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Guia para Gestores de Escolas

Aprendizado plural e integrado: como manter a inclusão e a educação especial em tempos de pandemia?

Por Rafael Pinheiro / Fotos Divulgação

O processo educacional evoca, em muitas medidas e situações, movimentos e estratégias para abarcarem as multiplicidades e as possibilidades das relações entre o estudante e o conhecimento. Nas demandas contemporâneas, é necessário que a educação – e todas as suas reverberações – centralize a sua atuação em aprendizados plurais e integrados, contemplando, assim, a inclusão de todos e todas, com as suas diversas particularidades e necessidades, em todo o sistema educacional

A mudança sem precedentes que atravessou – e ainda atravessa – todo o sistema educacional, desde o primeiro semestre de 2020, deixou em evidência uma série de lacunas em todas as esferas da educação. Se, por um lado, a educação e as relações com o ensino, a metodologia pedagógica e o laço entre alunos e docentes, mergulharam, ainda que urgentemente, na maré tecnológica (por conta do fechamento das escolas para conter o avanço da pandemia); por outro lado, ainda estamos tateando as novas demandas que emergem em tempos de pandemia.

Partindo da premissa de que a educação deve ser plural, abarcando e respeitando todas as diversidades e necessidades de aprendizagem e desenvolvimento, este especial da Conversa com o Gestor convidou especialistas na área (pedagoga, diretor, advogado, consultor, coordenadora, psiquiatra e terapeuta) para responder o seguinte questionamento: Quais são os desafios, as mudanças metodológicas, as soluções e as estratégias para manter a inclusão e a educação especial em tempos de pandemia?

Rebeca Veras

“Em mais um ano desafiador, dar continuidade ao trabalho com a inclusão e educação especial, requer, acima de tudo, parceria com as famílias/responsáveis, mostrando a importância de prosseguir o trabalho que estava sendo desenvolvido na escola e garantindo que, mesmo em estratégias remotas, é possível aproximar a criança desse universo promovendo aprendizagens que farão a diferença na construção e adequação das suas habilidades. Outro fator fundamental é conhecer as especificidades de cada criança respeitando sua maturidade e autonomia e compreendendo o que ela já é capaz de realizar. Esse seria o nosso ponto de partida.

Planejar em uma perspectiva inclusiva não é promover atividades diferentes para os alunos com deficiência, mas incluir esses alunos na realização das mesmas atividades e ter um olhar sensível para avaliar o que é possível ser feito e o que não gera interesse para a criança naquele momento. No modelo remoto as mudanças metodológicas são evidentes e desafiadoras tornando fundamental a participação de todas as crianças, considerando seus aspectos emocionais e fortalecendo a socialização do grupo.

Nesse sentido, é preciso pensar nas ferramentas que serão utilizadas, nas imagens que serão apresentadas, na fonte da letra, nas propostas práticas, orientações para a famílias, adaptação dos comandos das atividades, tempo para a sua realização, dentre tantas outras propostas, respeitando as características de cada aluno como ser único e integral como previsto no documento da BNCC.”

Rebeca Veras – Integradora Pedagógica do SAS Plataforma de Educação e especialista em Educação Infantil

Cintia Sant’Anna

“A Maple Bear promove um ambiente no qual todos tenham um senso de pertencimento e desenvolvam seu melhor em um cenário que respeite e valorize as diferenças dos alunos. Com a pandemia, fizemos um esforço organizado desde março de 2020 para fornecer para as escolas rotinas diárias de aprendizagem e orientações para a realização de encontros virtuais entre professores e alunos. As conferências são estratégias importantes para a garantia de um acompanhamento personalizado, complementando a integração com o grupo. Todas as escolas tiveram turmas criadas no Google Classroom, e materiais para professores e alunos foram desenvolvidos usando aplicativos do Google que possuem funções como leitor de tela, digitação por voz e compatibilidade com linha braille. Para o Ensino Fundamental I e a Educação Infantil, demos diretrizes para a leitura de encontros semanais individuais para acompanhamento próximo dos alunos, de modo que fossem compreendidas as necessidades de cada um a todo momento. Também realizamos a adaptação de materiais impressos para formatos em tamanho aumentado e em braille.”

