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Guia para Gestores de Escolas

Especial Educação — Educar 2010

Matéria publicada na edição 59 | Junho/Julho 2010- ver na edição online

Estratégias para a sustentabilidade.

Inovar, criando uma identidade única, capacitar os professores e profissionalizar a gestão foram recomendações muito comuns às palestras e conversas dos quatro dias de realização do 17º Educador e da 17ª Educar, além do 6º Seminário de Management, no mês de maio em São Paulo. Sob cenários que mudaram muito nos últimos 15 anos, a Educação exige um novo perfil de gestor.

Por Rosali Figueiredo.

Quando começou a dar aulas, em 1982, Amália Kátia Ferreira Mendes, atual diretora do Colégio Padre Eustáquio, de Belo Horizonte (MG), precisava ensinar cores primárias aos alunos da pré-escola, mas hoje “as crianças de dois anos já sabem fazer isso”. “As referências mudaram bastante nos últimos anos e está muito difícil fazer a transcendência para a nova realidade”, comentou Amália, logo após o final de mais uma palestra do 6º Educador Management, ciclo de conferências em gestão realizado em São Paulo simultaneamente à 17ª Feira e ao 17º Congresso Internacional de Educação, entre os dias 12 e 15 de maio. “Há muita coisa para ser feita”, comentou a gestora, que administra uma escola com 2.750 alunos e 235 funcionários.

Os verbos “inovar”, “reinventar”, “aprender”, “mudar” e “capacitar” foram talvez os mais conjugados durante as conferências e conversas de corredores nos quatro dias dos eventos, que reuniram quase três mil participantes. Os desafios têm sido impostos por três diferentes cenários. No primeiro, encontra-se um novo perfil de aluno, atraído pelas mídias digitais, tecnologia da informação e redes online de relações sociais, quadro que tornou bastante defasada a didática e os conteúdos tradicionais, não atendendo mais às suas inquietações e necessidades.  No segundo residem mudanças das políticas educacionais processadas nos últimos 15 anos, como a introdução de critérios de avaliação da aprendizagem (entre eles o novo ENEM) e do monitoramento da qualidade da educação (o IDEB, por exemplo), além da reformulação nos mecanismos de financiamento do ensino público. Finalmente, no último configura-se uma acirrada concorrência do mercado privado, tanto no ensino superior quanto na educação básica.

“Vamos ter que mudar toda uma cultura impregnada e enquanto gestores dar suporte à formação continuada dos professores”, comentou Amália. Entre os palestrantes que mais falaram em mudanças e reinvenção está o pedagogo e consultor Casemiro Campos, autor, entre outros, de “Saberes Docentes e Autonomia dos Professores” (Vozes, 2007), e um dos organizadores de “Gestão Escolar: saber fazer” (publicado pela Universidade Federal do Ceará).  “O processo de reforma da Educação, ou seja, o conjunto de políticas públicas (LDB, Fundeb, PCN’s etc.) que orientaram os últimos governos formou um novo cenário”, observou Casemiro em entrevista à Revista Direcional Escolas. “Houve a democratização e a universalização do acesso da criança à escola, agora a sua missão é fazer qualidade, deixando um grande desafio à rede privada, que além da concorrência entre seus pares, competirá com a pública”, prevê o especialista.

Se a educação privada já enfrentava dificuldades com a relação desigual entre oferta (acima) e demanda (abaixo), os novos parâmetros curriculares e de avaliação introduziram componentes ainda mais imbricados à equação. “Será preciso adotar a pedagogia da competência, investir em salário e formação do professor e reposicionar o negócio”, acrescentou Casemiro. Segundo ele, as escolas particulares ainda tentarão apostar na competição por preços, mas a estratégia terá fôlego curto, especialmente se os gestores não conseguirem reduzir os custos. A saída estaria então no “posicionamento”, outro vocábulo muito utilizado pelos conferencistas. “Por que não introduzir um diretor de turma que dê notas qualitativas por aquilo que o aluno é e desenvolve em sala de aula? Por que não criar núcleos de interesses, como astronomia, xadrez, jogos eletrônicos?”, sugeriu Casemiro.

É possível ser único?

