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Guia para Gestores de Escolas

BNCC: Como as escolas estão desenvolvendo a Base Nacional Comum Curricular na prática?

Por Rafael Pinheiro / Fotos Amanda Rod e Divulgação

“A BNCC tem como grande diferencial o olhar cuidadoso sobre as relações humanas. É importante sabermos quem somos e é importante sabermos quem somos no meio que vivemos, pois vivemos em comunidade. Afetamos e somos afetados pela comunidade na qual estamos inseridos e esta consciência nos fortalece enquanto indivíduos. Como bem nos ensina os pilares da educação da UNESCO, é preciso sabermos nos comunicar, criticar, criar e conviver”, ressalta a escritora e educadora Janine Rodrigues

Janine Rodrigues, escritora e educadora

Alterações significativas adentram o sistema educacional neste ano letivo de 2020. De forma geral, todas as instituições de ensino do país – públicas e privadas – começam a implementar conhecimentos, competências e habilidades que compõem a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – projeto que direciona seu olhar para a formação humana integral e para a construção de uma sociedade democrática e inclusiva.

De acordo com o Ministério da Educação (MEC), a Base é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos e alunas devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. Construída por meio de uma parceria entre o MEC, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), a Base recebeu, desde 2018, o investimento de mais de R$ 200 milhões do MEC.

Na prática, a BNCC pretende que o estudante transcenda os conhecimentos tradicionais em sala de aula, desenvolvendo, assim, competências éticas, humanas e técnicas com o intuito de preparar o jovem para os desafios que emergem na contemporaneidade. “Não é simplesmente aplicar o currículo, é desenvolver algumas competências com esses alunos para que daqui para frente possam ter o seu o projeto de vida, desenvolvam o seu empreendedorismo. Isso não faz de uma hora para outra”, explicou o secretário de Educação Básica do MEC, Jânio Macedo, por meio de nota da assessoria de comunicação do ministério.

Sob a ótica pedagógica, Janine Rodrigues, escritora e educadora, acredita que os educadores estão no caminho para incluir as demandas da BNCC na rotina escolar. “O primeiro passo é conhecer, reconhecer a importância e ter interesse em sua aplicação. Em nosso trabalho percebo que ainda existe uma grande preocupação e cuidado com o aluno, mas no que se refere aos professores, ainda é preciso mais atenção”.

“De que adianta pensar nas habilidades socioemocionais dos alunos e não pensar nestas mesmas habilidades para os professores e coordenadores? Nos projetos que eu realizo nas escolas o pedido que mais recebo é: Você pode me dar exemplos? E eu adoro dar exemplos reais, pois eles nos aproximam do conceito. Eles ajudam o entendimento e, principalmente, a percepção de que é possível”, completa Janine.

COMPETÊNCIAS EM ARTICULAÇÃO

Com base na visão “conhecimento não se recebe, conhecimento se constrói”, o Colégio Vital Brazil, localizado na região oeste de São Paulo e fundado em 2011, possui, em suas propostas pedagógicas, certas competências que a Base Nacional Comum Curricular estabelece como direitos de aprendizagem do estudante, atrelado a projetos desenvolvidos pela instituição.

“A Base fortalece a intencionalidade dos nossos projetos, o saber onde estamos e aonde queremos chegar”, diz Vanessa Inagaki, coordenadora assistente do Fundamental I. Segundo ela, ainda que o Colégio já trabalhasse as dez competências previstas pela BNCC, o documento fornece uma matriz que contribui para um planejamento pedagógico mais assertivo, com uma evolução dessas competências ao longo do Ensino Fundamental.

Colégio Vital Brazil (SP)

Dois projetos trabalhados pelo colégio servem como ilustração: no projeto “Plantas ao Nosso Redor”, os alunos de 2º ano da professora Márcia Vieira dedicam-se a pesquisas sobre o mundo vegetal. Os alunos aprendem sobre algumas particularidades das plantas e, o final da pesquisa, criam apresentações em PowerPoint sobre as partes das plantas: raiz, caule, folha, flor, fruto, semente.

As pesquisas são realizadas em formato de grupos durante as aulas de informática e, de acordo com a professora Márcia, todos os estudantes que compõem o grupo fazem as pesquisas na internet sobre o tema e são engajados para desenvolver entre si o espírito de cooperação. “Uma importante competência trabalhada aí é a da cooperação, que nessa fase ainda é um aprendizado. Eles já sabem usar o teclado e o mouse, sabem o que é a internet e o Google, sabem escrever; agora precisam aprender a unir todos esses conhecimentos para o propósito de adquirir conhecimento”.

Já nas turmas do 5º ano da professora Ana Paula Piola, os alunos são divididos em grupos e, cada grupo, é responsável por estudar a fisiologia humana e produzir um podcast sobre um dos sistemas do corpo humano. No desenvolvimento do projeto, conta a professora Ana Paula, um grupo de alunas notou um problema em suas pesquisas individuais: “Eram duas informações contraditórias que elas tinham tirado da internet. Tomaram uma decisão: ‘Professora, vamos à biblioteca?’ Elas demonstraram senso crítico – sabiam que um livro seria fonte provavelmente mais confiável – e autonomia para chegar a uma solução”, diz a professora.

Na ilustração desses dois projetos, podemos acompanhar as competências trabalhadas em diversas características: a pesquisa científica, a cooperação em grupo, a comunicação, a utilização da ferramenta digital (via PowerPoint e podcasts) e, também, o desenvolvimento da argumentação entre os jovens. “Em trabalhos em grupo, nunca será tudo como eu quero. É preciso convencer os colegas”, ressalta Ana Paula.