Cintia Sant’Anna – Diretora Acadêmica da Maple Bear

Audato Ramalho Lima

“O grande desafio da inclusão durante a pandemia tem sido minimizar os efeitos da ausência do presencial a partir do virtual. Para isso buscamos o atendimento individualizado visando contemplar as necessidades de cada inclusão sem abrir mão da socialização nos momentos coletivos. Cada criança especial tem uma necessidade específica e, a partir do trinômio escola- família-especialistas, traçamos estratégias distintas. Destaco aqui duas estratégias que nos proporcionaram soluções exitosas: a disponibilização de réplicas de materiais concretos, como a TÁBUA DE SEGUIN, através da planificação e digitalização dos mesmos para serem enviados para as famílias de modo a proporcionar a sua utilização a partir de uma orientação virtual e a adaptação do material impresso visando atender a uma necessidade especial. Nesta última o SAE DIGITAL foi fundamental, pois adaptou rapidamente um livro impresso, ampliando-o, e aumentando a fonte do mesmo tendo como resultado final de toda essa sinergia a alfabetização de uma criança com baixa visão através do ensino remoto.”

Audato Ramalho Lima – Mantenedor e Diretor Pedagógico do Colégio João Paulo Alagoinhas

Bruna Duarte Vitorino

“Este é um momento desafiador para a Educação como um todo: pais, alunos, professores e direção escolar. Sem dúvidas para os professores que lidam com alunos com deficiência o desafio é ainda maior e precisam contar com uma rede de apoio. A parceria e comunicação entre a família e a escola é fundamental para elaborar estratégias que ajudem esses alunos a continuarem se desenvolvendo, podem ser aulas de reforço, acompanhamento individual, atividades adaptadas, entre outras. Assim como os demais alunos, é preciso considerar que cada indivíduo, mesmo que tenha a mesma deficiência, tem sua individualidade e aprende de forma diferente – e para descobrir é necessário observar e ouvir o aluno de perto e não deixá-lo apenas como expectador das aulas on-line.

Outro ponto fundamental é garantir os recursos pedagógicos de maneira adequada e inclusiva. Sabemos que infelizmente não são todas as escolas que contam com esses recursos, mas a direção escolar pode procurar instituições assistencialistas especializadas para apoiar o acompanhamento desses alunos.

Apesar dos pais ansiarem em ajudar seus filhos, muitos não conseguem dar esta atenção de maneira integral, porque trabalham o dia todo e não tem a instrução adequada para ajudar uma criança com deficiência, por isso nesta rede de apoio deve haver uma comunicação contínua, a fim de capacitar os pais a darem o suporte no lar.

Acreditamos que todo aluno tem um potencial a ser explorado, independentemente de suas deficiências. Para conseguirmos bons resultados no desenvolvimento de crianças com deficiências, devemos deixar de lado nossos paradigmas a respeito da educação inclusiva e oferecer apoio às famílias para que persistam com paciência e carinho.”

Bruna Duarte Vitorino – Pedagoga e Coordenadora Pedagógica do Kumon

Wania Emerick Burmester

“A pandemia mudou a rotina de todos. Para alunos típicos, essa mudança teve um forte peso, porém, para alunos com deficiências, as dificuldades foram potencializadas. Falta de rotina, de contato pessoal, dificuldade de atenção e compreensão através da tela são algumas delas.

Os professores tiveram que aprender novas formas de compreender os alunos a distância. Para favorecer a inclusão é fundamental reconstruir o vínculo afetivo a distância. Por isso, menos é mais. Qualidade de pequenos momentos vale mais que horas de aula. Pedir para que abram as câmeras, e, um a um, participem ou mostrem algo pertinente à aula. Atividades lúdicas se tornaram essenciais, pois prendem a atenção e melhoram a aprendizagem.

