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Guia para Gestores de Escolas

Como inserir ações e práticas sustentáveis no cotidiano escolar?

Por Rafa Pinheiro / Fotos Divulgação

A atualidade nos mostra, cada vez mais, a urgência na amplificação (e intensificação) de debates e propostas efetivas que incorporem a sustentabilidade nas ações diárias. Nesse sentido, é imprescindível, para as instituições de ensino, trabalharem com educação ambiental, bem como introduzir práticas sustentáveis que atravessem toda a estrutura escolar, desde a gestão até o desenvolvimento pedagógico

 

Inserida como um dos 17 objetivos na resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) intitulada “Transformar o nosso mundo: Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável” e em vigor desde 1 de janeiro de 2016, a sustentabilidade foi colocada em um patamar de atenção e conservação mundial. O conjunto de 169 metas dos 17 objetivos contempla uma agenda ambiciosa envolvendo as áreas social, econômica e ambiental, assim como a implementação de projetos, a responsabilidade dos governos e a avaliação regular dos progressos.

Reconhecendo a escola como uma importante instituição social que atua diariamente na formação de cidadãos, é imprescindível que a gestão escolar, assim como o corpo docente e demais colaboradores, incluam as noções de educação ambiental e práticas sustentáveis no dia a dia – e não apenas em datas específicas ou em atividades pedagógicas pontuais. Dessa forma, tendo como foco ações práticas, neste especial da Conversa com o Gestor compartilhamos reflexões e projetos que são trabalhados em espaços educacionais. Confira!

 

Edson Grandisoli – Diretor educacional da Reconectta

“Existem muitas possibilidades para se construir uma escola mais sustentável. Tudo depende dos desejos, das possibilidades e do contexto de cada uma. Do ponto de vista mais prático, as atividades mais usuais estão ligadas à construção de hortas agroecológicas, gestão de resíduos e uso consciente da água e energia. Todas elas são muito importantes, mas é fundamental que haja o engajamento de toda a comunidade, o que é sempre um desafio.

Nessa direção, temos colaborado com diversas escolas na estruturação de programas de sustentabilidade, envolvendo, por exemplo, a criação de um comitê de sustentabilidade, que deve contar com diferentes atores da escola. Esse processo de envolvimento, escuta e criação coletiva, é fundamental para que a sustentabilidade se torne um valor de todos e da instituição.

Nem sempre é uma caminhada simples, mas acredito que dentro dessa perspectiva mais colaborativa e dialogada, as atividades ganham um novo sentido, passam a fazer sentido para as pessoas, aumentando suas chances de sucesso.”

Edson Grandisoli – Diretor educacional da Reconectta

 

Ana Paula Gama – Coordenadora do Projeto Cervantes Solidário do Colégio Miguel de Cervantes (SP)

“As práticas de sustentabilidade precisam abranger as dimensões ESG – Environmental, Social and Corporate Governance – e todos os processos e ações devem ser pensados para o desenvolvimento dos alunos, da comunidade e do planeta. Na esfera ambiental, por exemplo, criamos o Grupo Gestor de Sustentabilidade formado por uma equipe de docentes que inclui representantes da Educação Infantil ao Ensino Médio. Esse grupo dinamiza ações voltadas ao tema ambiental na escola. Um evento importante, por exemplo, é o Dia da Sustentabilidade, que conta com a participação de toda a comunidade escolar: alunos e suas famílias, alunos dos projetos sociais e colaboradores.

Outra ação conta com a participação ativa dos alunos do Ensino Médio, orientados pelos professores, que organizam grupos de trabalho sobre temáticas diversas e envolvem os alunos do Ensino Fundamental para se engajarem também. Grupos de reciclagem de materiais escolares, cultivo na horta ou compostagem são alguns dos exemplos de projetos dirigidos pelos alunos nos últimos anos.

Na Educação Infantil temos o Projeto Aventureiros Especiais; no Ensino Fundamental I trabalhamos livros, temas e passeios comuns durante um período do ano e reunimos todos em um grande encontro ocupando espaços públicos, já o Ensino Fundamental II é o motor das Campanhas Internas de Arrecadação, os alunos do Ensino Médio desenvolvem ações com maior grau de envolvimento e complexidade, alguns deles participam do Programa do Diploma do Bachillerato Internacional (IB), que possui no currículo o componente CAS – Criatividade, Atividade e Serviço, onde eles possuem autonomia para criar, desenvolver e entregar projetos diversos, em relação aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.”

