Especial — Tecnologia e Novas Didáticas de Ensino
Gestão Escolar
Matéria publicada na edição 63 | Novembro 2010- ver na edição online
Governo federal irá baixar nova regulamentação
Na era do professor mediador e da construção compartilhada do conhecimento
O uso das TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação) amplia as possibilidades de ensino, exige outro perfil de professor e alunos protagonistas. Acabou a “zona de conforto” dos professores e escolas, sentenciam os educadores. As novas ferramentas conferem mais autonomia aos estudantes, demandam investimentos contínuos em infraestrutura e capacitação, e requerem carga maior de trabalho.
Por Rosali Figueiredo
A Prefeitura de Cubatão acaba de lançar um programa de distribuição de notebooks para cerca de 1.300 educadores de sua rede de ensino, entre professores, gestores e supervisores. O propósito é facilitar o acesso a programas e informações, via internet, de forma a que possam enriquecer as atividades desenvolvidas com os alunos. Já a Prefeitura do Rio de Janeiro estabeleceu uma parceria com o Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com vistas a capacitar 16 mil professores para utilizarem os recursos de um software livre desenvolvido pelo laboratório e trabalharem junto a 600 mil estudantes da educação básica.
O engenheiro eletrônico responsável pelo Núcleo, professor Dr. Carlo Emanuel de Oliveira, apresentou conferência no XIV Congresso Saber, realizado em setembro em São Paulo, sobre os processos de capacitação dos docentes em tecnologia digital (ele esteve acompanhado pela professora Carla Verônica Marques, da Faculdade de Medicina da Universidade, psicóloga especializada em Neuropsicologia). Segundo Carlo Emanuel, é preciso hoje ensinar o professor a utilizar as novas ferramentas para que possa desenvolver o próprio material didático.
Na avaliação do psicólogo Luís Márcio Barbosa, gerente de projetos da área de Gestão de Tecnologias Aplicadas à Educação (GTE) da Fundação Vanzolini, as chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) alteraram profundamente o papel do professor e abriram novas possibilidades de ensino. “Antes as informações estavam disponibilizadas nos livros didáticos e no professor. Hoje estão em diferentes fontes, no meio virtual, o que faz com que o docente se torne um orientador do estudo do aluno”, observa. É o que demonstram, por exemplo, os trabalhos desenvolvidos pelos estudantes do Colégio I. L. Peretz, que serão apresentados nos dias 19 e 20 de novembro no “TIC Educa 2010”, 1º Encontro Internacional em TICs e Educação promovido pela Universidade de Lisboa, em Portugal. “Iremos levar folder, blog, revista, vídeo, banner e livreto produzidos pelo 8º ano do Peretz, dentro da disciplina de Informática Aplicada a Projetos”, diz a professora Cleide Muñoz. “Utilizamos essas ferramentas como apoio na aquisição e construção do conhecimento e desenvolvimento de diferentes linguagens, sempre na perspectiva de uma construção coletiva e compartilhada”, afirma.
O Professor mediador
Nesse sentido, acrescenta, o “professor passa a ser um mediador e, para isso, precisa ter várias habilidades, estar atento ao que acontece em outras áreas, não somente à sua disciplina, bem como aos projetos dos alunos, para que possa interagir e trocar informação o tempo todo”. De outro lado, é preciso rever o regime de trabalho deste docente, comenta a sua colega na disciplina e coordenadora dos projetos, Roxane Nascimento. No Colégio Peretz, instituição localizada na Vila Mariana, zona Sul de São Paulo, a disciplina de Informática Aplicada a Projetos consta da matriz curricular desde o 6º ano até o final do Ensino Médio (EM). Três professores trabalham conjuntamente com os alunos e, entre o 6º e 1º ano do EM, os projetos envolvem um tema por série. Como infraestrutura, a escola oferece, na unidade do Ensino Fundamental II e Médio, três salas digitais (com lousa digital, computadores pessoais e acesso à internet), data-show móvel para utilização nas demais salas de aula (também com internet), além de uma midiateca (um conceito ampliado de biblioteca). E oferece uma carga horária maior de trabalho a Roxane, para que possa coordenar todas as atividades da área.