A exposição à tela, em alguns casos, aumenta o desconforto e, consequentemente, o abandono da aula. Se possível, é importante criar horários de atendimento individual para os alunos com deficiências, que podem acontecer uma ou duas vezes por semana, dentro ou fora do horário da aula. Caso não seja possível, o professor pode gravar vídeos personalizados e enviar para os alunos.

Cada caso é um caso, e por isso elaborar o PEI/PDI é necessário, sem esquecer que quem vai intermediar o trabalho é a família. É preciso ter o pé no chão e adequar as expectativas, estabelecendo metas reais e avaliações ao longo do ano para definir novos objetivos e possíveis alterações na prática cotidiana. Não existe uma receita pronta, mas conhecer o seu aluno, ter uma boa relação com a família, ter metas claras e priorizar momentos individuais contribuem muito para o sucesso pedagógico.”

Wania Emerick Burmester – Consultora Pedagógica do Sistema Positivo de Ensino

Jaqueline Bifano

“Com a pandemia e as aulas on-line, surge mais um desafio que é a inclusão educacional virtual das crianças com deficiência. É importante, primeiramente, promover uma adaptação e inserção dos estudantes nos meios de aprendizagem on-line. E isso pode ser feito gradualmente, apresentando novos recursos e iniciando as aulas por conversas e atividades mais familiares para facilitar esse processo inicial. Iniciar com uma adaptação dos materiais didáticos para aluno autista e atualização do Plano Educacional Individualizado (PEI). Por exemplo, alguns recursos com sons mais variados e vibrantes podem gerar uma sobrecarga sensorial que prejudicará a participação do aluno autista nas aulas on-line. É preciso atentar-se a esses detalhes, conversando com pais e cuidadores para compreender melhor o perfil, as necessidades, preferências e dificuldades do aluno autista, atualizando, a partir dessas informações, o seu PEI para proporcionar as condições adequadas para sua inclusão, aprendizado e acolhida neste novo cenário.

Outro ponto é a utilização de conteúdos e recursos visuais. O processamento visual pode ser favorecido nos alunos autistas. Assim, utilizar programações visuais pode ser positivo para sua adaptação às aulas on-line. Incorporar cronômetros visuais para ajudar as crianças a saberem quando uma atividade está chegando ao fim e é hora de passar para outra na programação também pode ser proveitoso. Ainda, fornecer instruções de maneira visual, usando imagens, objetos ou animação, pode ajudar o aluno autista a processar as informações de uma forma mais eficiente e menos estressante. A monitora da criança na escola pode ir na casa da criança e ensinar a criança a participar das atividades através do sistema on-line.

É importante estabelecer regras, por exemplo, para o compartilhamento de tela, mensagens de texto e áudio durante a videoaula. É melhor evitar o uso da ferramenta de bate-papo nos momentos mais explanativos, já que ela pode atuar como distração para o aluno e para o restante da classe. É útil também lançar mão de atividades estruturadas. Embora muitos alunos possam aprender por meio de atividades menos estruturadas, os alunos com deficiência podem se beneficiar de atividades mais estruturadas, especialmente com preferência pelo processamento de informação visual e instrução explícita.”

Jaqueline Bifano – Psiquiatra infanto-juvenil

Diogo de Souza Freitas

“O principal desafio e mudança no sistema educacional de crianças e jovens, desde a educação infantil, fundamental ou ensino médio, em época de pandemia, é que os pais participem deste processo educacional de forma mais presente e técnica, já que muitos não tem tempo ou conhecimento para ensinar e acompanhar o desenvolvimento dos seus filhos, apesar de terem esta responsabilidade em qualquer época, mesmo fora de pandemia. Isso se agrava em relação às pessoas com necessidades especiais, principalmente os deficientes, porque há exigência de conhecimentos terapêuticos e pedagógicos específicos e adaptados. Por exemplo, como uma família que não trabalha com educação conseguirá implementar as atividades adaptadas por meio de um plano de ensino individual em sua residência, por meio de aulas e instruções on-line, sem a presença do atendente terapêutico da criança?

