Desconfiar: CON-FIAR
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DESCONFIAR: CON-FIAR
Nunca fui uma pessoa desconfiada, atualmente ando muito. Desconfio do excesso de fracasso escolar, desconfio da ausência de muitos pais nas reuniões escolares de seus filhos, desconfio do excesso de crianças e jovens medicados, desconfio de professores desmotivados, desconfio de tantas barbáries que estamos assistindo, desconfio de como chegamos em uma crise política…
Desconfiar é um bom sinal, sinaliza que estamos em movimento ao contrário da paralisação. Desconfiar e rever nossas práticas educativas, nossos conceitos e reafirmar nossas escolhas.
Acredito na educação, que desconfia e questiona. Sempre me lembro com carinho do querido e sensível Rubem Alves escrevinhando ( rsrs) em seu livro. A alegria de ensinar, aliás um clássico para nós educadores.
“ A educação, fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada estudante (…) onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?
Talvez, tenhamos adormecidos em tantas certezas e correria marcada pela falta de tempo. O momento e de Despertar e Acordar do pesadelo de uma educação pautada apenas em avaliações, formações e rankings ( não que eles não sejam importantes) eles são desde que sejam considerados junto a outros indicadores. O que estou querendo sinalizar é que devemos levar em conta o sujeito da aprendizagem e ensinagem. Quem são eles, frente a esse mundo? Cabe aqui cada gestor refletir junto a sua equipe. Qual a concepção de sujeito que a escola tem? Quem é o sujeito que queremos ajudar a formar? Onde ele está inserido?
Observando que a principal dificuldade da noção de sujeito reside no ponto que ela, na literatura educacional aparece como um sujeito cartesiano, onde ele é o agente de seu discurso e só. Não, ele é o sujeito do inconsciente que se constitui na e pela linguagem. Linguagem entendida aqui como trama desse sujeito. Se uma criança se desenvolve, o sujeito se constitui.
Desconfio da educação que ainda não leva em conta o sujeito e suas tramas. Educar é um vestir –se de sentido, achar o sentido mesmo onde não tenha. Conforme nos mostra Charlie Brown explicando ao seu amiguinho a importância das Escolas (Rubem Alves )
“Sabe por que temos que tirar boas notas na escola? Para passarmos do primário para o ginásio. Se tirarmos boas notas no ginásio, passamos para a Universidade, e se, nesta tirarmos boas notas, conseguimos um bom emprego e podemos casar e ter filhos para mandá-los à escola, onde eles vão estudar um monte de coisas para tirar boas notas…e”
Talvez, o momento nos peça um olhar que contemple a incerteza, o não saber e o desconfiar. Durante séculos nos pautamos por um pensamento cartesiano, um pensamento dualista e hoje me pergunto em que nos pautamos?
O que acontece que em pleno século XXI, crianças e jovens não aprendem?
“Procuro despir-me do que aprendi” dizia Alberto Caeiro. Talvez o momento em que desconfio é esse em que tudo é explicado, diagnosticado e avaliado.
Como escutar tais questões sem ter uma resposta pronta ou um medicamento a mão?
Talvez as possíveis respostas estejam na simplicidade do “despir-me do que aprendi”.
Como assim?
Ao longo de nossa vida, buscamos ser amados, reconhecidos e bem sucedidos e por algum motivo, paramos de buscar o mais essencial: desfrutar da alegria das coisas simples da vida, curtir o percurso da vida desapegando-se de tanto futuro que está por vir.
Hoje relendo alguns apontamentos que fiz, percebo que o meu desconfiar é sinônimo de pensar “fora da casinha” é um despertar o meu eu adormecido em queixas e repetições. Educar é algo possível, desde que seja leve e desejoso, desde que levemos em conta o possível e impossível de um profissão, desde que tenhamos acesso ao nós para olharmos os outros. Educar é desconfiar que aprender é tirar boas notas para passar de ano para sair da escola para entrar na Universidade para poder ser alguém…
DESCONFIAR sim… FIAR uma EDUCAÇÃO do TEAR…
FIAR cada SUJEITO na TRAMA da VIDA.
TECER pontos e desatar Nós.
TECER leva tempo e o tempo de educar é incompatível com a pressa!
Jane Patricia Haddad
*Jane Patricia Haddad é pedagoga, com especialização em Psicopedagogia, Docência do Ensino Superior e Psicanálise. Atuou por mais de 20 anos em escolas como professora, coordenadora pedagógica e diretora, é consultora institucional e conferencista. Autora dos livros: “Educação e Psicanálise: Vazio existencial” e “O Que Quer a Escola: Novos Olhares resultam em Outras Práticas”, ambos publicados pela editora Wak, do Rio de Janeiro. Atualmente cursa o Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti no Paraná , onde seu tema de pesquisa é a Indisciplina Escolar.
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