto do “correr com a matéria”, é na contramão das avaliações destituídas de sentido. O ato de educar é um exercício diário que não se perde ou se ganha, esse exercício não tem métodos e muito menos respostas. Ele é um encontro, ele se autoriza mutuamente ou não. Certa vez eu li uma tirinha do querido Charlie Brown, onde ele explicava ao seu amigo sobre a importância da escola:
“Sabe porque temos que tirar boas notas na escola? Para passarmos do primário para o ginásio. Se tirarmos boas notas no ginásio, passamos para o colégio e se tirarmos boas notas no colégio, iremos para a universidade, e se nesta tiramos boas notas, conseguimos um bom emprego e podemos casar e ter filhos para mandá-los à escola, onde eles vão estudar um monte de coisas para tirar boas notas e…”.
E quem sabe assim, os filhos vão repetindo nossas tristes histórias sem sentido. Esqueçam! Nossos alunos e filhos não mais caminharão em trajetos que não são os deles. Eles não mais aceitarão repetir modelos dos quais eles não acreditam. Eles não mais nos ESCUTARÃO se nós não tivermos algo novo para lhes contar. Eles não mais irão se identificar com adultos que não sabem no que acreditam (mesmo que para eles não seja o certo), talvez eles possam acreditar em ADULTOS que admitam que não tem todas as respostas e que também são seres humanos, tentando acertar.
Sejamos mais humanos e menos professores da pressa! Demorei anos para “concluir” que o que temos que desaprender é exatamente a TER PRESSA.
Não foi à toa que fui fisgada pela Psicanálise que faz uso da Escuta e leva tempo: “Estar à escuta[1] é sempre estar à beira do sentido, ou num sentido de borda e de extremidade, como se o som musicalmente escutado, quer dizer, recolhido e perscrutado por ele mesmo (…)”. Escutar a nós mesmos e aos nossos alunos de forma disponível, sem pressa, sem concluir o que ele quer dizer, ou o que nós estamos pensando, ou o binômio tão caro e vivo na educação: certo e errado. O que aqueles corpinhos tão agitados podem estar sinalizando ou mesmo dizendo sem palavras? Pensar sobre isso, leva tempo.
Em colunas anteriores, eu já insistia no assunto e continuo fazendo este longo e penoso caminho: O Caminho da Escuta, desacelerar o “EU TAMBÉM”, “COMIGO ISSO JÁ ACONTECEU” ou “FAÇA ISSO OU AQUILO”. Observem que palavras vocês têm dito aos seus alunos e quais vocês têm escutado?
Já ensinamos muito, o momento agora é de desaprender e ESCUTAR SEM PRESSA…
[1] Livro: “À Escuta”, do filósofo francês Jean-Luc Nancy (2014, p. 17-19).