No mínimo esse professor de apoio da criança deficiente deveria ir para a residência da família, só assim será possível a inclusão continuar. Aulas on-line para os deficientes cognitivos em geral não funciona, ao contrário de deficientes físicos, auditivos e visuais, que têm a disposição no mercado de tecnologias assistivas. Assim, concluo que para aqueles casos que as aulas virtuais não funcionam, o correto é a atividade presencial em casa com o apoio de um profissional e da família, o que é muito difícil para aqueles que não tem condição econômica. Já o convívio social seja na escola ou em casa, o prejuízo é inevitável, e as consequências só conheceremos no futuro.”

Diogo de Souza Freitas – Advogado, consultor de inclusão e Diretor do IEAC (Instituto de Educação e Análise do Comportamento)

Vinícius Freaza

“Na pandemia, as startups de educação que trabalham com plataformas tecnológicas tiveram múltiplos desafios relacionados à alta demanda e a quantidade de usuários simultâneos que sobrecarregaram servidores. Além disso, um outro desafio não menos importante entrou no radar: a adaptação das plataformas para inclusão e acessibilidade. Aqui na Evolucional, como temos uma plataforma on-line responsiva que funciona em todos os navegadores, nós orientamos por meio do nosso suporte as escolas a trabalharem com a configuração de zoom para adaptarem o tamanho das fontes aos alunos com deficiência visual que precisam de fontes maiores. Além disso, desenvolvemos um módulo de ‘acompanhamento on-line’ para as nossas avaliações, onde a gestão da escola consegue reiniciar a prova dos alunos sem que eles percam as respostas às questões que eles já resolveram, mas possam obter tempo extra para realização da prova, caso seja necessário. Por fim, implementamos os mesmos critérios de correção de redação para dislexia do Enem, mediante o pedido da escola para alunos específicos.”

Vinícius Freaza – Sócio-diretor da Evolucional

Lucas Fonseca

“Talvez a maior oportunidade que os tempos de pandemia nos traz, é perceber a necessidade da verdadeira inclusão na educação. Se todos já somos diferentes por essência, o que requer tratamentos diferentes, imagine o quão real se torna a relevância de colocar em pauta a seguinte pergunta: E aí? Como fica a educação especial? 

Não há metodologia maior que o amor e o acolhimento. Em tempos atuais, precisamos focar no verdadeiro sentido da educação, que é mostrar a todos que a educação não é o melhor caminho – é o ÚNICO caminho! No que se refere à educação inclusiva, minha dica é conectar toda a comunidade escolar em prol da responsabilidade de fazer de uma vez por todas a inclusão acontecer. Certamente, para o momento, a melhor educação é o amor, e a melhor metodologia é o acolhimento.”

Lucas Fonseca – Educador, Especialista em Desenvolvimento Humano e Gestor Educacional do Grupo FAVENI 

Deigles Giacomelli Amaro

“Um dos principais desafios que temos, ao tratar da inclusão escolar em tempos de pandemia, é realizar um processo de interação e vínculo efetivo entre o aluno, o professor da sala regular, o professor de Atendimento Educacional Especializado (AEE), a equipe escolar, a família e os eventuais profissionais que atuam com esse aluno. O contexto da pandemia evidencia que precisamos desenvolver formas novas de interagir, comunicar, identificar necessidades e possibilidades de desenvolvimento e de aprendizagem de todos (de cada aluno). Isso inclui o público-alvo da Educação Especial que não pode ser esquecido e, às vezes, é deixado apenas na responsabilidade dos professores de AEE – estes são importantes profissionais – entretanto, os professores da sala de aula regular são os responsáveis pelo processo educativo com o aluno rumo a construção do seu conhecimento, que pode ser, desde saber quem eu sou como ser humano, até saber como eu uso uma equação de segundo grau para resolver uma situação cotidiana, por exemplo.