Outra palestrante, Alessandra Assad, jornalista e consultora em marketing e gestão de pessoas, defendeu em sua fala que não basta se posicionar no  mercado em termos de diferenciais, mas é fundamental “ser único” e, para isso, “aprender a aprender”. Isso significa “mudar o olhar, reinventar-se o tempo todo, encontrar um ponto de equilíbrio entre a valorização do professor e a necessidade do cliente final”. Ou seja, de um lado, investir na gestão de pessoas e, de outro, conhecer melhor a clientela. Em relação ao primeiro aspecto, a diretora Amália Mendes, do Colégio Padre Eustáquio, observou que “o que ‘pega’ é a necessidade de direcionarmos o olhar para o humano”. “As palestras foram convergentes em relação à necessidade desse olhar para a equipe. Vamos ter que aprender e a dar um suporte muito grande ao professor.”

Por outro lado, para conhecer a clientela é preciso “desarmar-se”, destacou outro conferencista do evento, o especialista em marketing de relacionamento Eloi Zanetti, ex-diretor da rede Boticário, entre outros. Quando atuou na recuperação da imagem de uma grande rede de ensino sediada em Curitiba (PR), Zanetti contou que chegou a andar nos ônibus escolares para identificar melhor as necessidades dos alunos. “Temos que aprender a escutar as pessoas, ouvi-las desarmados e a não temer expor nossas fragilidades”, observou. O consultor propõe às escolas desenvolver uma política de relacionamento que afine todos os atores (colaboradores internos e clientela) em uma linha de comunicação “pertinente, consistente e coerente”. De forma geral, é preciso “contar histórias que criem senso de pertencimento, de propósito, direção e significado dentro das instituições”.

Assim, enquanto na Educação Infantil e Ensino Fundamental a estratégia recairia em atendimento e relacionamento, no Ensino Médio seria indispensável ater-se a uma linguagem mais contemporânea. Conforme exemplo citado pelo palestrante, uma escola chegou a contratar um designer de moda para desenvolver o uniforme dos estudantes do Ensino Médio. “O aluno está trazendo a modernidade para a sala de aula, com web, celulares, roupas e comportamento. Mas na hora do professor transformar-se em administrador da escola ele se torna conservador, em vez de estar aberto fecha-se para o mundo”, comentou Zanetti.

Entretanto, há um imenso desafio que reside em estabelecer uma interlocução com o aluno de forma a que o professor e a relação ensino-aprendizagem restituam significado a esta profissão. “Ser único”, portanto, passa pela necessidade de se descobrir antes o posicionamento (valor, significado) que a escola estabeleceu ou deveria ter desenvolvido entre os seus clientes. Estabelecido ou recomposto este posicionamento, torna-se possível então agregar valor às mensalidades, sem necessidade de embarcar na competição arriscada dos preços.

O que aprender?

“Na maioria das vezes o empresário entra na guerra de preços, mas todos perdem, pois os clientes passam a enxergá-lo como igual”, afirmou o publicitário e conferencista Claudio Gonçalves. “Às vezes é preciso até abrir mão de algum público para que se possa ter um posicionamento. Não existe um que seja pior ou melhor nos momentos de crise, o que faz a diferença é manter-se firme no foco e identidade”, ponderou. Segundo o publicitário, a comunicação e o marketing superaram há muito as fases em que a exposição da marca ou a persuasão em torno dela resolviam.  “As escolas estão ainda na etapa da persuasão, mas temos a necessidade de sofisticar a linguagem, diferenciá-la, ser únicos.” De outro modo, acrescenta Claudio, quando a estratégia ser resume a preço, também o consumidor perde qualidade. Esta acaba se configurando em uma saída mais imediatista, porque, conforme lembrou outro publicitário, Christian Rocha Coelho, também palestrante, a pressão é enorme: 2010 registrou, por exemplo, uma queda de 10% na procura e de 5% nas matrículas entre 800 escolas das principais capitais brasileiras do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, instituições monitoradas periodicamente pelo profissional.

Para a gestora Mônica Ferreira, diretora geral da rede Pitágoras, sediada em Belo Horizonte (MG), “as escolas sentem hoje necessidade de melhoria e acompanhamento da gestão” para fazer frente a todos esses desafios. Não à toa, o Pitágoras irá iniciar, ainda neste ano, um MBA gratuito em gestão do ensino para os seus conveniados. “Ainda falta profissionalizar a administração escolar, muitos começam pequenos, com Educação Infantil, mas no contexto atual somente teremos sustentabilidade se utilizarmos ferramentas de gestão como controle orçamentário (contas a receber, a pagar, inadimplência etc.), planejamento estratégico e parcerias, entre outros.”

