Matéria publicada na edição 72 | Outubro 2011 – ver na edição online
A escola é uma empresa de natureza diferenciada, pois interage fortemente com a subjetividade de todos envolvidos. Assim, buscar a gestão participativa é uma das saídas para lidar com os desafi os contemporâneos, conforme destacaram algumas conferências do Saber 2011. Confi ra em dois cases e veja como os sistemas de ensino se adaptam a essa nova realidade.
Em uma das mesas de debates do Congresso do Saber 2011, em que se discutia como trabalhar as relações humanas dentro da escola e a formação de um jovem atuante, o diretor do Colégio Renascença, João Carlos Martins, alertou gestores e educadores presentes na plateia que “somente teremos uma juventude empreendedora se ela puder observar as pessoas fazendo isso” em cada uma das instituições. Esse é o ponto de chegada da “gestão de excelência” a que o evento se propôs a discutir, em mais de cem palestras e atividades.
“O papel da escola é o de universalização da cidadania e o desafio do gestor é o de envolver o professor e a equipe nesse compromisso”, pontuou Martins. Segundo ele, a gestão participativa torna-se, neste contexto, o grande desafio e também modelo para que provoque atitudes empreendedoras. “Difícil é fazer o professor pensar assim, pois ainda temos uma escola muito fechada no planejamento e centrada em conteúdo”, ressalvou o diretor do colégio voltado à comunidade hebraica de São Paulo.
Segundo análise do consultor e ex-diretor da Rede Católica de Educação, Roberto Prado, predominam na atualidade dois principais modelos empresariais de instituições privadas de ensino: de um lado, a escola focada na ampliação do seu mercado, competitiva, e, de outro, aquela voltada a nichos específicos, a uma clientela diferenciada. De qualquer maneira, porém, ambos devem proporcionar um processo de aprendizagem mais participativo (para professores e alunos principalmente) e contar com educadores que atuem como mediadores do conhecimento.
Colégio Renascença
A IMPLANTAÇÃO DE UM ORGANOGRAMA CIRCULAR
No Colégio Renascença, há cerca de seis anos iniciou-se o desenvolvimento de um “organograma circular” de gestão, conforme definição do diretor João Carlos Martins. “O centro da preocupação é o projeto pedagógico e sua sustentabilidade é dada pela responsabilidade que cada um assume no desenho de participação dos processos”, explicou. Em outras palavras, isso significa que direção, coordenação, docentes, alunos e familiares encontram espaços próprios para pleitear, propor e defender demandas e ideias, bem como ouvir e compreender as escolhas feitas pelos gestores e educadores.
“Isso não significa que tudo vai ser colocado ou acatado em assembleia. A escola tem um plano diretor para orientar as discussões”, esclareceu Martins. Além disso, as demandas são pautadas ou discutidas conforme o interesse coletivo e não o individual. Segundo o diretor, nos primeiros encontros com os pais, por exemplo, a tendência é que venham inicialmente muitas reclamações, mas com o tempo, “conforme a comunidade vai participando, ela se compromete e se torna mais parceira, menos cliente”. O Renascença promoveu a formação de uma comissão de pais, com dois representantes por turma, eleitos anualmente. Ela participa de encontros mensais com a direção e a coordenação, tratando de aspectos pedagógicos e administrativos que surgem no seu dia a dia, discussões que acabam contribuindo “para o planejamento do ano seguinte”.
Outra comissão é a dos professores, também com reuniões mensais com a direção e a coordenação. Essas duas instâncias, por sua vez, se reúnem semanalmente. A agenda da comissão não substitui o trabalho de formação e orientação dos docentes, que contam com horários estendidos remunerados, para que se dediquem aos estudos e projetos. Finalmente, alunos e funcionários possuem suas respectivas comissões, cujas reuniões com a direção acontecem bimestralmente. Entre os alunos, é definido um representante por classe, do 1º ano do Fundamental ao Ensino Médio. “Os encontros com eles preveem atas e devolutivas para a sala, representam um exercício de cidadania”, analisou Martins. As pautas são abertas, em geral trazem demandas relativas a cantinas, professores e projetos, e vêm acompanhadas “de reclamações ou elogios”.