A pandemia evidenciou que se não tiver um diálogo entre professor da sala regular, professor de AEE, família, aluno e outros profissionais, de forma articulada para realizar um trabalho integrado, o vínculo, ponto de partida e as estratégias para o alcance de todos e cada aluno, pode não ser efetivos.

Diante deste desafio e das necessidades de mudanças, temos como necessários e possíveis alguns procedimentos e estratégias. Dependendo de cada caso, podem ser utilizadas propostas com o uso de tecnologia assistiva, como: sintetizadores de voz, ampliação visual, com lupas manuais ou de mesa ou, simplesmente, letras de tamanho ampliado; teclados, acionadores adaptados, engrossadores de lápis, folhas com diferentes margens, pautas, dentre outras modificações necessárias.

Para identificar as estratégias possíveis, é necessário conversar com as famílias e alunos, e verificar a forma mais efetiva de comunicação, como a LIBRAS, por exemplo, para pessoas com surdez que estão apropriados nesta língua. Mesmo quando o aluno não se comunica verbalmente ou parece ter dificuldade em compreender o que estamos dizendo, temos a comunicação não verbal, onde gestos, expressões, olhares, nos informam o que gosta, o que sabe, o que pode fazer, o que o desafia e se constitui uma atividade a favor do desenvolvimento e da aprendizagem de acordo com a possibilidade de compreender o mundo neste momento e, como eu, professor, vou interagir com ele: por meio de vídeos gravados, contatos síncronos on-line, por meio de textos enviados por aplicativos de comunicação e ou impressos, bilhetes, cartas, desenhos, músicas e outras formas que possibilitem a interação, interesse e possibilidades de continuar favorecendo o processo de desenvolvimento e de aprendizagem de cada aluno.

Deigles Giacomelli Amaro – Terapeuta Ocupacional, Pedagoga e coautora do livro “A escola para todos e para cada um” (Summus Editorial)

Maria da Graça França Corsi Monteiro

“Para que seja viável manter o ritmo de aprendizagem e a aquisição de novos conteúdos no ensino híbrido, é urgente e necessário que a escola conheça de fato quem é o aluno com deficiência visual, suas necessidades, dificuldades e características, a fim de promover adequações necessárias que possibilitem acompanhar as aulas, solucionar as dúvidas e desenvolver as atividades. Para tanto, é preciso auxiliar a família desde o empréstimo de recursos e equipamentos até no processo de adaptação das atividades, providenciando a impressão em Braille e descrição das imagens, preparar kits com materiais concretos para os alunos com cegueira; promover a ampliação, simplificação de imagens, uso de legendas e em alguns casos usar a descrição, além de outras estratégias que favorecem o acesso ao material. É importantíssimo manter contato direto e frequente com os alunos e seus pais para acompanhar com segurança o acesso ao conteúdo, assim como o trabalho conjunto com os professores especializados, quer estejam na própria rede de ensino ou em instituições especializadas, como a Laramara, para que o aluno alcance o sucesso.

As adaptações devem ser planejadas individualmente, mas existem orientações gerais que podemos compartilhar com pais e professores. A antecipação de acontecimentos é fundamental para que o aluno com deficiência visual se organize e planeje as ações. O aluno com baixa visão tende a apresentar cansaço visual ao esforço. Deste modo, é importante observar a iluminação do ambiente e evitar que luz natural ou artificial incida diretamente sobre os olhos. Quando os professores apresentarem qualquer material durante as aulas on-line, deverão aproximá-lo da câmera para que o aluno possa observá-lo, discriminar seus detalhes e acompanhar a explicação.