Ana Paula Gama – Coordenadora do Projeto Cervantes Solidário do Colégio Miguel de Cervantes (SP)

 

Osmar Donegá Junior – Gestor de negócios educacionais do Wet’n Wild

“Quando falamos de sustentabilidade, falamos das dimensões ambientais, sociais e econômicas, e sua aplicação não está restrita somente às grandes corporações ou até mesmo aos governos. O ser sustentável é uma obrigação coletiva da sociedade, sejam em suas pequenas ou grandes ações, assim a sociedade garante a disponibilidade de recursos para as futuras gerações.

Portanto, a sustentabilidade é inerente e indissociável das ações educativas. Ao tratarmos e reciclarmos 7 milhões de litros de água em um ambiente que pode chegar a receber 12 mil pessoas em um único dia, o parque Wet’n Wild promove a sustentabilidade em suas ações cotidianas. E ao vivenciar esse processo, através do projeto educacional ‘Na Onda da Ciência’, coloca o visitante na condição de observador crítico do tema, incentivando-o a entender e praticar as ações desse projeto.”

Osmar Donegá Junior – Gestor de negócios educacionais do Wet’n Wild

 

Bruno de Souza – Coordenador pedagógico do Colégio Oshiman de São Paulo

“Primeiramente, a equipe escolar deve ter clara qual noção de sustentabilidade que norteará a elaboração do Projeto Político Pedagógico. Para nós, ela está relacionada à ideia de que a reprodução da vida humana não pode tornar insustentável o equilíbrio dos ciclos naturais. Podemos dizer que esta é uma concepção em escala ampla e ligada às grandes causas ecológicas de nosso tempo (aquecimento global, desmatamento, geração excessiva de resíduos sólidos, desertificação etc.). Mas é preciso trazer para o cotidiano as grandes questões globais, de modo a possibilitar a reflexão sobre nossas pequenas atitudes na escola.

Aqui entramos então na parte prática. Em nossa escola, adotamos a prática de reutilização de todo papel usado em todos os setores do colégio. Seja através do uso do lado branco das folhas ou, no caso das folhas reutilizadas, o reaproveitamento para uso em brincadeiras (aviões de papel, dobraduras etc.). Nos eventos da escola, os materiais são reaproveitados na confecção de convites ou como parte da decoração – tudo elaborado pelos alunos. Criamos uma oficina de reaproveitamento de cadernos do ano anterior. Pontas de lápis são guardadas para que se transformem na decoração de Natal no final do ano. Restos de comida são recolhidos e direcionados para a composteira que, além de ser utilizada nas aulas de ciências, geram substrato para as plantas frutíferas da escola – que, a depender da produção, são oferecidas aos alunos, para que eles tenham contato com o ciclo da natureza. A vida se refazendo a partir daquilo que foi descartado.

Porém, nada fará sentido sem que a redução do consumo seja trabalhada. A cada atividade, realiza-se a reflexão sobre a melhor utilização de um recurso para não haver desperdício, mas também é preciso pensar se vale a pena consumi-lo. O tema consumo, como tema transversal, deverá permear a construção do currículo de todas as disciplinas, como parte de um programa escolar que vise a sustentabilidade.”

Bruno de Souza – Coordenador pedagógico do Colégio Oshiman de São Paulo

 

Felipe Goldschmidt – Coordenador do Projeto Bachillerato España do Grupo Base Educación

“A educação sustentável na escola não é apenas uma atividade que fazemos de vez em quando a partir de disciplinas curriculares relacionadas ao meio ambiente. É um olhar focado no respeito à vida no planeta, uma atitude e um compromisso ético de ação consigo mesmo, com os outros e com a comunidade local e global. Concentramos o nosso plano de ação para operacionalizar essa visão na escola a partir da cultura e filosofia maker, processo de aprendizagem que pode ser resumido nos princípios: Reciclar, Reduzir, Reparar, Recuperar, Renovar, Reutilizar e Redesenhar a partir do método Design Thinking, ou seja, cultivar, a partir dessas práticas, o espírito empreendedor e solidário através da criatividade, conectando a mente e as mãos com o uso de todos os tipos de tecnologias analógicas e digitais.

