O olhar mais atento da escola
O suicídio na adolescência e juventude é algo que assusta familiares e intriga profissionais que lidam com a questão por apresentar um paradoxo: o sofrimento extremo, com um fim trágico, numa fase da vida associada a descobertas e alegrias, não a tristezas e morte. Tema tabu, sobre o qual se preferia manter silêncio, o suicídio sempre foi um problema quase invisível diante da sociedade. O crescimento lento, porém constante nas últimas décadas, dos índices de suicídios entre jovens está chamando a atenção de todos. O último levantamento realizado pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, com base em dados do Ministério da Saúde, mostra que, de 2000 a 2015, os suicídios aumentaram 65% entre indivíduos de 10 a 14 anos e 45% entre os jovens de 15 a 19 anos.
Não podemos considerar natural, nem permanecer indiferentes e se conformar com esses números. Temos no Brasil três mil crianças e jovens que se suicidam por ano. O suicídio nessa fase da vida é normalmente associado a fatores como depressão, abuso de drogas e álcool, além das chamadas questões interpessoais – violência sexual, abusos, violência doméstica e bullying. Se levarmos em conta que esses jovens passam boa parte do tempo na escola, é inevitável concluir que os educadores têm um papel fundamental no sentido de ajudar a evitar situações extremas como essas. Um olhar mais atento, um olhar, de fato, pedagógico, que tenha a intenção de capturar o que passa no coração desses estudantes, pode ajudá-los a se encontrar – e, quem sabe, consiga contribuir para salvar uma vida.
No ambiente escolar há uma série de situações de relacionamentos que podem ser potenciais mutiladores. Às vezes, um olhar mal interpretado, uma cobrança desproporcional, ou mesmo um gesto de indiferença. Precisamos estar atentos: uma criança com comportamento extremo que varia de timidez silenciosa a agressividade gratuita, deve ser acompanhada, vista mais de perto. É sim dever da escola – de professores e gestores – se aproximar um pouco mais desses alunos, que muitas vezes estão pedindo socorro, para dizer a eles que existe alguém naquele universo que se importa com eles. E aqui, o sentido da palavra importar nos remete ao ato de trazer para dentro: eu me importo contigo, eu te trago no coração, por isso eu sou empático com a tua dor eu me compadeço com ela. Ou seja, estamos sofrendo nós dois juntos com a tua dor, coração com coração. É com esse tipo de postura – de compaixão – que a escola pode ajudar a reduzir esses índices tão tristes. Não podemos atuar apenas de maneira reativa, quando o pior já aconteceu. Devemos lembrar sempre que adolescentes e jovens são imediatistas. O cérebro, nesta fase da vida, ainda não está plenamente maduro. O sistema de freios está em formação e, por isso, são indivíduos que exigem mais atenção.
Além dos fatores já mencionados acima, existem outras circunstâncias que podem influenciar negativamente um jovem. A alta competitividade, a cobrança familiar e da sociedade por bom desempenho, o dilema da escolha da carreira e ainda, um fenômeno mais recente, a incerteza sobre o futuro. Tudo isso, jogado sobre os ombros de alguém já fragilizado por outras questões, pode empurrá-lo para um abismo sem volta. O estudante de hoje vive uma situação inédita quando se trata de futuro: ele não sabe se a profissão que ele está sendo obrigado a escolher agora ainda existirá na sua vida adulta. Toda essa incerteza gera um vácuo entre o que ele é hoje e o que ele quer ser amanhã. O mundo atual padece de sentido e a gente só se engaja numa operação de vida quando a gente vê sentido e significado nas coisas. Quando não enxergamos horizonte na frente, parece que nos falta o chão – e isso, na adolescência, é ainda mais intenso. Precisamos, portanto, estar em constante vigilância. Porque situações pequenas podem ser somadas a outras tantas pequenas – ou nem tão pequenas assim – e acabam se transformando numa situação limite e impossível de ser revertida.