Revista Direcional Escolas – Qual o perfil de aluno atendido?
Anna Maria Ferreira – Atendemos alunos com perfis bem ecléticos. As famílias nos procuram, muitas vezes por afinidade com nosso projeto pedagógico. Entendemos que o processo de inclusão é muito mais amplo do que aceitar e colocar na mesma sala de aula, alunos com dificuldades a mais ou necessidades especiais. O trabalho de inclusão pressupõe certo olhar para o ser humano e para o mundo, compreendendo que a diversidade é uma característica fundamental do ser humano e deve ser respeitada. Portanto, entendemos a escola como um espaço para o exercício dessa convivência com o diferente.
Nosso projeto de inclusão abrange desde crianças com dificuldades pedagógicas até as que necessitam de cuidados especiais, como crianças com paralisia cerebral, autismo ou Síndrome de Down. A convivência entre as crianças portadoras de necessidades especiais e as outras se mostrou extremamente benéfica para todos, que têm a oportunidade de conviver em um ambiente escolar saudável sem que sejam discriminadas por quaisquer que sejam suas diferenças. Serão adultos mais tolerantes. É natural que conflitos apareçam e cada conflito é uma oportunidade para trabalharmos questões práticas que dizem respeito também à formação ética. Não nos fechamos a nenhuma solicitação, no entanto, para podermos fazer um trabalho de qualidade com essas crianças, levando em conta o trabalho do professor e do auxiliar de sala que o acompanha nesse processo, muitas vezes é necessário limitar o número de crianças atendidas.
Para essas crianças, nós mesmos produzimos um material didático específico, elaborado em cima das questões individuais e coletivas da classe.
Revista Direcional Escolas – Qual o suporte de formação oferecido aos professores?
Anna Maria Ferreira – Temos duas psicólogas que fazem parte do corpo da equipe. E elas têm a função de fazer a intermediação entre o aluno e o professor, de dar esse suporte. Primeiro, baseamo-nos em informações sobre as crianças e nos relatos e relatórios que recebemos, tanto dos pais quanto dos profissionais envolvidos no atendimento a elas, como fonoaudiólogos, psicólogo, etc. Repassamos as informações e documentos aos professores e sempre que esses especialistas vêm à escola, os professores participam das reuniões. A visão do profissional que lida com essa criança é diferente da nossa: é um ambiente dele com a criança, não num ambiente social. Sempre tem uma visão diferente da nossa que nos ajuda a perceber mais essa criança. E a recíproca também acontece, muitas vezes, acrescentamos informações novas a respeito dessas crianças, a esses especialistas.
As psicólogas da escola podem ajudar nos momentos de crise, contribuindo com propostas para o que poderíamos fazer. Elas precisam conhecer a criança e precisam ter algum contato com ela, mas estão aqui para fortalecer a rede da criança com os pais, escola e especialistas. Nessa rede, cada um contribui com olhar diferente para completar essa visão e estabelecer objetivos de trabalho com essa criança.
A psicóloga também trabalha em conjunto com o professor para elaborar o material adaptado. Os objetivos para cada criança variam desde o desenvolvimento da autonomia ou alfabetização até mesmo se organizar, aprender a organizar o material, o caderno, a agenda, ou se sociabilizar de um jeito melhor, desenvolver o autocontrole. São objetivos bem claros, bem “pé no chão.”
Revista Direcional Escolas – Que tipo de abordagem é feita com o grupo de crianças em torno das diferenças?
Anna Maria Ferreira – As diferenças acontecem mesmo quando não tem crianças “incluídas”. Esse trabalho deve acontecer com os grupos mesmo quando não há alunos de inclusão. No grupo tem sempre uma pessoa mais tímida, ou engraçadinha. São pessoas que reagem de formas diferentes em situações diferentes. Ter consciência dessas diferenças é importante.
Às vezes falamos abertamente com o grupo sobre as limitações do colega que vai chegar ou que chegou, pois se um dos nossos objetivos é trabalhá-las e aceitar que todos temos alguma, na hora em que você encontra uma criança que tem uma dificuldade maior, abrir isso para o grupo, não tem problema. Temos que ser bem sinceros. Os colegas querem saber para entender quais atitudes eles podem ter diante das ações daquela criança. Eles têm interesse em saber como estabelecer o limite deles em relação àquela criança. Essa conversa é necessária.
Revista Direcional Escolas – Há situações que se tornam impossíveis de serem atendidas em um ambiente coletivo de aprendizagem?
Anna Maria Ferreira – Só fica impossível quando a gente não sente a família andando junto com a escola. A escola quando fica sozinha não funciona. Precisa dessa parceria. E a família junto significa estar aberta para conversar, para aceitar críticas, ou trazer críticas para a gente, pois precisamos estar abertos para isso também. Os pais e a escola terem espaço para assumir dificuldades. Tem que haver uma honestidade entre um e outro. Se não acontece isso, fica impossível.