A partir disso, elaboramos um roteiro de aprendizagem escolar denominado ‘Salve o planeta’, composto por 35 desafios de pensamento maker, nos quais os alunos aprendem a cuidar da escola, do meio ambiente e do planeta fazendo perguntas para desenhar protótipos que podem ser aplicados em seu cotidiano relacionado à inteligência emocional, mudanças climáticas, sustentabilidade e economia circular.

Um exemplo prático é o projeto sobre os problemas ambientais próximos a nossa escola. Para encontrar soluções globais, devemos começar pelas problemáticas locais. Conhecer o seu entorno é fundamental para poder adquirir gestos positivos a respeito do meio ambiente. Atualmente, estamos trabalhando com os alunos sobre os problemas ambientais próximos ao centro escolar. Utilizamos como ferramenta de trabalho a realidade aumentada (RA).

Os alunos passam por uma etapa de pesquisa, onde identificam e registram sua geolocalização de problemas, como: lixo na rua, problemas de resíduos, poluição, plantas sem manutenção etc. Em seguida, passam por um trabalho cooperativo de como podemos resolver os problemas detectados. Para concluir o trabalho, através do programa de Realidade Aumentada Metaverso os alunos realizam uma série de campanhas de sensibilização associadas aos pontos geolocalizados. Os participantes instalam QR Codes próximo ao lugar e quando as pessoas passam podem ver, com a ajuda da RA, histórias interativas explicando soluções práticas para melhorar este problema.”

Felipe Goldschmidt – Coordenador do Projeto Bachillerato España do Grupo Base Educación

 

Ana Amélia Ribeiro Sales – Advogada, especialista em Direitos Humanos

“A preocupação das instituições de ensino com a sustentabilidade ambiental deriva não apenas da necessidade do ensino de qualidade (exigência da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e da Constituição Federal, art. 206, VII), mas também da responsabilidade social dessas instituições, enquanto membros integrantes da sociedade. A Constituição Federal atribui ao Poder Público e a toda a coletividade, o dever de zelar pelo meio ambiente ecologicamente equilibrado, defendendo-o e preservando-o para as presentes e futuras gerações.

Assim, a inserção de práticas de sustentabilidade ambiental na rotina administrativa da escola tem o duplo papel de cumprir a responsabilidade social da instituição enquanto pessoa jurídica integrante da sociedade, e, ao mesmo tempo, ensinar pelo exemplo.

A substituição da utilização de documentos impressos (como o contrato de prestação de serviços educacionais – várias páginas impressas em papel e em duas vias) pela versão somente eletrônica desses documentos, confere a mesma confiabilidade e segurança jurídica (notadamente com o uso das assinaturas eletrônicas), agregando a sustentabilidade como prática institucional.

A substituição de outros documentos historicamente impressos, tais como históricos escolares e diplomas, por versões eletrônicas, bem com a utilização de e-books, também são práticas condizentes com a proteção ao meio ambiente e que, por isso, devem ser estimuladas.”

Ana Amélia Ribeiro Sales – Advogada, especialista em Direitos Humanos.

 

Luciana Barão Acuña – Professora de Ciências e coordenadora do Projeto Lixo Zero do Colégio Agostiniano Mendel

“Aqui no Mendel, acreditamos que a sustentabilidade ambiental não pode ser apenas ações isoladas ou atividades em sala de aula. Ela tem que ir além disso e fazer parte do dia a dia do aluno, do professor, da equipe pedagógica e de todos os colaboradores do colégio. Tem que ser um propósito, pois entendemos que a escola é um importante agente transformador não só de seus educandos, mas de toda a comunidade em seu entorno.

A importância da reciclagem é um tema que trabalhamos há anos aqui no Mendel, mas que ganhou uma nova dimensão em 2022, quando o colégio assinou o Compromisso Lixo Zero, junto ao Instituto Lixo Zero Brasil, e passou a se preparar para a certificação formal. Desde o ano passado, temos duas metas muito claras: primeiro, reduzir em 50% o volume de resíduos enviados a aterros sanitários até maio deste ano, o que estamos em via de conseguir. E, numa segunda etapa, que vai até 2024, a meta é reduzir para 90%.