O gestor alertou, entretanto, que as instituições precisam desenvolver “competência para se abrir e discutir o projeto pedagógico”. “As escolas devem melhorar a comunicação com a família e a comunidade, mas esse é um espaço que requer cuidados.” O gestor, por exemplo, tem que “deixar clara sua autoridade, papel e responsabilidade”. “Não é um exercício simples para a escola particular fazer, mas ele ajuda a fidelizar a clientela.” Por outro lado, proporciona um crescimento equilibrado e estável para a instituição e gera re exos positivos sobre a aprendizagem e o desempenho dos alunos, resultados colhidos pelo Renascença com a gestão participativa, segundo analisou João Carlos Martins. O Renascença possui hoje 900 alunos, em todos os ciclos da educação básica.
Colégio Sagarana
MODELO PARTICIPATIVO CHEGA À SALA DE AULA
Uma escola nova em idade e na forma de educar, o Colégio Sagarana, localizado em Vicente Pires, no Distrito Federal, também foi apresentado durante o Congresso do Saber como um case típico de gestão participativa. Criada há apenas oito anos, conta hoje com 600 alunos da Educação Infantil ao Ensino Médio e exibe taxas anuais de crescimento entre 10% e 15%, afirmou seu diretor geral, Anchieta Coimbra. Autor de livros de marketing educacional, motivação e qualidade no atendimento, Anchieta foi diretor de instituições tradicionais de ensino em Brasília e há dois anos chegou ao Sagarana.
Segundo ele, o Colégio adota o parâmetro participativo no desenvolvimento das próprias aulas. “Elas se formatam nos mais diferentes ambientes da escola, como pátios, jardins, quadras e biblioteca, além da sala de aula. Não existe um modelo fim de aula. É uma dinâmica diferenciada, em que o professor apresenta temas, o aluno traz dúvidas, e isso dá a linha da pesquisa, dos debates e da construção do conhecimento. O estudante vem para a aula com vontade”, observou Anchieta. A instituição promove duas reuniões mensais com professores, uma de estudo, “para manter sua mente ativa para novos conhecimentos”, e outra de avaliação. Os encontros são complementares às horas dedicadas ao estudo do trabalho pedagógico. “Não posso ter um professor tradicional, mas que pesquise mais, planeje e seja um agente interativo constante”, justificou o gestor.
Em sua conferência, Anchieta Coimbra disse que “um dos equívocos mais comuns das escolas está na gestão realizada em gabinete”, na ausência de uma relação de boa convivência e proximidade com os recursos humanos, além do baixo compromisso com os docentes e os resultados. O contrário disso não seria o excesso de reuniões nem a tendência ao assembleísmo, ressalvou o palestrante, mas uma gestão baseada na liderança e na motivação de professores e alunos. “A maior soma do processo de liderança é a divisão de tarefas e responsabilidades”, observou.
Quanto aos familiares, Anchieta anotou que o “pai está carente de atenção e buscando oportunidade de interagir com as escolas, mas os modelos são muito tradicionais e colocam um distanciamento nessa relação”. Conforme explicou, “atrair os pais não é fazer a escola dos sonhos do mantenedor, mas convencê-los que aquela é a escola dos seus sonhos, fazendo-os sentirem-se ativos nessas mudanças”. O recado que Anchieta deixou aos gestores é o de que “criar esse formato participativo demanda zerar uma cultura”. “O aluno vai à escola à procura dessa nova forma de aprender, está o tempo todo querendo interagir. As escolas tradicionais vão ter que se adaptar a esse modelo despertador e questionador”, afirmou o palestrante.
