fbpx
Guia para Gestores de Escolas

A responsabilidade civil da escola e seus limites

Por Célio Müller

Qualquer gestor escolar já se deparou com conflitos inesperados junto à comunidade atendida. Às vezes de forma civilizada, mas às vezes com pedras na mão, as famílias que antes eram parceiras de repente se transformam em acusadores incansáveis, disparando queixas e exigências dos mais diversos tipos, sob alegação de maus-tratos, bullying, discriminação, ferimentos, contaminação e outras ilegalidades. Isso é um reflexo da polarização ideológica em nossa sociedade, e também herança do período pandêmico, pois como fornecedora de um serviço essencial que é pago, a escola particular fica bastante exposta às insatisfações.

O tema da responsabilidade civil é complexo e em qualquer organização precisa ser gerenciado sempre com profissionalismo, mas vamos focar aqui nas especificidades da educação. O estabelecimento de ensino em funcionamento realmente tem o dever legal de zelar pelo bem-estar físico e emocional de seu alunado, pois é responsável pela saúde das crianças durante as horas do dia em que ocorrem as aulas.

Isso não significa que todas as imposições e desejos manifestados pelos alunos e seus representantes legais devam ser atendidos, nem que a escola é culpada por fatos externos ou situações comuns do cotidiano, mesmo que sejam desagradáveis ou indesejadas.

Por definição, o Código Civil Brasileiro prevê:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Com efeito, as acusações dos pais se baseiam nesse princípio, interpretando as mais diversas situações – sejam reais, inventadas ou exageradas – como se fossem ilícitas. Nas diversas ações judiciais em que defendemos as escolas, costumeiramente a queixa apresentada é de omissão, pois na condição de contratantes as famílias têm a expectativa de receber serviços de qualidade com um nível de exigência cada vez maior. Não costumam acusar a instituição de maltratar a criança de forma deliberada, mas de serem imprudentes e permitir que isso ocorra ou de serem negligentes por não agir adequadamente para combater o dano, o que já seria muito irregular e passível de condenação.

Vivemos numa sociedade altamente questionadora, onde as reclamações das famílias são inevitáveis, mas a instituição de ensino não deve ficar vulnerável, podendo se prevenir da maioria das acusações. Na análise jurídica de cada situação, o gestor precisa ficar atento a qual direito está sendo alegado para averiguar se de fato houve violação e em qual medida. Às vezes é originado do Estatuto da Criança e do Adolescente, outras vezes do Código de Defesa do Consumidor. Há cada dia mais queixas relacionadas à Lei Geral de Proteção de Dados e também são frequentes acusações de descumprimento do Estatuto da Pessoa com Deficiência, tema que exploramos mais profundamente em outra matéria. Cada uma dessas normas tem condutas e formas de atendimento diferenciados, e o teor da resposta às famílias – isso sim obrigatório – irá auxiliar muito para evitar a judicialização.

E finalmente é essencial observar se o ato ilegal declarado ou a sua abstenção acarretaram mesmo algum tipo de dano ao aluno. Ferimentos físicos são normalmente visíveis, mas podem ter sido provocados fora do período das aulas. Abalos psicológicos costumam ser demonstrados com laudos e atestados de profissionais de saúde, no entanto nem sempre são conclusivos.    É muito fácil falar em dano moral, mas sua caracterização precisa estar bem provada pela vítima, e normalmente vemos o relato de simples divergências ou conflitos como verdadeiras tragédias. Por isso faz toda diferença o acompanhamento jurídico das ocorrências desde seu início, permitindo à instituição comprovar que agiu dentro da legalidade na condução de situações de risco e sempre na proteção do interesse das crianças.

Boas aulas e sucesso!

Receba nossas matérias no seu e-mail


    Relacionados