MOSTRA CULTURAL

A ampliação do conhecimento e do pensamento científico, a reflexão sobre a empatia e o estímulo da capacidade comunicativa, são algumas das características trabalhadas diariamente no Colégio Albert Sabin – fundado em 1993, em São Paulo, como uma instituição de ensino de qualidade.

Colégio Albert Sabin (SP)

Para Dionéia Menin, coordenadora pedagógica da Educação Infantil e do Fundamental I, as competências gerais definidas pela BNCC sempre foram trabalhadas no cotidiano do Sabin, mesmo que os pais nem sempre percebam como elas estão relacionadas às aulas e atividades dos filhos. “Todo dia estamos falando de reciclagem com eles, ou da diversidade cultural de São Paulo e do país, ou estamos exercitando linguagens variadas…”, afirma a coordenadora. E, como uma forma de evidenciar essas competências trabalhadas, o colégio realizou no último ano uma Mostra Cultural.

A estrutura da mostra foi distribuída no ginásio do colégio e os estandes indicavam, em selos e banners, com quais competências propostas pela BNCC cada trabalho exposto mais se identificava. Assim, tendo como eixo da mostra o senso de responsabilidade com a preservação do planeta, um trabalho do Pré I trazia, em texturas, os diferentes tipos de revestimento do corpo dos animais; do 2º ano, sobre animais em extinção; um do 1º ano sobre biomas brasileiros; e mais um, do 3º ano, sobre a vida em ambientes extremos, como desertos e geleiras. “A ideia foi mostrar para os pais o sentido do nosso projeto pedagógico, tendo como fios condutores as competências que os alunos vão desenvolvendo ao longo das séries”, diz Karla Ramos, assessora de Língua Portuguesa e orientadora educacional.

A assessora Karla ressalta que a organização da mostra – e os trabalhos dos alunos expostos – não promoviam apenas uma das competências exigidas, mas que se articulava com outras competências ampliando as reflexões. Ela cita, como exemplo, o trabalho de uma turma de 2º ano que, embora tratasse explicitamente de descarte do lixo, estava marcado com o selo “Comunicação e argumentação – como explica a assessora, remetia à competência de utilizar diversas linguagens para expressar e partilhar as informações. “Era um painel artístico, confeccionado com material reciclado, como copinhos, tampas, embalagens Tetra Pak, algumas frases de impacto e um convite para que o público interagisse com a instalação, em várias posições”, diz Karla.

Para complementar essa ideia, a coordenadora do colégio, Dionéia Menin, destaca que a mostra “deixou claro como todas as nossas ações e projetos fazem parte de um todo, como temas diferentes podem levar a reflexões parecidas, promovendo as competências e habilidades necessárias para que o cidadão esteja preparado para lidar com o mundo”.

ENSINO MÉDIO

A etapa do Ensino Médio da BNCC foi homologada em 14 de dezembro de 2018 e está organizada por áreas do conhecimento – matemática e suas tecnologias; linguagens e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; e ciências humanas e sociais aplicadas. A carga total será de 3.000 horas: 1.800 para as competências e habilidades da Base e 1.200 para os itinerários formativos, de acordo com a escolha do aluno em sua formação técnico-profissional. A previsão é que as mudanças entrem em vigor neste ano letivo de 2020, formando as primeiras turmas em 2022.

A BNCC do Ensino Médio, que esteve em densas discussões entre educadores, especialistas e pesquisadores, começa a aparecer de forma prática em algumas instituições de ensino pelo país, incorporando em novos programas e metodologias. No Colégio Eniac, instituição referência em inovação e tecnologia do ensino básico ao superior, além de adotar uma metodologia de ensino baseada em projetos, com alta autonomia do aluno, a instituição, a partir deste ano, trabalha com a carga horária de 1.800, alinhada às diretrizes da BNCC.

Colégio Eniac, localizado em Guarulhos (SP)

Simone Vianna, assessora de inovação pedagógica do Colégio Eniac, destaca que o colégio possui, dentre outras características, o protagonismo estudantil como método pedagógico, posicionando o aluno no centro do processo de aprendizagem. “No Eniac, ‘desenhamos’ e implementamos nosso próprio modelo, intitulado como modelo 50x30x20: 50% de aulas, 30% de aprendizagem baseada em projetos e 20% de oficinas conectadas. Em linhas gerais, o modelo proporciona aprendizado flexível, dinâmico, contextualizado e pautado na experimentação prática, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio e Profissionalizante”.

Simone Vianna, assessora de inovação pedagógica do Colégio Eniac (SP)

O processo de implantação e de adaptação à nova realidade educacional sob a luz da BNCC foi gradativa, ainda que em ritmo acelerado. De acordo com Vianna, o Eniac vem transformando seu modelo de Ensino Médio desde 2016, implementando mudanças significativas para o aprendizado. E, para essa transição, foi necessária uma preparação do corpo pedagógico, dos dirigentes e demais atores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. “Falo de novos e variados métodos, espaços que vão além da tradicional sala de aula, ferramentas e outros diferentes elementos que, juntos, colaboram para o engajamento dos estudantes”, completa.

Saiba mais:
Colégio Albert Sabin – [email protected]
Colégio Vital Brazil – [email protected]
Janine Rodrigues – [email protected]
Simone Vianna – [email protected]

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