Presente ao encontro, o diretor administrativo do Colégio Giusto Zonzini, Aparecido Candido Santos, concordou com Anchieta. “Uma administração que queira se modernizar e sair do conceito antigo de escola terá que se preocupar com essas questões, porque os pais exigem isso, comunicação clara do serviço que estão recebendo”, disse. Sua instituição, localizada no Jardim Arpoador, zona Oeste São Paulo, tem 650 alunos (desde a Educação Infantil ao Ensino Médio) e está buscando subsídios para trabalhar “os relacionamentos, a formação de lideranças e o equilíbrio entre os poderes dentro da equipe”.
Por Rosali Figueiredo
Sistemas de Ensino | TECNOLOGIA, INOVAÇÕES E FUSÕES
Pensar os sistemas de ensino como símbolos de padronização e conteúdos fechados não combina mais com a realidade do mercado brasileiro, tampouco com as necessidades das escolas. A diretora de Educação Básica da Kroton Educacional, Mônica Ferreira, disse que a visão é preconceituosa. “Talvez algum sistema ainda se mantenha nessa linha de engessamento, mas nossas bandeiras (Pitágoras, Projecta e Total) sempre convidaram ao diálogo”, disse Mônica, lembrando que essas marcas desenvolvem “um extenso programa de capacitação para a customização, atendendo às especificidades das escolas e ao perfil de sua clientela”.
Segundo Mônica, os sistemas estão hoje estruturados para “desenvolver mais a interação com os alunos, os quais exigem que o professor promova isso”. Na prática, os materiais disponibilizados aos docentes e estudantes deixam janelas para que os educadores desenvolvam atividades com filmes ou sites, por exemplo, e são atualizados anualmente pelo feedback da comunidade. Com os professores, os encontros de formação chegam a 100 horas e permitem essa interação, afirmou. “O tempo todo, o material convida o aluno a dialogar com o outro, o colega, os pais, a comunidade e as próprias ferramentas da tecnologia.”
A história dos sistemas de ensino para a educação básica no Brasil conhece pelo menos três momentos diferenciados. No primeiro, que predominou até os anos 70, eles se configuravam como material fechado, em que o professor era um mero aplicador de aulas, descreveu o consultor Roberto Prado. Em seguida, observou Roberto, veio um momento de estruturação em rede, mas também de maior liberdade para o docente fazer intervenções nos materiais, o que foi facilitado pela introdução dos recurrecursos de tecnologia da informação e comunicação. No momento, o mercado assiste à expansão das marcas, das inovações tecnológicas e das fusões.
Para José Erivam Lima Junior, supervisor de convênios do Grupo Objetivo, uma das bandeiras pioneiras no país, as mudanças mais fortes aconteceram na virada entre os séculos XX e XXI, “quando surgiu o nicho das escolas públicas e houve a introdução dos conteúdos digitais, que é para onde está migrando toda a área da educação. A internet está fazendo com que os sistemas cresçam muito, com aulas específicas em 3D, por exemplo”.
Nesse contexto, novas marcas buscam sua expansão. É o caso do SAS (Sistema Ari de Sá), de Fortaleza (CE). “Temos no Ceará uma escola modelo, de referência, com altos índices de aprovação nos vestibulares mais concorridos e conceituados, o que conseguimos com conteúdo de qualidade, muita atividade e assessoria pedagógica. É isso que fornecemos hoje para 146 escolas conveniadas espalhadas pelo Brasil”, disse Igor Sampaio, consultor educacional do SAS, presente na Feira do Saber 2011. Uma das novidades do sistema é a disponibilização de todo material para tablets.
Também o Grupo Leya, de Portugal, esteve no Saber apresentando sua rede – a SEI (Solução Educacional Integrada). Ricardo Marconatto, diretor de marketing da empresa, destacou que o diferencial da marca está na articulação do conteúdo em diferentes plataformas (impressa, digital etc.) e formatos (integrados, seriados), e na sua integração com os serviços de gestão e apoio pedagógico, juntamente com planejamento de aula, controle, calendário anual, índice de frequência e testes.
(Colaborou Rafael Lima)
Saiba mais
ANCHIETA COIMBRA
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APARECIDO CANDIDO SANTOS
aparecido@giusto.com.br
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