Especial — Saber 2010 – XIV Congresso e Feira da Educação
Matéria publicada na edição 62 | Outubro 2010 – ver na edição online
As escolas e as soluções em sustentabilidade.
Pouca informação organizada, experiências ainda pontuais e ausência de modelos representam grandes barreiras à prática da sustentabilidade na vida escolar. Na verdade, as próprias instituições devem começar a criar esse paradigma, aplicando e adaptando as iniciativas adotadas em diferentes segmentos sociais. Confiram por onde começar.
Por Rosali Figueiredo.
O tema do XIV Congresso Saber deste ano, realizado entre 16 e 18 de setembro no Centro de Exposições Imigrantes, em São Paulo, atingiu a essência do conceito de sutentabilidade: “Cuidar do presente para garantir o futuro”. “A sustentabilidade deve ser entendida como a capacidade de as gerações presentes satisfazerem as suas necessidades sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as próprias”, apontou o jornalista Ricardo Voltolini, diretor da consultoria Ideia Sustentável, e um dos primeiros conferencistas a abordar o assunto nos três dias do evento. Segundo ele, o conceito decorre do relatório “Nosso Futuro Comum”, divulgado pela ONU em 1987 e coordenado pela então primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, na época chefe da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento.
É um significado amplo, que pressupõe comprometimento, bem como uma busca conjugada eos resultados econômicos, sociais e ambientais, defendeu Voltolini. Está além das ações pontuais e exige mais do que “fazer coleta seletiva e plantar árvore”, pois demanda “fortalecer um novo entendimento de nossa relação com a natureza”. Segundo Voltolini, a preocupação com o assunto ganhou corpo na sociedade em 2007, quando um painel da ONU confirmou que os efeitos da emissão de carbono deixaram de ser “suposição e se tornaram verdade científica”. “Se em 20 anos não conseguirmos reduzi-la, vamos começar a sentir isso de forma mais drástica, com eventos climáticos mais intensos (seca, vento, chuva, calor etc.) e falta de água.” “Tiramos da natureza três vezes mais recursos naturais do que ela é capaz de repor”, destacou.
O jornalista disse aos professores e gestores que as empresas vêm incorporando o conceito para planejarem o seu futuro, mas não vê isso entre as mantenedoras. “Raramente temos sido chamados por uma escola”, comentou Voltolini, que presta consultoria a organizações globais. “Não podemos viver como no século XVIII, com o modelo de abundância.” Voltolini, assim como os demais conferencistas que abordaram o tema no Congresso, observou que cabe às escolas ajudar na “transformação do modelo mental das pessoas, da maneira de pensar e agir, desenvolvendo a consciência de que os recursos são limitados, de que a vida é interdependente e é preciso eliminar as posturas perdulárias de consumo e que novos valores são necessários”.
Outro palestrante, o também jornalista André Trigueiro, professor da PUC do Rio de Janeiro e editor-chefe do programa “Cidades e Soluções”, da Globo News, defendeu a mudança do comportamento a partir da redução da produção de resíduo. “Não é possível desconstruir a noção de consumo de forma imediata, mas precisamos, por exemplo, internalizar posturas, como a de não gerar resíduos, e transformá-las em ações.” Ou seja, em lugar de focalizar a reciclagem com vistas a reduzir o lixo e reaproveitar os materiais, a ideia é rever a própria demanda pelos produtos.
“Nunca havia parado para pensar que o consumismo vem primeiro. Agora vou trabalhar esse aspecto”, afirmou a professora Iara Henrique Oliveira logo após a conferência de Trigueiro. Iara trabalha há 30 anos na Educação Infantil do Colégio do Carmo, em Santos, onde desenvolve trabalhos de conscientização sobre a água e reciclagem. “Trabalhamos muito a reciclagem, mas não o consumismo, nem a necessidade da reeducação do consumo ou da redução da produção de lixo”, observou Iara, que “não vê as escolas adotando práticas sustentáveis” na gestão de seus próprios recursos.
Para uma das organizadoras do Congresso, a psicopedagoga Edimara de Lima, este é um dos grandes desafios que se coloca hoje para as instituições: “Educar para a sustentabilidade não é fazê-lo com projetos isolados, mas vivenciá-la no dia a dia.” Diretora da escola Prima Montessori, Edimara apontou, entretanto, que “falta informação organizada e direcionada” para os mantenedores. “Temos dados sobre mangue, reflorestamento etc., mas nada específico para o nosso segmento, como, por exemplo, uma engenharia especializada em sustentabilidade”. “Sou gestora de escola há 30 anos e somente em 2010 recebi uma estagiária de arquitetura preocupada com a sustentabilidade”, ressaltou. De outro modo, o diretor do Colégio Hebraico Brasileiro Renascença, João Carlos Martins, também conferencista do Congresso, observou que a questão “não está totalmente incorporada na ação institucional das escolas”. Em suma, se inexiste de um lado uma referência organizada do que seria um projeto amplo de sustentabilidade nas instituições, de outro tampouco se busca isso de maneira sistemática. “Para sair do projeto isolado para a construção de uma ação maior, precisamos ter projetos de formação dos educadores”, defendeu Martins.