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Guia para Gestores de Escolas

Especial Educação — Cobertura do SABER 2011

Matéria publicada na edição 72 | Outubro 2011 – ver na edição online

Reflexões para uma escola em transição: aonde chegar?

O XV Congresso e Feira de Educação Saber 2011, realizado entre os dias 8 e 10 de setembro pelo Sieeesp, no Centro de Exposições Imigrantes, em São Paulo, abrigou os encontros sob o tema geral “Escola de Sucesso, Educação de Qualidade: o Saber rumo a uma gestão de excelência”. Mas como pano de fundo comum a palestras e debates, se destacou a necessidade de as escolas melhor definirem seus propósitos em um cenário hoje desfavorável ao aprofundamento do saber.

A metáfora com a indústria de cosméticos e da moda poderia servir como boa dica às instituições de ensino: por que não fazer como esses segmentos, “que têm visão de futuro e trabalham com as tendências do ano seguinte?”, questionou a consultora educacional, pedagoga e psicopedagoga Jane Haddad, durante sua conferência no Saber 2011. Estava em discussão, no momento, uma autoavaliação do que pensam e pretendem as escolas, de que forma elas ainda se mantém presas a modelos clássicos, alheias ao que acontece no ambiente externo, e como isso lhes cria imensas dificuldades em um mundo marcado pelo “excesso de patologias” (apatia, preguiça intelectual, violência e omissão da família).

Pois o “automatismo” e a “ausência do olhar” estão entre alguns dos “nós” que impedem as instituições de encontrarem seu caminho para construir uma “escola democrática”, que acolha os conflitos, negocie as regras, mobilize um professor “guerreiro” e desencadeie nos alunos “o desejo e a energia” indispensáveis à aprendizagem. Este é, em síntese, o diagnóstico apresentado pela consultora Jane Haddad, com teor bastante convergente a muitas das conferências realizadas no Congresso do Saber 2011. A questão central, segundo ela, “é entender o que está acontecendo no mundo atual”, “trazê-lo para dentro da escola”, “se instrumentalizar para compreender como pensa o aluno” e, “depois, instrumentalizar a família”. Ou seja, buscar fora da escola subsídios para a construção de sua proposta pedagógica, sem perder de perspectiva, no entanto, seu papel como mediadora da herança simbólica e cultural da sociedade.

ALGUNS CAMINHOS
Para começar esse processo, Jane Haddad sugeriu que a escola reflita, inicialmente, sobre sua própria memória, princípios e propósitos. Entre esses, sugeriu a apropriação da “noção de cuidado” e preservação da vida como valor maior a ser seguido, assim como acontece na área ambiental. Outro propósito estaria em “(re) significar valores morais como Justiça e respeito” em lugar de valorações não morais que pautam as relações sociais hoje, como “ser popular e desejado”. É uma mobilização que ajuda a definir “quem somos”, movimento que também deve chegar aos professores, primeiramente sedimentando esses princípios e, em seguida, despertando neles uma postura de “guerreiros” (“que sabem pelo que lutam”) e não de “soldados” (“que apenas cumprem tarefas”). Neste caso, o ponto central é trabalhar a formação, a mobilização interna, a corresponsabilidade e seu preparo para o acolhimento e a mediação de conflitos. Quanto aos alunos, o investimento a ser feito está em “conhecer o desenvolvimento psico-afetivo de cada faixa etária” e “aprender a observar esse desenvolvimento em cada criança”, disse. Já entre os pais, tem que ser feita uma aproximação, “trazendo a família para a escola”. Um exemplo dessa interlocução com o outro pode ser encontrado em uma questão aparentemente simples, mas que ainda é conduzida à moda antiga: a definição de regras. “O gestor deve mostrar aos alunos que para tudo há regras, como os sinais de trânsito. Mas quem constrói as regras? Por que o uso do boné ou o não uso do uniforme romperiam com a aprendizagem? Como é possível pautar regras sem se conhecer o desenvolvimento emocional da criança?”, questionou a palestrante. Jane explicou, por exemplo, que o boné atende a uma necessidade emocional do adolescente e não vê razão em sua restrição nas instituições. Portanto, é preciso saber que “cada faixa etária se desenvolve de um jeito” e considerar isso quando se definirem as regras, exemplificou.