Mônica estabeleceu, por exemplo, uma parceria piloto de três unidades do Pitágoras com a Metodologia Gustavo Borges, ex-atleta da natação, que conquistou quatro medalhas olímpicas para o Brasil. A proposta agora é ampliar a adesão das escolas da rede ao parceiro, adquirindo um material didático especializado, treinamento e consultoria pedagógica no ensino da natação.

Novas estratégias de negócios

O ex-nadador Gustavo Borges esteve na 17ª Educar divulgando sua metodologia de ensino, que atende hoje a cerca de 150 clientes, entre empresas, escolas, instituições (como a rede SESI e prefeituras) e clubes. Mas a ideia é ampliar a parceria com o segmento escolar, oferecendo aos gestores a oportunidade de profissionalizar o “ensino aquático”. Por meio de metodologia e material didático próprio, sua empresa realiza ainda treinamento dos professores, o que, “sozinho”, o mantenedor “teria dificuldades para fazer ou não conseguiria”, disse. No entanto, o ex-atleta não foi o único medalhista olímpico a circular entre os estandes, também o campeão de vôlei e técnico Bernardinho esteve na feira e no congresso propondo parcerias em sua modalidade. E assim como ambos, consultores especializados em outras áreas do ensino formaram uma das principais vertentes mercadológicas da Educar, a de suporte e parcerias.

Segundo Casemiro Campos, é interessante que os parceiros façam parte do projeto pedagógico das instituições, desde “que capacitem os professores, atuem em sua formação”, recomendou. Na verdade, a necessidade de capacitação representa uma das principais demandas das escolas atualmente, afirmou, por sua vez, Kátia Stocco Smole, especialista no ensino da matemática. Doutora na área, Kátia dirige a Mathema, empresa que realiza capacitação docente na disciplina, da Educação Infantil ao Ensino Médio. Além da falta de profissionais habilitados, Kátia tem observado um “conhecimento deficitário entre os professores formados em matemática. É surpreendente, mas há profissionais nas séries iniciais que desconhecem operações mínimas, como divisão e fração”, disse.

Desta forma, as mantenedoras têm buscado cada vez mais parcerias para investir em seu quadro docente. Duas são as razões principais para esta procura, observou Kátia. Uma delas é a formação insuficiente proporcionada por boa parte das instituições de ensino superior; outra decorre da “vida sobrecarregada dos profissionais”. Assim, “as escolas preferem desenvolver um projeto personalizado e levar o formador para dentro da instituição, formando ali um espaço de discussão entre os professores”.

Outro tipo de parceria que sobressaiu entre os expositores da Educar foi o de novas possibilidades de negócios, como a introdução de cursos técnicos de nível médio.  “O curso técnico é uma necessidade de mercado, ao passo que a tendência de demanda de mercado para a educação básica é a sua diminuição. Desta forma, os mantenedores poderiam encontrar uma nova fonte de renda com a introdução deste ensino no período noturno, aproveitando ainda a infraestrutura física ociosa”, afirmou Carlos Roberto Soares, diretor do Instituto Educacional Profissionalizante (IEP), sistema aseado em Campinas, mas vinculado a uma instituição que atua há 55 anos no município de Jales, interior de São Paulo.

Sob o comando da Futuro Eventos, que assumiu a sua realização em 2009, a versão 2010 da Educar apresentou expositores ligados a segmentos diversos, como sistemas de ensino, tecnologia da informação, com destaque especial para as lousas digitais, softwares, produção editorial, mobiliário, suporte, brinquedos e equipamentos pedagógicos, além de serviços, como viagens e formaturas. “É uma feira técnica, que pretende fazer um approach com o mantenedor, e caminhar forte ao lado do Congresso de Educação e do Seminário de Gestão”, afirmou Marcos Melo, diretor da empresa. Com 2.700 inscritos nas conferências, a Educar foi realizada sob o tema “Encantamento, paixão e prazer – Limites e Horizontes na Inovação na Escola”.

Saiba Mais:

Alessandra Assad
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Casemiro de Medeiros Campos
[email protected]

Claudio Gonçalves
[email protected]

Christian Rocha Coelho
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Eloi Zanetti
[email protected]

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