O aluno com cegueira também necessita de orientações, pois é imprescindível que integre os sentidos para explorar e compreender o ambiente em sua volta. Por meio do tato, irá manusear e explorar diferentes objetos, conhecendo a textura, o peso, a temperatura e o grau de aspereza, enriquecendo e ampliando suas experiências e vocabulário.
O conteúdo programático das disciplinas precisa ser adaptado utilizando preferencialmente material concreto e tridimensional, contribuindo para a formação de conceitos. As atividades gráficas precisam de adaptação tanto em relevo, utilizando pontos e traços feitos com carretilha ou ponta seca, quanto com texturas, como EVA, cortiça, feltro, papel camurça, contornos com lã, barbante, cola colorida ou tinta relevo; a fim de representar o que for solicitado. Dessa maneira, o aluno irá reconhecer tatilmente desenhos, mapas, tabelas, gráficos e desenvolver a atividade. A prancha para desenho recoberta com lixa será útil para a pintura com giz de cera e, com EVA ou feltro, produzirão relevo ao usarmos ponta seca. O tipo de relevo produzido pelo revestimento das pranchas difere de acordo com o material utilizado. É importante lembrar que a percepção tátil difere do visual, assim, ao adaptar as atividades, convém retirar o excesso de detalhes que compõem a imagem. Sempre que possível, trabalhe cada conceito, primeiro com material concreto e tridimensional para depois promover a passagem para o plano gráfico, representando a imagem em relevo. Ressaltamos que ao empregar texturas, cada uma delas deverá ser utilizada para uma representação, isto é, não devemos repeti-la na mesma imagem.

Incentive a prática nas aulas de educação física, pois realizar atividades físicas por meio de jogos e brincadeiras em casa, promove a melhora da saúde física, mental e emocional. A parceria Família – Escola – Serviço Especializado será fundamental para a aprendizagem do aluno.”

Maria da Graça França Corsi Monteiro – Pedagoga especializada em deficiência visual, Psicopedagoga, membra da equipe Técnica – atendimento especializado da Laramara, avaliação funcional e comissão científica

Caio Augusto Carvalho Alves

“A Educação Inclusiva no Brasil sempre enfrentou desafios, mesmo em épocas mais tranquilas. Os principais desafios estiveram sempre circundando a questão da formação docente, deficitária nessa área; a falta de estrutura, recursos e equipamentos públicos para viabilizar planos; e, como pano de fundo para tudo isso, a falta de vontade política para questões dessa natureza. A pandemia só elevou em potência muitos desses desafios, tornando-os mais difíceis de serem enfrentados.

Sobre os problemas relacionados à formação docente, já é possível perceber nas literaturas da área registros de práticas docentes que refletem desde o desconhecimento das tecnologias assistivas que poderiam auxiliar na aprendizagem, até a desconsideração de princípios básicos da Educação Inclusiva, o que faz com que o direito à educação e à aprendizagem de vários alunos esteja agora sem garantia alguma. Temos relatos, por exemplo, de professores que antes acompanhavam alunos com alguma deficiência, transtorno ou distúrbio de aprendizagem que não se manifestaram durante a pandemia. Muitos alunos fizeram isso durante o período. O que não é aceitável é o professor naturalizar essa situação, colocando-se em uma situação reativa, esperando o aluno se manifestar para localizar a demanda. Por princípio, o acompanhamento pressupõe uma posição ativa, onde o professor deve buscar o aluno mesmo que esse não se manifeste ou peça essa ajuda. Sabemos que muitos dos alunos que precisam ser incluídos não buscam ativamente essa inclusão, cabendo ao professor esse papel.

