A Educação diz a que veio? (Parte 1)
Um novo mundo surge, e com isso, estamos em aberto, um momento de incerteza que vem influenciando diretamente escolas e famílias.
Pais vêm se perguntando como educar seus filhos nos dias atuais? Professores indagam: que aluno é esse?
Para entender um pouco esse momento, faz-se necessário levar em conta os avanços técnico-científicos e seus impactos diante de um mundo não mais previsível.
O momento educacional nos convoca a um “desacomodar”, a rever crenças e valores, o que de alguma forma nos remete a pensar: Que concepção de educação temos hoje? Pela minha experiência de duas décadas na área, sugiro pensar uma educação que contemple outro olhar, que atravesse modelos pré-estabelecidos de alunos, família, professores e mundo. Há um novo fenômeno contemporâneo chamado “presença midiática”, que diz “apareça e exista”!
Quando ocorrem mudanças dessa natureza, o campo das relações também vai sendo alterado.
Comecemos pelos novos arranjos familiares e suas variáveis, como gênero, valores, crenças e desejos.
A família mudou, a forma de amor é diferente, passa- se do amor ao desprezo rapidamente (quase que numa clicada). A performance física, a juventude vem sendo cultuada como um pré-requisitos para se amar. O amor antes entendido eterno, deixa de ser uma obrigação e passa a ser uma escolha, “eterno enquanto dure”.
Hoje os pais estão juntos, amanhã, podem não estar, isso não significa o caos, e sim outra forma de viver o amor e suas relações também entre pais e filhos. O mundo atual nos permite uma mudança de lugar: sair da queixa e passar a responsabilidade. A família mudou, a educação mudou, porém a responsabilidade pelas novas gerações continua sendo dos pais- adultos que não podem se demitir do cargo de Pais, não existem ex-filhos!
Talvez aí esteja um ponto a ser melhor explorado, como ser pais no mundo atual?
O momento requer muito discernimento por parte da famílias e escolas, não permite juízo de valor, e sim, novas reflexões sob antigos modelos estabelecidos como sendo “aceitos” normais e certos.
Como entender entradas e saídas de pessoas em uma mesma família, antes compreendida como uma instituição fechada? Essa pergunta não permite uma resposta, e sim um horizonte de possibilidades, começando pelo entendimento de que a sociedade mudou.
Passamos de uma sociedade vertical, em que o Pai era a lei, os modelos parentais eram bem definidos e o padrões a serem seguidos eram semelhantes em uma mesma sociedade. A educação era valorizada e garantia para ser “alguém melhor” amanhã. Hoje nos encontramos em uma sociedade horizontalizada, em que pais e filhos falam a mesma linguagem e dividem os mesmos direitos. Alguns Filhos passam a ser conselheiros dos pais, outros passam a ser os eternos “bebês” a serem cuidados.
A escola não é mais, necessariamente um lugar do saber, apenas mais um ponto em que circulam informações e pessoas. A escola não garante mais o “passe” para uma vida melhor e muitas vezes para os jovens ela simboliza um atraso em suas vidas.
Educadores, Pais, pesquisadores… andam em busca de uma bússola, algo que possa indicar um outro caminho, uma direção, um sentido para a educação, um atalho , mesmo que não haja a certeza da chegada.
Nós, adultos, sabemos realmente o sentido da educação atual?
Por que dei essa aula hoje? Por que comprei esse novo celular para meu filho?
Quais os princípios (bússola) que vêm direcionando nossas ações?
O momento atual é de imersão! Um mergulho no mundo “quase virtual” que nos retira estrategicamente para achar um novo culpado: as novas tecnologias.
É ali no mundo virtual que há uma possível resposta para entendermos o que está acontecendo no mundo real da educação.
Quem acompanha os blogs, diários virtuais e postagens de crianças e jovens nas tecnologias, é capaz de reconhecer o mergulho no “vazio”; ali, ele é “o aluno ideal, o filho esperado; nas redes virtuais, tudo é possível; nas mensagens, posso ser eu mesma; nos alertas de entrada de e-mails, sou solicitado; telefones tocando; diz que sou querido e aceito; Tv, IPad , IPod , Itudo ..
Tudo e todos se interconectam mutuamente em um tempo real no mundo ideal! Sem ter que pensar, refletir ou mesmo sentir.
Nas famílias e nas escolas quem é esse filho-aluno invisível, que não aparece?
Pais e educadores perguntam-se diariamente como lidar com seus filhos-alunos inquietos, cheio de vontades materiais, apáticos com seus estudos, desmotivados com tudo e todos.
Se filhos e alunos encontram-se tão apáticos, não seria o momento de nos perguntarmos: por que um único jovem de 11 anos envia quinhentos torpedos em três dias para seus amigos? Sem contar a destreza manual, atenção e disponibilidade? Isso é apatia, ou ali naqueles torpedos há algo a ser interpretado como “sentido” de ser?
O momento pede uma escolha fundamental: restituir o lugar “vazio” do adulto, aquele que Conecta o ser humano filho-aluno real em sua incompletude de “ser” e o prepara para “vir a ser” na sua incompletude natural.
Educar atualmente requer aquietar ruídos externos, escutar o silêncio e nos perguntar: Diante de tantas transformações, em pleno século XXI, ainda estamos discutindo nas escolas atuais se os alunos devem ou não fazer uso de celular? Se os alunos podem ou não usar bonés? Se os pais estão presentes ou ausentes? Dessa forma, deixo por enquanto as palavras de Clarice Lispector para nos ajudar nessa reflexão: “Não quero ser mais eu! Mas eu me grudo a mim e intextricavelmente forma-se uma tessitura de vida.”
Por Jane Patricia Haddad *
*Jane Patricia Haddad é pedagoga, com especialização em Psicopedagogia, Docência do Ensino Superior e Psicanálise. Atuou por mais de 20 anos em escolas como professora, coordenadora pedagógica e diretora, é consultora institucional e conferencista. Autora dos livros: “Educação e Psicanálise: Vazio existencial” e “O Que Quer a Escola: Novos Olhares resultam em Outras Práticas”, ambos publicados pela editora Wak, do Rio de Janeiro. Atualmente cursa o Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti no Paraná , onde seu tema de pesquisa é a Indisciplina Escolar.
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