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Guia para Gestores de Escolas

Autismo: o quanto ainda temos a aprender

Matéria publicada na edição 118 | Maio 2016 – ver na edição online

Mara Gabrilli

Sempre me interessei pelas diferentes formas de interação entre as pessoas e a maneira com que cada uma se relaciona com o mundo. A Psicologia, uma de minhas formações, aflorou ainda mais esse interesse quando ainda era estudante universitária e passei a mergulhar nas relações humanas. Ao entrar na vida pública, já com certa bagagem, comecei a trabalhar por pessoas com deficiência e pude enfim me aproximar e conviver com universos singulares. O autismo foi uma das experiências mais ricas que o trabalho me proporcionou, não só para o meu crescimento profissional, mas também para minha evolução como pessoa.

Há mais de um ano, minha equipe e eu estamos tendo a experiência de conviver com esse universo muito de perto, quando o Gabriel, jornalista com autismo, passou a integrar minha equipe de comunicação. Sua realidade marcada por dificuldades (mas também oportunidades) é um exemplo para que outras famílias não desanimem e desafiem seus filhos a encarar o mundo. Gabriel enfrenta todos os dias a barreira protagonista do autismo: a da comunicação. No entanto, ele tem aprendido muito. E nos ensinado ainda mais.

Tempos atrás, em 2012, quando fui designada relatora do projeto de lei 1361/11, que criou uma Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, passei a receber inúmeros relatos e apelos de familiares de todo o Brasil. Pais desesperados pediam para que eu não mexesse na redação do projeto, pois qualquer alteração implicaria em uma nova tramitação e mais tempo levaria para que o texto se tornasse lei.

Depois de um trabalho árduo em conjunto com essas famílias, conseguimos chegar a um texto que garantia aos autistas os mesmos direitos que hoje são garantidos às pessoas com deficiência. No final do mesmo ano, o projeto foi aprovado pelo Senado e em dezembro de 2012 sancionado pela presidente, tornando-se a Lei Berenice Piana. De lá para cá, foram dois anos para que a lei finalmente fosse regulamentada. Hoje, a pessoa com autismo conta com um instrumento legal para reivindicar seus direitos. No entanto, a distância entre a teoria e a prática ainda é abissal. Ocorrências de realidades destruídas pela falta de políticas públicas aos autistas são, infelizmente, comuns.

No Brasil, embora pouco divulgado, a prevalência do espectro autista em crianças é mais comum do que a soma dos casos de HIV, câncer e diabetes. Organizações de atendimento a esse público estimam que tenhamos 2 milhões de brasileiros com autismo. Mais da metade ainda sem diagnóstico.

Como o autismo é um transtorno múltiplo e complexo, o tratamento adequado ainda está muito aquém do oferecido pela saúde pública brasileira. Nossos médicos pouco sabem sobre o assunto porque falta formação na própria faculdade de medicina para diagnosticar o transtorno.

A boa notícia é que esse quadro começará a mudar com a regulamentação da Lei Brasileira de Inclusão, texto que relatei na Câmara e que entrou em vigor no inicio deste ano. A LBI obriga a inserção de disciplinas como autismo na grade de cursos como medicina, bem como matérias relacionadas à pessoa com deficiência em outros cursos correlacionados.

O autismo é um distúrbio no desenvolvimento infantil com impacto gigantesco na interação social, na comunicação, no aprendizado e na capacidade de adaptação. Contudo, fechar os olhos para este fato é desacreditar no potencial da diversidade humana. E neste sentido, as escolas têm papel fundamental na inclusão desses alunos.

Precisamos refletir sobre o modelo que temos hoje de ensino. Seria este o ideal para todos os alunos brasileiros, independente de qualquer deficiência?

Não são os alunos com autismo que devem estar preparados para a escola regular, a escola tem que entender o princípio do respeito às diferenças. E isso só acontece quando os gestores públicos, os profissionais de educação e os próprios pais têm essa concepção muito clara. Esse é um processo que galgamos paulatinamente.

No último mês, dia (2/4), celebramos o Dia Mundial de Conscientização Sobre o Autismo, (2/4), espero que, assim como muitas mães e pais, possamos encontrar, enfim, uma maneira de proporcionar às pessoas com autismo o cuidado e respeito que tanto lhes faltaram por décadas.

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