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Guia para Gestores de Escolas

Especial Educação — Quando a sala de aula funciona: capacitação, infraestrutura e metodologias

Matéria publicada na edição 66 | Março 2011 – ver na edição online

“A DIDÁTICA DA ‘SALIVA’ TEM QUE SER SUPERADA”

Para dar conta das mudanças no perfil do aluno, dos novos parâmetros do ensino, do déficit na formação dos professores, da forte presença das tecnologias da informação na vida moderna, as escolas devem investir no apoio ao educador, para que ele extrapole o ambiente da sala de aula, mas, ao mesmo tempo, traga o mundo para dentro dela.

Há uma grande diferença entre ser um “informante” e um professor, conforme pontua a educadora Neide de Aquino Noffs, diretora da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O primeiro somente transmite um conhecimento científi co previamente adquirido. O segundo recorre a metodologias mais ativas, utiliza novos instrumentos de trabalho, articula este conhecimento àquele trazido pela vivência do aluno e constrói um terceiro, a ser efetivamente ensinado. “Antes o pólo era o conteúdo, hoje é o aluno em seu contexto”, diz. Antes, prossegue Neide, “a prioridade era o ensino, hoje é como o aluno aprende”. Escola, alunos e sociedade não são mais os mesmos, aponta a psicopedagoga e doutora em Didática pela Universidade de São Paulo. O que obriga as instituições privadas e o setor público a complementarem a formação de seus profi ssionais, pois “a didática da ‘saliva’ tem que ser superada”.

As mudanças vieram de inúmeras frentes e podem ser atribuídas, conforme enumera Neide, à universalização do ensino propiciada pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (de 1996), o que ampliou a diversidade social e cultural dos alunos; à introdução das metodologias de ensino-aprendizagem mais ativas; à inadequação do modelo do Ensino Superior a essa nova realidade, falhando na formação dos quadros; e às novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Neide Noffs destaca que a maneira de ensinar deve ser contextualizada e compartilhada entre alunos e professores, a exemplo do modelo da Aprendizagem por Solução de Problemas ou da Aprendizagem por Projetos. É uma forma de atender à pluralidade dos estudantes e ao seu novo perfi l. “Ele nasce em uma cultura já conectada, entra na Educação Infantil ligado ao mundo, o que exige que se tenha uma ação mais ativa e um conhecimento além do específi co. O aluno solicita posicionamento, opinião”, diz.

Assim, introduzem-se demandas antes desconhecidas. “A necessidade de aprimoramento sempre existiu, mas neste momento é mais acentuada, pois quando a escola estava sob a referência do conhecimento específi co, não precisava tanto de atualização. Bastava a orientação em torno do projeto pedagógico. Hoje o professor precisa de visão global, novos valores, TICs e também de suprir a própria formação específi ca, que está incompleta”, analisa.

ALGUMAS EXPERIÊNCIAS
Segundo a diretora pedagógica do Colégio Santo Américo, Elenice tecnologias, propiciando, por exemplo, o ensino a distância, que permite ao aluno realizar atividades em casa, on-line, e não mais somente com lápis e papel”. Elenice também chama atenção para as inovações nas metodologias de ensino, bem como sobre a própria disciplina. “O ambiente da escola está mais democrático, existe disciplina, mas sem a rigidez de antigamente”, observa a diretora, que atua há 20 anos na instituição, localizada na região do Morumbi, zona Sul de São Paulo.

Para suprir as necessidades deste novo aluno – “que tem mais acesso à informação, mas sem refl exão e aprofundamento, deixando um desafi o às escolas”, o Santo Américo implantou uma rotina de apoio e desenvolvimento profi ssional. A avaliação do trabalho do professor, por exemplo, é feita semestralmente em encontros individuais com o coordenador. Ao longo do ano, a instituição realiza cursos gratuitos – neste início de ano promoveu “Desenvolvimento de Habilidades de Leituras” (com carga total de seis horas). A cada mês, organiza três reuniões pedagógicas remuneradas, com carga horária variável conforme o ciclo escolar. Também subsidia o profissional que queira participar dos cursos de seu Centro de Estudos (o Prosa), além de eventos ou congressos temáticos. Promove ainda visitas a outras instituições de ensino.

