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Guia para Gestores de Escolas

O Recreio Escolar Como Parte do PPP?

Espaço X tempo

Necessário se faz um olhar critico para todos os espaços pedagógicos na escola, entre eles o recreio escolar, que de forma alguma pode ser considerado neutro,  pois se constitui  em local que opera com representações engendradas nas relações de poder já vivenciadas na cultura domestica, o mais forte, o mais agressivo, o mais contundente, o mais rápido,  etc.

Mayer e Soares(2004) comentam que esses espaços instigam os indivíduos a serem e a viverem de determinada maneira e não de outra, a pensarem e a sentirem uma coisa e não outra, a consumirem certo tipo de produto e não outro e, portanto, nada educativo.      Acrescenta Woodward (2000) que todas  as práticas de significação envolvem relação de poder, inclusive o poder para definir quem é incluído ou quem é excluído de uma atividade ou brincadeira.

O recreio na realidade da escola atual é visto pelo professor  como merecido descanso após um período de duas ou três aulas;  pelo aluno como período livre para  se alimentar, gritar, brincar,  correr, ou simplesmente se aquietar, etc., a bel prazer, carregados cada qual com determinada cultura social e familiar exercendo influencia uns sobre os outros.  Fazem o que querem dentro da limitação espaço/tempo que lhes é oferecido, porém, desprovidos de alguma materialidade ou de atenção pedagógica, sendo exatamente nesse período que há maior incidência de acidentes, trombadas, arranhões, brigas, pequenos furtos, roubos, bullying, etc.

Louro (1999) enfatiza que as praticas cotidianas são as que devemos problematizar, pois são as praticas  rotineiras e comuns, os gestos e palavras banalizadas, que precisam se tornar alvo de atenção sempre renovada.          Essas valorizações de forma de poder do mais forte sobre o mais fraco, do masculino sobre o feminino e tantas outras que ocorrem não podem passar despercebidas pela escola.

Recreio X lazer

O recreio do jeito que está organizado não pode ser comparado ao “lazer”, esta palavra tem um conceito muito mais amplo, liga-se aos fenômenos culturais de aquisição de conhecimento  e, portanto passíveis de gerar processos educativos. Para Werneck,  (2008, p.12)

“lazer é concebido como uma dimensão da cultura. Caracterizada por meio da vivência lúdica de manifestações culturais no espaço/tempo conquistado pelo sujeito ou grupo social, estabelecendo relações dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações – especialmente com o trabalho produtivo.”

Isso nos leva a acreditar que o recreio escolar não foi estruturado fundamentalmente como um espaço de lazer, porém, isso não quer dizer que os saberes do lazer não devem perpassar os saberes da organização do recreio escolar, muito pelo contrário, essas possibilidades de reflexão  a partir do lazer podem contribuir para a construção de um espaço/tempo  mais democrático e educativo.

Ao pensar nas possibilidades de práticas de lazer do recreio escolar estamos abrindo um leque de diferentes atividades culturais carregadas com uma serie de valores e concepções que poderão ser  produzidas, reproduzidas ou ainda resignificadas apenas pela participação do individuo na diversidade que se possa garantir, não perpetuando uma única forma de lazer ou muito menos sem nenhuma oferta como acontece nos dias atuais.

Para valorizar a diversidade cultural e o potencial educativo das práticas de lazer, seria interessante que a escola e seus agentes tornassem o recreio escolar numa busca constante por novas possibilidades de praticas para as crianças vivenciarem esses momentos, contemplando, por exemplo:

a)   Práticas físicas – pega-pega, pular corda, duro ou mole;

b)   Práticas artísticas – teatro, música, dança, artes plásticas;

c)   Práticas manuais – confecção de objetos, modelagens,  colagens;

d)   Práticas de raciocínio lógico –  jogos de tabuleiros, jogos matemáticos;

e)   Práticas literárias – leitura, composição de poemas, músicas, paródias;

Esse artigo tem por objetivo provocar reflexões sobre o assunto,  e não  indicar o que deva ser feito, mesmo porque nãodeve ser desconsiderado as práticas já existentes –  naquele cantinho que ninguém olhou ainda –   em queas crianças  estejam fazendo algo diferente e importante para socializar com o grupo todo.    Pode acontecer que ainda não seja possível uma escola oferecer todas essas possibilidades juntas, mas, muito provavelmente possa envolver a comunidade em algumas delas e oferecer de forma diversificada no decorrer do ano letivo.

O P.P.P.

O Projeto Político Pedagógico em muitas escolas, ainda é uma caixinha de surpresa para o corpo docente, discente e comunidade familiar do entorno.     Elaborado quase sempre pela equipe gestora que não supera as dificuldades de reunir-se e dialogar com a comunidade sobre sua importância e nem  renegocia os exíguos prazos exigidos pelas Diretorias Regionais  para sua confecção e aprimoramento, no inicio do ano letivo. Infelizmente as escolas ainda não sabem trabalhar com esse poderoso instrumento de gestão democrática, que nos tempos atuais vem se revestindo de um enorme valor.

O PPP é fortemente influenciado pelos espaço/tempo escolares e o recreio nem de longe pode ser considerado como espaço neutro porque tem reflexos sobre a administração escolar quer no comportamento dos alunos, quer nas ações que a equipe gestora tem com a comunidade para explicar os “acidentes e confusões” .

Para (Augustin Escolano 1998 – pag.26)

“nem o espaço, nem o tempo escolares são dimensões neutras do ensino ou estruturas vazias da educação.  Ao contrário elas operam como uma espécie de discurso que institui, em sua materialidade, um sistema de valores, um conjunto de aprendizagens sensoriais e motoras e em uma semiologia que recobre símbolos estéticos, culturais e ideológicos.”

           Como pedagogias, tanto o espaço quanto o tempo escolar ensinam permitindo a interiorização de comportamentos e de representações sociais.     Inconscientemente até, a escola torna  legitima  tais práticas, ações, modos de ser, condutas e posturas ditas “apropriadas”  no recreio escolar.

            Segundo a legislação Lei 5692/71 (LDB) tanto o recreio como os intervalos de aulas são considerados – hora de efetivo trabalho escolar – podendo então ser desenvolvidos projetos/programas dentro do PPP das unidades escolares.

Cabe a todos pensar e refletir antes de reclamar do jovem inconseqüente do ensino médio, que não teve, no ensino básico, oportunidade de conviver um espaço/tempo escolar diversificado e  com todas as possibilidades para estimular sua compreensão de mundo.

Obs: Trabalho compilado a partir do TCC “Reflexões sobre o Recreio Escolar e Práticas de Lazer” do Prof. Ed.Física Breno Batista Dallaqua à Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo em 2014, com autorização do autor e onde poderá ser consultada as referencias bibliográficas citadas.

 

dalaquaAntonio Luiz Dallaqua professor PEB I, efetivo da Rede Estadual, leciona na E.E.Profª Philomena Baylão na DIR Norte2.  Formado em pedagogia pela Fundação Santo André e possui cursos sobre alfabetização em Língua Portuguesa e alfabetização matemática.  Bacharel em Ciências Contábeis pelo Instituto de Ensino Superior Santo André.

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