Da teoria à prática: As implicações e adaptações da BNCC no contexto escolar
“As mudanças que estamos vivenciando requerem um novo olhar pedagógico, currículos mais inovadores que estimulem o protagonismo dos alunos e o desenvolvimento de competências, habilidades, atitudes e valores desde a educação infantil até o ensino médio. Além de aprender os conteúdos disciplinares específicos, os alunos deverão aprender a aprender e compreender as conexões interdisciplinares do que estão aprendendo”, diz Maria Helena Guimarães de Castro, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) e docente do IBFE (Instituto Brasileiro de Formação de Educadores)
Por Rafael Pinheiro/Fotos Renato Bairros e Divulgação
O desenvolvimento educacional desdobra-se, sob múltiplos aspectos, em movimentos, transitoriedades, (re)formulações e profundos debates que reverberam, de certa maneira, no cotidiano escolar – desde o Ensino Infantil até os últimos anos do Ensino Médio.
Dessa forma, transformam-se hábitos, diálogos, sensações, compartilhamentos, interações. Transformam-se, também, saberes, práticas, corpos, atitudes e uma série de sensações empíricas que o(a) jovem aprendiz recebe e, consequentemente, transmite nos campos familiares e sociais que transita. A partir desse fluxo, especialmente na contemporaneidade, avistamos metodologias, engajamentos e formações que transcendem os muros das instituições de ensino e integram mudanças socioculturais.
“O momento atual é de muitas mudanças na educação, no Brasil e no mundo”, afirma Maria Helena Guimarães de Castro, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) e docente do IBFE (Instituto Brasileiro de Formação de Educadores). “Vivemos um período de transição de grande complexidade diante das aceleradas mudanças tecnológicas, declínio de profissões tradicionais, surgimento de novas ocupações e, sobretudo, uma profunda mudança no perfil das crianças e jovens que já nascem conectados e impregnados da cultura digital. Este conjunto de mudanças impacta diretamente a sala de aula e implica em mudanças pedagógicas de fundo no processo de aprendizado”, complementa.
Nessa ótica, alterações significativas adentram o sistema educacional, como o atual processo de transição/implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que compreende as três etapas da educação básica: Infantil, Fundamental e Ensino Médio.
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), a Base é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos e alunas devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. Dessa forma, estabelecendo conhecimentos, competências e habilidades, o cerne da Base direciona seu olhar para a formação humana integral e para a construção de uma sociedade democrática e inclusiva.
“A BNCC tem o propósito de servir como referência para os currículos das escolas públicas e particulares tendo por fundamento pedagógico a definição de 10 competências gerais que servem como eixo orientador dos currículos e dos componentes curriculares, sempre com ênfase na educação e formação integral das crianças e jovens”, pontua Maria Helena Guimarães de Castro.
Para isso, complementa a socióloga, os estudantes assumirão um importante papel de protagonismo que requer um ambiente de aprendizagem desafiador e motivador, estabelecendo, assim, ligações entre diferentes contextos. “A escola deverá assegurar as aprendizagens essenciais, como o letramento, o letramento matemático, o letramento cientifico, o letramento digital e a saúde física e emocional dos alunos. A BNCC tem por objetivo ajudar a construção de currículos que promovam as competências do século 21”.
ADEQUAÇÃO CURRICULAR
Através da estrutura da BNCC, que pode ser observada como uma forma de repensar o denso sistema educacional com o intuito de se aproximar de demandas e habilidades da atualidade, algumas instituições de ensino começam a incluir as mudanças propostas pela Base em sua rotina pedagógica. E, ao longo desta implementação, é possível localizar desafios e implicações significativas.
O prof. Dr. Júlio Furtado, palestrante e consultor em Educação, acredita que o maior desafio inicial é levar os educadores e educadoras a entenderem e aceitarem a BNCC como um elemento necessário para que nossas crianças e jovens aprendam mais e melhor. Além de instrumentalizar os(as) professores(as) para a mudança do ensino em sala de aula a fim de adotar uma dinâmica de construção coletiva do saber, e desenvolver competências socioemocionais através do currículo.
“Sem uma boa formação sobre funções do currículo, planejamento, construção de vínculos em sala de aula, papel do professor nas metodologias ativas, dinâmica da avaliação e educação integral, os professores correm o risco de cumprir uma tarefa que não acreditam por não entenderem sua lógica e sua importância”, reflete Furtado.