Do ponto de vista da equipe pedagógica, disponibiliza supervisores por disciplina. Na Educação Infantil e Fundamental (até o 5º ano), dois professores por sala atuam conjuntamente (tutor e auxiliar). Existe ainda um coordenador pedagógico por ciclo, sendo que até o 5º ano ele tem o apoio de um assistente. Portanto, entre o Maternal e o 5º ano, atuam três duplas de coordenadores e assistentes e duplas de professores por sala. Finalmente, há um coordenador para o Fundamental II e outro para o Ensino Médio. Já a infraestrutura física e de tecnologia inclui salas de aula equipadas com computadores com acesso à internet, projetores e/ou lousas interativas.

No Colégio Santa Maria, também estabelecido na zona Sul de São Paulo, as reuniões pedagógicas acontecem semanalmente, bem como palestras, trabalhos em grupo e encontros individuais com os orientadores e/ou coordenadores. No entanto, duas outras ações procuram gerar subsídios ao professor. São os encontros periódicos com os pais e familiares, organizados em torno de palestras, e uma abordagem que cobra mais participação do estudante, seja por meio de trabalhos em equipes ou de um programa de monitoria. Com 2.569 alunos, 154 professores no ciclo regular básico, o Santa Maria “investe tempo e dinheiro em estudos de linhas pedagógicas internacionais, observandose conteúdo, metodologias e critérios de avaliação”, afirma a diretora geral, irmã Diane Clay Cundiff. Segundo a gestora, as mudanças vêm acontecendo especialmente na Educação Infantil e anos iniciais do Fundamental, obrigando a que se busquem abordagens que “deem conta de alfabetizar de forma suave, mas desafiadora”.

Também o Santa Maria possui um centro de estudos próprios – o Prisma, coordenado pela pedagoga Flávia Manzione. Com cursos subsidiados aos professores do colégio, o Prisma promove “um link entre o conteúdo e a prática”, comenta Flávia, lembrando que a procura maior por esse tipo de aprimoramento ocorre entre os docentes da Educação Infantil e do Fundamental I. A partir do Fundamental II, estes optam pela pós-graduação.

UMA BASE COMUM PARA ATUAR NA SALA DE AULA
Por mais que as escolas invistam em recursos físicos e no desenvolvimento dos educadores, a sala de aula demanda um profissional que tenha uma base comum, independente do contexto sócio-econômico em que atua, conforme destaca Neide Noffs. Responsável pelo programa de formação de professores da PUC, Neide recomenda aos gestores contratarem professores que apresentem, no mínimo, as características abaixo.

Humor – “O professor precisa ser bem-humorado e ter alegria, além de um perfil emocional e afetivo já trabalhado. Uma ótima dica é selecionar pessoas que conheçam suas limitações, mas, ao mesmo tempo, descubram suas potencialidades.”

Conhecimento específico – “Ainda que os anos iniciais da educação básica demandem um professor polivalente, todos devem apresentar domínio consistente das áreas em que atuam.”

Conhecimento geral e atualização – “É preciso ainda conhecimento e cultura geral. O profissional deve buscar sua atualização, estar afinado com o seu tempo, até para que o aluno obtenha respostas e se insira no mundo do presente e não do passado, compreensão que irá projetar a construção do seu futuro. Ele deve trazer os assuntos atuais para a sala de aula, trabalhar isso pelo menos durante 15 minutos antes de entrar no conhecimento específico.”

Condições de trabalho – “Um bom professor briga pelas condições de trabalho e para fazer projetos inovadores na escola, não é conivente com um eventual ‘sofrimento’ causado pela ausência de recursos.”

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