São metas extremamente ambiciosas, que nunca conseguiríamos atingir se não houvesse um forte trabalho de conscientização. Por isso, há um ano, intensificamos as ações e campanhas pedagógicas envolvendo nossos alunos, realizamos treinamentos para colaboradores, buscamos parceiros alinhados com nossos objetivos, revimos os procedimentos de nossos fornecedores e, principalmente, temos trabalhado a conscientização das famílias que atendemos.

O que muitas vezes chamamos de ‘lixo’ tem um valor enorme, que se devidamente tratado, reduz significativamente nosso impacto no meio ambiente e estimula a economia circular, gerando renda e emprego para milhares de pessoas. Por isso, esse envolvimento conjunto é essencial. Uma vez que o cidadão realmente toma consciência disso, não há como voltar atrás. E, como educadores, estamos aqui para formar cidadãos conscientes. Essa é a nossa missão.”

Luciana Barão Acuña – Professora de Ciências e coordenadora do Projeto Lixo Zero do Colégio Agostiniano Mendel 

 

Ana Paula Yazbek – Diretora do Espaço ekoa (SP)

“Hoje, é impossível desvincular infância, meio ambiente e futuro. Precisamos, desde cedo, pensar em educação ambiental e trazer a ideia de sustentabilidade às crianças, que precisarão transformar a maneira de pensar e agir para lidar com os desafios do futuro. A ideia central é que para preservar, é preciso conhecer, e esse conhecimento pode circular nas escolas de diversas maneiras. Uma delas é estimular o contato com a natureza, oferecendo oportunidades para as crianças brincarem ao ar livre, perto de áreas verdes. Isso ajuda no desenvolvimento motor, psíquico e socioemocional das crianças e aprofunda a qualidade das conexões que elas estabelecem umas com as outras.

Podemos incluir atividades de plantios de hortas nas escolas, em que crianças participam de todo o processo de preparo da terra, plantio, cuidado das plantas à colheita dos alimentos para as refeições. Também podemos estimular brincadeiras sensoriais com elementos naturais ou materiais recicláveis. Podemos organizar passeios externos aos parques e às áreas de preservação, convidando as famílias para conversas sobre o tema e como atitudes podem reverberar em casa. Ou mesmo utilizar a literatura a nosso favor. Tudo isso é válido e importante para o diálogo sobre sustentabilidade no âmbito escolar.

No entanto, essa conversa precisa estar alinhada à força do exemplo, ou seja, não adianta ensinar a criança a preservar se ela observa desperdício de água, má gestão de resíduos e valores da comunidade escolar que andam na contramão. No ekoa, a sustentabilidade está no nosso documento norteador, enquanto eixo estruturante. Isso significa que esse valor passa a orientar todas as ações pedagógicas e operacionais, de todas as equipes, da diretoria aos funcionários da limpeza, passando pela administração e pela arquitetura dos prédios, não sendo um processo concentrado apenas nas mãos dos educadores. Para que todos sejam envolvidos, é possível criar comitês locais, com responsáveis por pensar a sustentabilidade nas diferentes áreas de atuação da escola.

Portanto, além das atividades curriculares, as escolas precisam levar informação sobre sustentabilidade para suas equipes, realizar processo de escuta para identificar prioridades, desafios e, sobretudo, criar planos de ação que gerem engajamento coletivo dos funcionários. Do ponto de vista do impacto, é muito mais efetivo envolver toda a comunidade escolar para repensar o consumo e trabalhar formas mais competentes de gestão de resíduos: quanto a escola consome, por que consume e de quais empresas consomem? Assim, é possível optar por melhores práticas na compra de materiais alternativos, na escolha da quantidade de lixeiras e até o destino do lixo, como, por exemplo, enviá-lo a uma cooperativa de catadores.”

Ana Paula Yazbek – Diretora do Espaço ekoa (SP)

 

Saiba mais:
Para conhecer os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil e as principais atividades das Nações Unidas no país, acesse: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs

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