Outro exemplo importante são os professores, que mesmo acompanhando de perto seus alunos, se veem incapacitados de ensinar por não saberem utilizar tecnologias assistivas. Professores que acompanham alunos cegos ou com baixa visão, desconhecem softwares de leitura, ou professores que acompanham crianças com TDAH e que não conseguem criar estratégias junto às famílias para viabilizar a aprendizagem. Enfim, percebemos que a formação docente voltada a esse tipo de conhecimento facilitaria a ação docente.

Mudanças metodológicas

O distanciamento físico, utilizado para diminuir o contágio do novo coronavírus, obrigou instituições a adotarem novos formatos na formação docente: a modalidade a distância, o ensino remoto e o ensino híbrido. Dada a desigualdade social e educacional brasileira, essas alternativas por si sós já se mostraram excludentes para a maioria dos alunos, visto que não há universalização do acesso à internet no país. Contudo, a situação é mais crítica com os alunos com deficiências, transtornos e/ou distúrbios de aprendizagem, uma vez que suas demandas são outras, extravasando das questões tecnológicas, e considerando ainda que muitos desses alunos precisam de um suporte profissional além da infraestrutura tecnológica. Nesse quadro, acaba sobrando para os pais e responsáveis por esses alunos o papel deste profissional, que nunca será o ideal, seja por conta da formação, seja por conta da disponibilidade para tal.

Por outro lado, o fato do trabalho e do estudo remoto terem sido utilizados com mais frequência durante a pandemia fez com que mais oportunidades surgissem para as pessoas com mobilidade reduzida. Trabalhadores e alunos com deficiência física e motora agora conseguem trabalhar e assistir aulas sem precisarem se aventurar em deslocamentos hostis das nossas cidades que não são nada acessíveis. Caso houvesse um esforço por ofertar um suporte profissional a essas pessoas, seria possível dar o primeiro passo e avançar para questões mais avançadas, como as tecnologias assistivas, por exemplo.

Soluções e estratégias

Parte da solução para o problema passa por uma melhor assistência institucional para os alunos que precisam ser incluídos na lógica escolar. Essa assistência pode vir de várias formas, mas é importante destacar que o primeiro passo é voltar o olhar de todos para essa questão. A indiferença, nesse sentido, é um dos principais fatores para a exclusão e a não garantia desse público ao direito à aprendizagem.

Resolvida a questão da assistência, passamos ao domínio das tecnologias que favorecem a inclusão escolar. É preciso investir em formação docente, com cursos rápidos, fóruns de trocas de experiência e websites especializados, além dos artigos científicos, que nos atualizam constantemente sobre o que está sendo produzido no mundo.

A escola, como lugar de interação e troca entre pares, precisa continuar exercendo esse papel, mesmo em tempos difíceis. Professores e instituições foram forçados a entrar em contato com os alunos utilizando outros meios, como os aplicativos de mensagem instantânea, as plataformas de conferências, as salas de aulas virtuais e por aí vai. Porém, aquela atenção a mais, o olhar atencioso a quem carece dele, o auxílio diferenciado para quem é diferente, também deve acompanhar esse processo, pois essa atitude também faz parte das interações proporcionadas pelas escolas. Talvez os professores e as instituições voltaram seus esforços para a manutenção da forma escolar, com o controle do tempo, do espaço e dos ritmos de aprendizagem, sem se preocupar com os desafios provocados para quem mais precisa. Com a experiência que temos hoje e sem a perspectiva de uma volta rápida às atividades presenciais, seria de bom grado que a Educação Inclusiva entrasse na pauta e fosse também objeto de esforços.

Estamos todos cansados, isso é um fato. Tudo o que foi produzido em tão pouco tempo nos consumiu demasiadamente, já que fizemos tudo isso em meio a inúmeros desgastes pessoais. Porém, faz parte do ofício docente também se preocupar com os alunos que mais precisam e precisamos ser profissionais nesse sentido.”

Caio Augusto Carvalho Alves, Doutor em Educação (USP) e Coordenador dos cursos de licenciatura EAD em Pedagogia, História, Letras e Filosofia

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