No que tange as formações para todo o corpo pedagógico das instituições, Rossieli Soares – então Ministro da Educação e atual Secretário de Educação de São Paulo – afirmou, em dezembro último: “Concluímos a discussão sobre quais são os direitos de aprendizagem, as competências e habilidades essenciais para os nossos alunos na educação básica. Agora, precisamos dizer ao Brasil o que é ser um bom professor, quais são as competências e habilidades necessárias para ele, especialmente com foco na prática pedagógica, numa visão mais próxima da sala de aula”.
Na ocasião, o então ministro Rossieli entregou ao CNE a Base Nacional Comum para a Formação de Professores da Educação Básica – o texto define 10 competências gerais e aponta que a formação inicial e continuada deve ser baseada em três dimensões: conhecimento, prática e engajamento. A dimensão do conhecimento está relacionada ao domínio dos conteúdos. A prática refere-se a saber criar e gerir ambientes de aprendizagem. A terceira dimensão, engajamento, diz respeito ao comprometimento do professor com a aprendizagem e com a interação com os colegas de trabalho, as famílias e a comunidade escolar. Para cada dimensão, estão previstas quatro competências específicas.
Segundo a assessoria de comunicação do MEC, o documento aponta que, no Brasil, a didática e as metodologias adequadas para o ensino dos conteúdos é pouco valorizada. Os cursos destinados à formação inicial detêm-se excessivamente nos conhecimentos que fundamentam a educação, dando pouca atenção ao como o professor deverá ensinar. Em outros casos, o foco são os conhecimentos disciplinares totalmente dissociados de sua didática e metodologias específicas.
GESTÃO ESCOLAR
Andrea Ramal, educadora, consultora e doutora em Educação (PUC-Rio), acredita que o papel do(a) gestor(a) educacional nessa adaptação da BNCC, é entender a instituição de ensino como um empreendimento. “É necessário desburocratizar o ensino, flexibilizar a educação para atender aos mais diversos perfis e modalidades de aprendizagem. O gestor também deve ser um líder a serviço da comunidade educativa”.
Dessa forma, mais do que um “chefe”, diz Ramal, ele é um dinamizador de boas práticas e de experiências pedagógicas inovadoras e de sucesso. “Existem formas de colocar a BNCC em prática: com atribuição de responsabilidades, definição de metas, processos, cronogramas e recursos. Se isso for feito, temos mais chances de começar as mudanças necessárias”.
Já o advogado e Conselheiro Titular do Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo (CEE/SP), Décio Lencioni Machado, ressalta que nas escolas que possuem a direção escolar e a coordenação pedagógica, é interessante que esses dois profissionais dividam as funções a serem realizadas. “É o coordenador pedagógico, por exemplo, que tem a missão de compreender os direitos de aprendizagem e buscar referências para que o percurso do aprendizado realmente aconteça”, diz.
Para o conselheiro, além da divisão de tarefas, estudar o texto na íntegra da BNCC é essencial e, com a compreensão total do documento, é possível que a gestão escolar possa trilhar – ao lado do núcleo pedagógico – os caminhos de como agregar as competências para a sala de aula, enquanto zelam pelo projeto político-pedagógico (PPP) da escola.
“Cabe ao diretor, além de manter um diálogo permanente com a Secretaria de Educação, promover a gestão democrática e garantir condições, principalmente, de tempo e de estrutura para que se estabeleça uma cultura contínua de estudos entre os professores”, finaliza.
BNCC DO ENSINO MÉDIO
A etapa do Ensino Médio da BNCC foi homologada em 14 de dezembro de 2018 e está organizada por áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas e sociais). A carga total será de 3.000 horas: 1.800 para as competências e habilidades da Base e 1.200 para os itinerários formativos, de acordo com a escolha do aluno em sua formação técnico-profissional. A previsão é que as mudanças entrem em vigor no início do ano letivo de 2020, formando as primeiras turmas em 2022. O Ministério da Educação (MEC) disponibilizou uma área em seu site com perguntas e respostas sobre as mudanças no Ensino Médio.
Para conhecer essa área, acesse: www.portal.mec.gov.br
Saiba mais:
Andrea Ramal – [email protected]
Décio Lencioni Machado – [email protected]
Júlio Furtado – [email protected]
Maria Helena Castro – [email protected]
Disponibilizamos, em nosso portal, matérias, entrevistas e especiais sobre a Base Nacional Comum Curricular. Confira em: www.direcionalescolas.com.br