REAVALIANDO PROCEDIMENTOS
O educador francês Bernard Charlot, professor visitante na Universidade Federal do Sergipe, doutor em Ciências da Educação e Livre- -Docente pela Universidade Paris X, ponderou em conferência (sobre conceitos e práticas do que fazer em sala de aula), que o cenário atual não é exatamente otimista ou favorável à escola. Pelo contrário, ao olhar para fora, ela se defrontará com “uma sociedade que valoriza a informação, não o conhecimento nem o saber”. “A sociedade valoriza o desejo e sua satisfação imediata, isso torna muito difícil o aprender”, apontou Charlot.

Segundo ele, a mudança no padrão de satisfação do desejo pode ser visualizada pela metáfora da poupança e do crédito. Anteriormente, explicou, o mundo vivia sob o imperativo da necessidade de poupar, da construção gradativa de um projeto de futuro. Atualmente usufrui do crédito, em que o dinheiro é concedido previamente a um trabalho árduo, diário e contínuo. A educação é comparada a este investimento de longo prazo, em que não cabem parâmetros como imediatismo e utilidade, entre outros.

Conforme observou o pensador francês, compete à escola conferir um “sentido aos saberes que não passe pela sua utilidade, mas sim pelo prazer que dá ao indivíduo de se sentir inteligente, forte e capaz”, além de articular “o ensinar e o aprender”. “Essa a grande dificuldade”, disse, ressaltando que ela existe qualquer que seja o modelo de ensino- aprendizagem adotado pela instituição, do tradicional ao construtivista. Para sair do impasse, Bernard Charlot propôs mesmo resgatar alguns procedimentos, como a lição de casa. “Ela não pode ter o perfil de momento de aprendizagem (neste o professor deve estar presente), mas sim de memorização, o que ajuda no desenvolvimento intelectual do aluno, desde que ele memorize o que tenha aprendido, entendido.” O que muda, segundo Charlot, é o tipo de abordagem dada ao conhecimento: “Não devemos ensinar coisas difíceis demais porque fracassam e nem muito fáceis, porque não vale a pena. Devemos trabalhar com situações que partam dos questionamentos e ter menos um professor de respostas, e mais de questionamentos. Conhecimento é sempre resposta a uma questão”, completou.

ESCOLA REFLEXIVA / ALUNO EMPREENDEDOR
Para o gestor João Carlos Martins, diretor do Colégio Renascença de São Paulo, pós-graduado em Psicologia da Educação e Administração Escolar, as instituições de ensino não podem abrir mão de atuar como espaço de reflexão e de ensinar alunos, pais e comunidades a olharem para o interesse coletivo. Martins teve duas participações durante o Congresso do Saber, entre elas em uma mesa de debates que abordou a gestão do capital humano e a formação da juventude empreendedora. “A escola procura entender esse jovem mais imediatista, um nativo digital que chega com excesso de informação.” Mas segundo Martins, ela precisa promover “a construção do conhecimento, o aprofundamento e a reflexão”, persistir para formar um “jovem empreendedor que saiba se posicionar na sociedade, goste de desafios e tenha ferramentas, competências e habilidade para enfrentá-los”.

“A própria sociedade demanda esse jovem que saiba usar a criatividade e aprofundar o conhecimento”, argumentou o gestor. Certamente há uma dissonância com a demanda que o próprio jovem traz, “pois ele quer coisas rápidas o tempo todo, seu tempo de reflexão é muito curto”. “A trabalheira é grande, tem que estimular o jovem a querer estar na escola, a buscar esse aprendizado, não se pode negligenciar”, professou Martins.

ASSEMBLEIA DOS MANTENEDORES
O reajuste das mensalidades escolares de 2012 foi um dos temas principais da Assembleia dos Mantenedores, realizada pelo Sieeesp (Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo) no primeiro dia do Saber 2011. A orientação do presidente Benjamin Ribeiro da Silva e do vice, José Augusto de Mattos Lourenço, foi a de que os gestores considerem, antes da definição dos novos valores, os custos da inadimplência, os investimentos em tecnologia da informação, a variação nos preços dos aluguéis e da inflação, que se encontra em elevação. A expectativa é de um reajuste mínimo de 10%.

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