“Através das ferramentas da informação e comunicação, começamos a trabalhar desde o 6º ano com o desenvolvimento de projetos interdisciplinares, introduzindo um método de pesquisa que envolve a problematização dos temas, o levantamento de hipóteses, objetivos, metodologia, justificativa, análise e conclusão”, afirma Roxane. O trabalho é feito em grupo até o 1º ano do EM, envolvendo questões como energia, reuso de materiais após o consumo, a cidade de São Paulo, saúde e ciência & tecnologia. A partir do 2º ano os projetos tornam-se individuais, pois o estudante começa a se preparar para defender uma monografia de conclusão de curso no 3º ano. Com os estudantes do Ensino Fundamental I, o Peretz também oferece aulas semanais de informática, desenvolvendo projetos associados a uma disciplina.
A professora Cleide Muñoz anota que as novas didáticas relacionadas às TICs “ainda estão sendo construídas e formalizadas”. Elas atuam como recurso de apoio à pesquisa, mas devem estar vinculadas a uma metodologia de trabalho e, claro, à expressão final do conhecimento adquirido, utilizando-se para tanto diferentes linguagens, como blog, pôster, vídeo, música e jornal, entre outros. Para tanto, o professor precisa ser preparado, comenta sua colega e coordenadora Roxane. “Os alunos dão conta de explorar as ferramentas e descobrir os recursos que oferecem. Isso assusta um pouco, pois o torna mais autônomo para construir o seu conhecimento e acaba extrapolando a área de conforto e domínio do professor”, observa.
O gerente de Gestão das Tecnologias Aplicadas à Educação da Fundação Vanzolini, Luís Márcio, observa que o uso dessas ferramentas envolve desde uma proposta mais simples, como acesso a informações, feito, em geral, dentro do laboratório de informática das escolas, à construção de ambientes virtuais pelos alunos e professores (é o caso dos blogs), com vistas a “interagir, registrar e socializar a aprendizagem”. Mesmo, entretanto, que o propósito seja apenas a busca de informações, exige-se uma didática apropriada, ressalva Luís. Segundo ele, o professor “deve saber orientar os alunos para que localizem e selecionem o conteúdo pertinente, identificando fontes e levantando hipóteses”.
Por outro lado, “a internet não é só um lugar de busca, mas de interação e aprendizagem”, portanto, às escolas compete começar a pensar também no uso das chamadas redes sociais (como o Facebook), tomando cuidados para o gerenciamento deste conteúdo. E no futuro, a troca de mensagens via celular também poderá entrar como recurso de ensino, destaca Luís Márcio. A Fundação Vanzolini atua no desenvolvimento de um projeto de produção de imagens e transmissão de conteúdo educacional via celulares, em parceria com o laboratório de serviços móveis do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (o Mobile Experience Laboratory/MIT) e secretarias de educação de três cidades litorâneas.
Softwares livres ou licenciados?
Outra decisão que as escolas devem tomar refere-se à origem dos softwares, que podem ser livres ou licenciados. O Colégio Peretz optou por um formato misto, explica Roxane. Entre os produtos livres, recorre ao Moodle, um ambiente virtual que propicia a troca de informações, bastante utilizado para o ensino a distância. O colégio recorre à plataforma para ministrar a disciplina de Informática Aplicada a Projetos no 3º ano do EM. Outra plataforma livre empregada pela escola é o ThinkQuest, voltada ao desenvolvimento de projetos colaborativos entre os estudantes da mesma série ou de etapas diferenciadas, afirma Roxane.
No entanto, muitos dos aplicativos usados pela disciplina, como editores de texto, vídeo e imagens, por exemplo, são licenciados, já que esses são os produtos que professores e alunos costumam ter em seus computadores pessoais. Para o gerente Luís Márcio, livres ou não, os softwares oferecem inúmeros recursos para o processo de aprendizagem, mas no caso dos primeiros é importante avaliar, antes de sua adoção, “a abrangência, segurança dos dados, capacidade de atendimento e suporte e facilidade de aprendizado” que oferecem.
Saiba mais:
Carlo Emanuel T. de Oliveira
Núcleo de Computação Eletrônica – UFRJ
www.nce.ufrj.br
[email protected]
Colégio I. L. Peretz
Roxane Nascimento
[email protected]
Cleide Muñoz
[email protected]
Luís Márcio Barbosa – Fundação Vanzolini
www.gte.vanzolini.org.br
[email protected]