Gestão Escolar — Ensino fundamental e médio: Formatos e investimentos
Matéria publicada na edição 66 | Março 2011 – ver na edição online
As Novas Diretrizes Nacionais do Ensino Fundamental, publicadas em dezembro passado, e as do Ensino Médio, em processo de finalização junto ao Conselho Nacional de Educação, fecham um ciclo de transformações pelas quais vêm passando as escolas brasileiras desde a promulgação da LDB há 15 anos. Há, no entanto, grandes desafios a serem enfrentados, como a formação do educador (abordada em nossa pauta Especial) e a necessidade de investimentos na ampliação da rede, principalmente na do Ensino Médio.
Está agendada para o próximo dia 5 de abril, em Brasília, a reunião do Conselho Nacional de Educação que irá decidir pela aprovação ou não das Novas Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio. A tendência é que o documento consolide a reorganização curricular que já vem ocorrendo no ciclo, não apenas pela introdução de novas disciplinas nos últimos anos, mas também pela necessidade de estruturação dos projetos pedagógicos em torno das quatro grandes áreas do conhecimento adotadas nas avaliações do ENEM: Linguagens e Códigos, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências Humanas, todas com suas respectivas tecnologias.
Entretanto, outros formatos serão defi nidos e dizem respeito às abordagens transversais e interdisciplinares dessas temáticas, à autonomia das escolas para montarem seus programas, expandindo-se, por exemplo, a experiência do horário integral, bem como à complementação deste conteúdo denso por disciplinas profi ssionalizantes. Entra ainda nesta discussão a defesa de um modelo que se desvincule dos propósitos do Ensino Superior, em que o Ensino Médio deixe de ser um preparo ou uma transição para a graduação, propiciando de fato uma formação sufi ciente para que o jovem comece a exercer a sua autonomia, independentemente do que venha a estudar posteriormente.
Segundo o presidente executivo do movimento Todos Pela Educação, Mozart Neves Ramos, também membro do Conselho Nacional de Educação, o novo Ensino Médio deverá manter a prioridade na formação geral do aluno, incluindo, porém, a perspectiva da profi ssionalização e priorizando a gestão, a formação dos professores e a ampliação de sua estrutura. Ex-secretário de Educação em Pernambuco e ex-reitor da Universidade Federal no Estado, Mozart explica que a proposta incorpora sugestões colhidas ao longo do ano passado entre “vários segmentos responsáveis pela oferta do Ensino Médio”. “Houve todo um processo de ‘escuta’, pois temos grandes desafi os. O jovem quer uma escola que caiba na sua vida, o que ele não encontra no atual modelo”, diz. Uma das maiores preocupações dos setores educacionais reside, por exemplo, no elevado índice de evasão escolar registrado na faixa etária entre 15 e 17 anos. Conforme dados divulgados pelo Todos Pela Educação, 45% desta população se encontram fora da escola. “E 40% desta evasão decorrem da falta de motivação”, aponta Mozart.
Portanto, a ideia é construir uma “escola antenada com a juventude”, mas para isso se torna indispensável investir na formação dos professores, “em número e qualidade”, acrescenta. “Existe um défi cit signifi cativo em Química, Física, Matemática e Espanhol. Além disso, a maioria não ensina nas áreas em que foi graduada.” O currículo também deve acompanhar as mudanças. Mozart defende o modelo implantado em Pernambuco a partir de 2003, quando incorporou “os valores do empreendedorismo, do associativismo juvenil, um currículo básico estimulante, a perspectiva de uma boa gestão, o acréscimo na estrutura e o ensino integral”. O conselheiro propõe ainda que a profi ssionalização ocorra de maneira “concomitante” à formação básica.
A PREOCUPAÇÃO COM O FINANCIAMENTO
Não será tarefa simples, conforme avalia o presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), José Augusto de Mattos Lourenço, vice-presidente do Sieeesp (Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo) e mantenedor do Colégio São João Gualberto, localizado na zona Noroeste da Capital paulista. Segundo ele, as transformações geram reflexos não somente sobre o aspecto curricular, didático, metodológico, mas também financeiro. Afinal, questiona, como garantir o acesso ao Ensino Médio dos 31 milhões de estudantes matriculados hoje no Fundamental? Não existe, segundo ele, estrutura pública e privada que absorva tamanha demanda. Tampouco, recursos que possam melhorar as condições físicas da rede pública de forma a atender a expansão para o horário integral e a complementação profissionalizante. Ou ainda, incluir aqueles que estão fora do Ensino Médio.
José Augusto observa que as mudanças terão que solucionar o nó do financiamento do Ensino Médio, defendendo que o governo implante modelos como o Prouni e o FIES para todo o ciclo e não somente o Ensino Técnico, conforme já anunciado pela presidente Dilma Rousseff, por meio do Pronatec. Para o conselheiro Mozart Neves Ramos, esta questão deverá ser equacionada no âmbito do Executivo, lembrando que a responsabilidade pela oferta de vagas é dos Estados, que devem “se articular com o Ministério da Educação e planejar isso dentro da perspectiva da escola integral”.
AS TRANSFORMAÇÕES NO FUNDAMENTAL
As novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de nove anos, determinadas em dezembro passado pela Resolução 7 da Câmara de Educação Básica, vinculada ao Conselho Nacional de Educação, estipula um conteúdo curricular mínimo a todo o País, insere a Música no escopo do ensino de Artes, torna o Ensino Religioso facultativo ao aluno e, sobretudo, prevê novas abordagens de ensino. Entre elas, destacam-se a transversalidade entre as disciplinas, um planejamento ordenado “em torno de grandes eixos articuladores”, projetos interdisciplinares que tenham como base “temas geradores formulados a partir das questões da comunidade e articulados aos componentes curriculares e às áreas de conhecimento”, etc. Sem falar na educação inclusiva, entre outros.
Segundo a educadora Helena Machado de Paula Albuquerque, exdiretora estadual de ensino, doutora em Educação pela PUC de São Paulo e docente na instituição, toda esta perspectiva recebeu influência do teórico francês Edgar Morin, o qual apontou que “a transmissão do conteúdo por meio de disciplinas isoladas vai contra a realidade complexa do estudante”. Desta forma, tomou corpo a abordagem transversal, em que a pesquisa do aluno dá o gancho para a aquisição do conhecimento, o que supera, inclusive, o método interdisciplinar. “Neste, existe uma troca maior entre as disciplinas, com objetivos comuns, mas são formas distintas de se trabalhar o currículo”, diz. De qualquer maneira, Helena Machado volta ao mesmo nó apontado pelos demais especialistas, de maneira unânime: a falta de preparo do educador. Para concretizar essas novas diretrizes, “é preciso um professor muito bem formado e que não tenha interesse restrito em sua disciplina”. Mais do que isso, entretanto, é necessário investir na atualização e habilitação do próprio gestor.
“As escolas e os professores ainda estão em processo de assimilação e compreensão disso tudo. Essas abordagens exigem um trabalho coletivo e uma gestão democrática, o que gera uma mudança muito radical”, avalia. A principal delas deveria contemplar, especialmente no Ensino Médio, atividades e rotinas que viessem a atribuir mais responsabilidades aos estudantes, estimulando sua participação, melhorando a autoestima e constituindo o sentido da autonomia, defende Helena Machado. A educadora faz parte do comitê científico do 25º Simpósio Brasileiro e 2º Congresso Ibero-Americano de Política e Administração da Educação, evento que acontecerá em São Paulo entre os dias 26 e 30 de abril, sob a promoção da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae).
Por Rosali Figueiredo
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Helen a M. de Paul a Al buquerque
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